Introdução
Apesar de incomuns, as doenças intersticiais pulmonares (DIPdoenças intersticiais pulmonares) são importantes, em virtude da sua alta morbidade e mortalidade. Alguns autores consideram que as DIPdoenças intersticiais pulmonares deveriam chamar-se de doenças difusas pulmonares, pois, comumente, há envolvimento dos demais compartimentos dos pulmões, como o espaço alveolar, as vias aéreas e a vasculatura pulmonar.1
No contexto clínico e etiológico, as DIPdoenças intersticiais pulmonares são divididas em quatro grandes grupos:1
- pneumonias intersticiais idiopáticas (PIIpneumonias intersticiais idiopáticas);
- pneumonias intersticiais de causa conhecida;
- doenças granulomatosas;
- outras doenças difusas pulmonares com envolvimento intersticial.
As PIIpneumonias intersticiais idiopáticas são processos inflamatórios difusos fibrosantes ou potencialmente fibrosantes de etiologia desconhecida, sendo representadas principalmente pela doença chamada de fibrose pulmonar idiopática (FPIfibrose pulmonar idiopática). As pneumonias intersticiais de causa conhecida estão relacionadas principalmente com doenças ou reações sistêmicas que cursam com fibrose pulmonar, identificadas pelos padrões patológicos e radiológicos das PIIpneumonias intersticiais idiopáticas (essas servem de “protótipos”). Tais doenças são representadas em especial pelas doenças reumatológicas ou colagenovasculares — artrite reumatoide (AR), esclerose sistêmica, lúpus eritematoso sistêmico (LES) e outras —, reações medicamentosas e doenças exposicionais como as pneumoconioses e a pneumonia de hipersensibilidade (PH). Esses dois grupos de DIPdoenças intersticiais pulmonares, em geral, são discutidos juntos, como será feito neste capítulo.
As doenças granulomatosas representam as DIPdoenças intersticiais pulmonares em que há o componente de processo inflamatório do tipo granulomatoso, com formação de pequenos nódulos formados sobretudo por macrófagos. As principais representantes são a sarcoidose e a silicose, fazendo diagnóstico diferencial com as infecções granulomatosas, como as causadas pela tuberculose, micobacteriose não tuberculosa e fungos. Já o quarto grupo de DIPdoenças intersticiais pulmonares é amplo e heterogêneo, de diferentes etiologias e manifestações, incluindo as doenças císticas pulmonares (por exemplo, linfangioliomiomatose e histiocitose de células de Langerhans) e as doenças metabólicas e de depósito (por exemplo, proteinose alveolar e microlitíase alveolar pulmonar).1,2
O papel da imagem é essencial no diagnóstico das DIPdoenças intersticiais pulmonares e, em especial, das PIIpneumonias intersticiais idiopáticas. Atualmente, o padrão-ouro no diagnóstico da DIPdoenças intersticiais pulmonares não é mais considerado a histopatologia (biópsia), mas sim a avaliação multidisciplinar, que inclui a avaliação clínica (história, exame físico e exames laboratoriais), a imagem médica — sobretudo a tomografia computadorizada de alta resolução (TCAR) — e o estudo anatomopatológico, quando necessário.3,4
O padrão-ouro no diagnóstico da DIPdoenças intersticiais pulmonares é a avaliação multidisciplinar.
A avaliação por imagem da DIPdoenças intersticiais pulmonares tem como principal objetivo classificar a doença de acordo com os padrões estabelecidos e identificar os sinais de fibrose. Os padrões tomográficos, conforme serão discutidos a seguir, têm valor não somente diagnóstico, mas também prognóstico. A presença de fibrose na imagem tomográfica, independentemente do padrão ou da doença, é marcadora de pior prognóstico.
Mais recentemente, houve um “renascimento” do interesse nas doenças fibrosantes pulmonares graças ao surgimento de medicações antifibróticas, em especial o nintedanibe e a pirfenidona. Esses fármacos são indicados sobretudo para o tratamento da FPIfibrose pulmonar idiopática, mas ensaios clínicos têm mostrado benefício no seu uso também para outras formas de doenças fibrosantes pulmonares, como na esclerose sistêmica e nas DIPdoenças intersticiais pulmonares inclassificáveis.5–8
Os antifibróticos não são curativos, porém, são capazes de reduzir a progressão do declínio da função pulmonar e podem vir a ter impacto na mortalidade. Diante da ausência prévia de opções terapêuticas para esses pacientes, o desenvolvimento e a validação dessas medicações têm sido vistos com entusiasmo pela comunidade médica.
Assim, neste capítulo, serão discutidas as DIPdoenças intersticiais pulmonares com padrão de PIIpneumonias intersticiais idiopáticas e as principais doenças relacionadas. O foco será no papel do exame de imagem e na interpretação padronizada da TCAR. Os demais grupos de DIPdoenças intersticiais pulmonares, como as doenças granulomatosas e císticas pulmonares, não serão discutidos.
Objetivos
Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de
- realizar a técnica adequada de TCAR para o estudo de DIPdoenças intersticiais pulmonares;
- praticar a semiologia radiológica correta na interpretação da TCAR;
- identificar a classificação atual das PIIpneumonias intersticiais idiopáticas;
- reconhecer os principais padrões de PIIpneumonias intersticiais idiopáticas, em uma análise sistematizada e moderna;
- discutir as principais doenças e etiologias das PIIpneumonias intersticiais idiopáticas no contexto multidisciplinar.