Introdução
As cirurgias da tireoide vêm crescendo nos últimos anos, o que coincide com o aumento de casos diagnosticados de câncer nesse órgão. Nos Estados Unidos, por exemplo, no período entre 1993 e 2000 foram realizadas 364.288 tireoidectomias; entre 2001 e 2008, esse número aumentou para 507.356.1
Os nódulos tireoidianos são mais prevalentes no sexo feminino e sua incidência é aumentada após os 40 anos de idade, estimando-se que podem ser encontrados em mais de 50% dessa população quando se utiliza a detecção por meio da ultrassonografia (USGultrassonografia).2 Da mesma forma, o câncer de tireoide é mais comum no sexo feminino, sendo o tumor diagnosticado, com mais frequência, em mulheres entre 20 e 34 anos de idade. Assim, questões estéticas podem se tornar um tópico importante, em especial para pacientes jovens.
Para saber mais:
Theodore Kocher, no século XIX, abriu uma nova era na cirurgia da tireoide ao padronizar a técnica cirúrgica. Antes dele, o índice de complicações e mortalidade era inaceitável. Por sua dedicação ao estudo da glândula tireoide, ele recebeu o Prêmio Nobel em 1909.
Desde Kocher, poucas mudanças ocorreram na técnica cirúrgica da tireoidectomia. Quase 100 anos se passaram até que a cirurgia endoscópica fosse aplicada à tireoide e marcasse a grande modificação técnica. Desde então, muitas variantes surgiram, como a abordagem endoscópica cervical,3 a cervical videoassistida,4 a axilar,5 axilomamária,6 areolar7 e retroauricular,8 estando ou não assistidas por robô. A tireoidectomia endoscópica se popularizou em alguns países asiáticos, mas na Europa e na América ela não ganhou muitos seguidores.
O objetivo dessas técnicas era diminuir o tamanho da cicatriz ou, ao menos, posicioná-la em um local menos exposto, como, por exemplo, as axilas. Todavia, essas cirurgias geram cicatrizes ainda maiores que, apesar de se localizarem em áreas menos expostas, causam alteração estética significativa.
Além disso, é necessária maior dissecção tecidual, causando maior trauma cirúrgico, além de algumas complicações, como dessensibilização dos retalhos cutâneos na axila e região clavicular/tórax e lesão de estruturas nervosas, como o plexo braquial, etc. A classificação que receberam, no início, de “cirurgias minimamente invasivas”, logo foi questionada e depois abandonada, sendo então classificadas como “cirurgia por acesso remoto”.
Com o advento da cirurgia endoscópica transluminal por orifício natural, inicialmente usada para acessar órgãos intra-abdominais, surgiram estudos em animais9 e cadáveres humanos10 visando à tireoidectomia endoscópica transoral. Os primeiros estudos clínicos mostraram níveis significativos de complicações, em especial lesões do nervo mentoniano.11,12
Por fim, em 2016, o Dr. Angkoon Anuwong, na Tailândia, publicou a primeira grande série de casos com uma nova técnica, a tireoidectomia endoscópica transoral por acesso vestibular (em inglês, transoral endoscopic thyroidectomy vestibular approach [TOETVAtireoidectomia endoscópica transoral por acesso vestibular]). Nessa publicação, ele mostrou não só ser possível realizar a cirurgia por via endoscópica oral, mas também obteve índices de complicação comparáveis aos da cirurgia tradicional.13 Como grande vantagem, as incisões são pequenas e ficam completamente “invisíveis”, já que se localizam na mucosa do lábio inferior.
Essa inovação técnica é ainda pouco difundida no Brasil, com apenas uma publicação na literatura até o momento;14 porém, baseando-se na grande aceitação da TOETVAtireoidectomia endoscópica transoral por acesso vestibular em vários outros países, espera-se que ela venha a ser de domínio de todo o cirurgião que rotineiramente realiza a tireoidectomia clássica.
Objetivos
Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de
- descrever a técnica da TOETVAtireoidectomia endoscópica transoral por acesso vestibular, dando ao leitor a percepção dos passos cirúrgicos mais peculiares a essa abordagem;
- discutir as indicações e contraindicações da TOETVAtireoidectomia endoscópica transoral por acesso vestibular;
- identificar as principais vantagens e desvantagens da TOETVAtireoidectomia endoscópica transoral por acesso vestibular.