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ABORDAGEM À VIOLÊNCIA ÍNTIMA NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE

Autores: Evelin Gomes Esperandio, Ana Paula Borges Carrijo
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Objetivos

Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de

  • identificar os casos de violência íntima (VI) no contexto da Atenção Primária à Saúde (APS);
  • reconhecer as ferramentas utilizadas para identificação e acompanhamento de casos de VI, como o CUES, o LIVES e o SARAR;
  • Perceber que o acompanhamento da VI deve ser tratado como um problema crônico de saúde;
  • aplicar os atributos da APS no atendimento à VI;
  • planejar intervenções nos âmbitos individual, familiar e comunitário, considerando as questões interseccionais;
  • utilizar o método clínico centrado na pessoa e o conceito de resiliência na abordagem das situações de VI;
  • reconhecer a importância do modelo ecológico e da abordagem intersetorial.

Esquema conceitual

Introdução

A VI é altamente prevalente, sendo reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como um problema de saúde pública. A VI é a violência que acontece nas relações de intimidade, independentemente de existir ou não a convivência no mesmo ambiente doméstico, destacando-se o seu aspecto relacional.1

Neste capítulo, optou-se por utilizar o termo “VI”, pois é menos sexista em relação à violência “por parceiro íntimo” ou “entre parceiros íntimos”, termos muito comuns na literatura nacional e na internacional, mas que, na língua portuguesa, acabam por indicar um gênero masculino quando, na realidade, a VI pode acontecer em qualquer tipo de relação, de maneira independente da cis-heteronormatividade. Mesmo assim, o que se observa nos estudos é que a VI atinge de forma desproporcional as mulheres, sendo que aproximadamente um terço delas relatam já terem sofrido algum tipo de violência na vida.1

Os manuais e as políticas públicas que discutem formas de erradicação e de punição avançaram significativamente no âmbito institucional, como a Lei Maria da Penha, a Política Nacional de Enfrentamento à Violência Contra as Mulheres e a Lei do Feminicídio.2-4 Um dos desafios vigentes é instrumentalizar as Equipes de Saúde da Família para conhecerem e aplicarem essas diretrizes no contexto da APS.

A APS é o local de acesso de primeiro contato, de acompanhamento longitudinal e de atendimento integral às pessoas. No Brasil, é na Estratégia de Saúde da Família (ESF) que se concretiza esse cuidado.5 As mulheres que enfrentam situações de VI deveriam encontrar nas Equipes de Saúde da Família o acolhimento adequado para tal demanda,6 tendo os princípios da APS como norteadores desse trabalho. Nesse nível de atenção, a prevalência da VI é de até 59% das mulheres, o que gera efeitos no uso dos serviços de saúde, bem como consequências altamente relevantes na saúde individual, na familiar e na comunitária.7,8

Observa-se um despreparo de profissionais para lidar com o problema,9 além da existência de preconceitos que colocam as mulheres em lugar de culpabilização.1 Há avanços importantes nas discussões sobre a implicação do machismo e do patriarcado sobre a violência de gênero, com marcos conceituais trazidos por Scott10 e Saffioti.11 Todavia, os esforços institucionais ainda são imprescindíveis para operacionalizar o que está previsto pelas políticas públicas já existentes e o conteúdo de cartilhas, manuais, protocolos, normas técnicas e cadernos de atenção básica.

Portanto, este capítulo tem como objetivo trazer para a realidade de médicas e médicos de família e comunidade noções importantes da prática do acolhimento às mulheres em situação de violência nas relações de intimidade, dentro e fora do consultório, refletindo sobre como as ações de abordagem individual, familiar e comunitária podem contribuir com a construção do cuidado ofertado pelas Equipes de Saúde da Família.

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