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A CONSTRUÇÃO SOCIAL DO MASCULINO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A SAÚDE: UMA PERSPECTIVA DE GÊNERO

Autores: Jocelly de Araújo Ferreira, Rita de Cássia Marques, Roseni Rosângela de Sena
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  • Introdução

A pós-modernidade se distingue como um período desordenado e de céleres transformações, em que os seres humanos se definem, indagam e redefinem seu sentido de identidade nacional, étnica, religiosa, política, familiar, sexual e pessoal. Essas mudanças foram enérgicas em alguns ideais e concepções, na medida em que os humanos modificaram seus conceitos em relação aos estereótipos que segregam ou unem a sociedade.1

Optar por trabalhar com homens, na perspectiva do cuidado, leva a questões relacionadas ao gênero e ao sexo. A abordagem de gênero pode ser relacional ou estruturalista; ambas as perspectivas apresentam verdades inerentes à forma como os homens se construíram socialmente ao longo dos anos e como essa construção, por vezes alvo de críticas, interfere na saúde.

O termo gênero compreende uma perspectiva biológica, sociológica e cultural, ao revelar conteúdos imprescindíveis em relação às experiências masculinas e femininas, incluindo a explanação em torno das desigualdades persistentes entre homens e mulheres na sociedade. O gênero se torna uma maneira de apresentar os atributos sociais específicos aos papéis dos homens e das mulheres.2,3

O gênero estabelecido na sociedade perfaz características assumidas por cada ser humano. Os homens, protagonistas dessa obra, têm sua saúde grandemente afetada por determinações singulares a seu gênero. Em razão das relações construídas para originar seu Eu masculino, os homens se colocam em uma posição de indefensibilidade em sua saúde.

Os conceitos considerados coerentes para uma masculinidade aceita e dominante na sociedade atribuem ao homem uma masculinidade chamada de hegemônica. Ela se caracteriza por ser normativa, incorpora a forma mais honrada de ser homem, determina que todos os homens se assumam diante dela e legitima ideologicamente a subordinação global das mulheres aos homens.4

A masculinidade hegemônica outorga ao homem um estereótipo de corajoso, viril, destemido, forte física e emocionalmente e provedor de seu lar. Essa conformação de entender e vivenciar a masculinidade impõe ao homem uma condição apreendida como invulnerável ao adoecimento e às fragilidades sociais, circunstância que determina uma barreira para que os homens cuidem da própria saúde.5,6

No Brasil, observam-se altos índices de morbidade e mortalidade masculina, atribuídos à ideologia que os homens têm sobre sua masculinidade. Destacam-se os índices das seguintes morbidades:7

 

  • lesões, envenenamentos e outras causas externas;
  • doenças do aparelho digestivo (hérnias, colelitíase e colecistite, doença do apêndice);
  • doenças do aparelho circulatório (insuficiência cardíaca, infarto agudo do miocárdio [IAM]);
  • doenças infecciosas e parasitárias (diarreia, vírus da imunodeficiência humana [HIV], gastrenterites, dengue);
  • doenças do aparelho respiratório (pneumonia, asma, bronquite, doença pulmonar obstrutiva crônica [DPOCdoença pulmonar obstrutiva crônica]).

A mortalidade masculina está representada pelos seguintes fatores:7

 

  • causas externas (agressões por armas de fogo ou por objetos perfurantes e cortantes, acidentes de moto, lesões autoprovocadas);
  • doenças do aparelho digestivo (doença alcoólica do fígado, fibrose, cirrose hepática);
  • doenças do aparelho circulatório (IAM, acidente vascular cerebral [AVC], hemorragia intracerebral, cardiomiopatias);
  • neoplasias (brônquios, estômago, esôfago);
  • doenças infecciosas e parasitárias (infecções pelo HIV e por outros parasitas).

Em 2010, o Ministério da Saúde (MSMinistério da Saúde), preocupado com a conjuntura de saúde da população masculina, decidiu implementar uma política de saúde pública que alcançasse esse público, a fim de diminuir os índices de morbidade e mortalidade previsíveis entre os homens: a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (PNAISHPolítica Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem).8 Ela foi divulgada e implantada amplamente na Estratégia Saúde da Família (ESFEstratégia Saúde da Família) de vários municípios do Brasil, mas só agora se observa uma implementação mais ativa.

Mesmo que a PNAISHPolítica Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem tenha sido efetivada na atenção primária à saúde (APSatenção primária à saúde), nos municípios brasileiros, os profissionais que desenvolvem a atenção à saúde — em específico da área de enfermagem, em decorrência de seu contato direto com os usuários masculinos dos serviços de saúde — necessitam congregar uma visão mais qualificada e direcionada. Somente assim será possível desenvolver uma assistência mais eficaz e equânime e, dessa maneira, reduzir as doenças e complicações desses agravos na população masculina.

Nota: Este capítulo de livro foi um recorte de Tese – Ferreira JA. Cuidado domiciliar ao homem na perspectiva do atendimento às suas necessidades de saúde [tese]. Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais; 2018.

  • Objetivos

Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de

 

  • reconhecer a interface entre os estereótipos de gênero e a saúde masculina;
  • caracterizar os tipos de masculinidades e sua influência na saúde masculina;
  • reconhecer a importância dos determinantes da saúde para o cuidado masculino;
  • apresentar os índices de morbidade e mortalidade prevalentes na população masculina brasileira;
  • descrever a PNAISHPolítica Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem;
  • identificar a função do enfermeiro da APSatenção primária à saúde durante a tomada de decisão para ações que contemplem a atenção à saúde masculina;
  • sistematizar uma assistência de enfermagem direcionada à população masculina.
  • Esquema conceitual
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