As enfermarias de pediatria, até recentemente, acolhiam e tratavam crianças com doenças adquiridas na comunidade, muitas delas imunopreveníveis. Eram raras as ocasiões em que havia casos complexos, de difícil tratamento, em crianças, por exemplo, portadoras de imunodeficiências primárias ou com câncer. Ao longo dos últimos 30 anos, pode-se observar significativa mudança nesse cenário.
Na atualidade, tanto o intensivista como o infectologista pediátrico se deparam, nas visitas à beira do leito, com crianças e adolescentes afetados por uma enorme variedade de patologias complexas, com comprometimento de vários órgãos e sistemas e com diferentes graus de imunodeficiências ou imunossupressão. Hoje, os transplantes constituem uma modalidade terapêutica cada vez mais utilizada.
Em um artigo introdutório sobre infecções em pacientes imunodeprimidos, Fishman, em 2011, pondera sobre por que é necessário que os médicos saibam mais sobre esses pacientes. Refere que, independentemente de suas especialidades, os médicos serão confrontados com os efeitos adversos de terapêuticas que cursam com variados graus de imunodepressão, como quimioterapia, transplante de células-tronco hematopoiéticas (TCTHtransplante de células-tronco hematopoiéticas), transplante de órgãos sólidos (TOStransplante de órgãos sólidos), terapêuticas para doenças autoimunes e doenças reumatológicas.1
Desde a década de 1980, com o surgimento da infecção por HIV/aids, a medicina vem sendo desafiada a compreender e tratar as pessoas afetadas nessa pandemia. As doenças oportunistas, até então incomuns, tornaram-se desafios cotidianos para os profissionais de saúde.
A despeito dos avanços alcançados na prevenção, no diagnóstico e no tratamento da infecção no imunodeprimido, a infecção continua sendo a principal causa de elevada morbidade, do aumento da duração da permanência em hospital e do aumento dos custos totais, além de apresentar grande impacto na mortalidade. As taxas de mortalidade nas unidades de terapia intensiva (UTIunidade de terapia intensivas) são maiores nos pacientes imunodeprimidos, em parte devido à gravidade dos quadros infecciosos, tornando críticos tanto a necessidade de detecção precoce como o manejo adequado das infecções nessa população.2,3
Neste artigo, serão abordados quatro tópicos acerca das infecções em crianças e adolescentes imunodeprimidos: receptores de TOStransplante de órgãos sólidos, receptores de TCTHtransplante de células-tronco hematopoiéticass, portadores de infecção pelo HIV e tratamento anti-infeccioso dessas infecções.
- Objetivos
Ao final da leitura deste artigo, o leitor será capaz de:
- avaliar os mecanismos de imunodepressão relacionados a transplantes e HIV;
- descrever as infecções em crianças e adolescentes submetidos a transplantes e infectados pelo HIV;
- prever as situações de emergência que podem ocorrem em crianças com HIV/aids;
- realizar o manejo da criança com suspeita de quadro infeccioso;
- propor o tratamento empírico e/ou de escolha para os microrganismos identificados.
- Esquema conceitual