- Introdução
A perda auditiva (PAperda auditiva) é a quarta maior causa de incapacidade do mundo e pode ser considerada uma das deficiências de maior impacto para o convívio do indivíduo em sociedade.1 Ela interfere na comunicação interpessoal, na linguagem e em várias outras atividades de aprendizagem do cotidiano, o que gera consequências psicológicas e ao desenvolvimento das pessoas. Nos adultos, especialmente nos idosos, há associação de PAperda auditiva com depressão, declínio cognitivo e redução da capacidade funcional, além de isolamento social.2,3
Nota-se que a prevalência da PAperda auditiva tem se tornado bastante significativa; globalmente, há cerca de 466 milhões de pessoas com PAperda auditiva incapacitante. Essa alta prevalência mundial se deve principalmente ao aumento da expectativa de vida e da população de idosos, decorrentes da transição epidemiológica em muitos países. As projeções da Organização Mundial da Saúde (OMSOrganização Mundial da Saúde) sugerem que, a menos que sejam tomadas medidas, haverá 630 milhões de pessoas vivendo com PAperda auditiva incapacitante até 2030, com esse número crescendo para mais de 900 milhões em 2050.1
Os custos globais da deficiência auditiva não tratada são estimados na faixa de 700 a 750 bilhões de dólares em todo o mundo. Somente em perda de produtividade, em razão do desemprego e da aposentadoria prematura em consequência da PAperda auditiva, gastam-se 105 bilhões de dólares anualmente. Os custos sociais, aqueles resultantes do isolamento social, das dificuldades de comunicação e do estigma, agregam mais 573 bilhões de dólares a cada ano. Um problema dessa magnitude e relevância deve ser tratado adequadamente.4
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGEInstituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a PAperda auditiva está entre as principais deficiências do Brasil.5 Os estudos realizados na população brasileira acerca desse assunto apresentam um maior número de informações sobre os idosos, já que eles são os mais acometidos pela redução limiar da audição, ou presbiacusia, o que se deve ao próprio processo de envelhecimento.2
A partir da comparação de resultados de estudos realizados entre 1959 e 1962 e entre 1999 e 2004, verificou-se que a PAperda auditiva afetou menos americanos em cada década de vida na pesquisa mais recente.1 Esse resultado foi atribuído às melhorias na saúde e no estilo de vida nos últimos tempos, proporcionando melhores resultados auditivos para os idosos.6 Entretanto, apesar dessas melhorias, de modo geral, a PAperda auditiva tende a piorar com as pessoas vivendo mais.1 Uma das poucas publicações que sustentam uma tendência semelhante é originária do censo brasileiro de 2010, que mediu uma prevalência de PAperda auditiva de 5,2% e estimou um aumento desse número ao longo do tempo.5
A PAperda auditiva é considerada uma condição de etiologia variável, podendo ser causada por fatores genéticos, ambientais ou ambos.7 Apesar da melhoria do controle de doenças como rubéola e meningite, globalmente existe uma preocupação crescente com a exposição a ruídos excessivos provenientes de fontes não ocupacionais, como tráfego, e de ambientes recreativos, como boates, discotecas, bares, cinemas, shows, eventos esportivos.1,8
Pode-se perceber que a PAperda auditiva é um problema de saúde pública de grande impacto na vida cotidiana, não somente do ponto de vista individual mas também das perspectivas familiar e populacional. Portanto, trata-se de um problema que merece toda a atenção do médico de família e comunidade (MFCmédico de família e comunidade).
- Objetivos
Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de
- discutir a relevância e o impacto da PAperda auditiva em adultos e idosos;
- reconhecer a necessidade de o MFCmédico de família e comunidade saber abordar e conduzir a PAperda auditiva em adultos e idosos;
- listar os principais diagnósticos clínicos associados à PAperda auditiva em adultos e idosos;
- desenvolver um raciocínio clínico de abordagem das principais causas de PAperda auditiva em adultos e idosos;
- realizar o exame físico em pacientes com suspeita de PAperda auditiva;
- solicitar e interpretar exames complementares para o diagnóstico de PAperda auditiva;
- identificar os sinais de alerta vermelho e os limites da atuação individual do MFCmédico de família e comunidade, garantindo o efetivo manejo de causas simples de PAperda auditiva na atenção primária à saúde (APSatenção primária à saúde) e o referenciamento a outros níveis, quando necessário;
- coordenar o cuidado de pacientes com PAperda auditiva, compartilhando a condução dos casos com os devidos profissionais para uma abordagem interdisciplinar adequada;
- discutir os pontos-chave da promoção e da prevenção de saúde (educação ao paciente, educação popular) no que tangem à PAperda auditiva.
- Esquema conceitual