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ABORDAGEM A PESSOAS COM ANEMIA NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE

Autores: Matheus Martins de Sousa Dias, Bruno Limaverde Vilar Lobo
epub-BR-PROMEF-C16V3_Artigo2

Objetivos

Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de

  • compreender a relevância das anemias na rotina do médico de família e comunidade (MFC);
  • identificar a importância do método clínico centrado na pessoa (MCCP) como ferramenta de auxílio para diagnóstico e plano terapêutico das anemias;
  • compreender a fisiopatologia envolvida na gênese das anemias;
  • realizar a abordagem diagnóstica das anemias na atenção primária à saúde (APS);
  • identificar os sinais de alarme que indicam possibilidade de doenças graves;
  • estabelecer o plano terapêutico adequado para o tratamento das anemias nos diversos ciclos da vida no contexto da APS.

Esquema conceitual

Introdução

Palidez e fraqueza devem-se à corrupção do sangue (Hipócrates, ~ 400 a.C.).

A anemia é uma das condições clínicas mais comuns no mundo, sendo sua principal causa a carência de ferro. O especialista em medicina de família e comunidade deve compreender as relações entre anemia e mau estado nutricional, a dificuldade de acesso aos serviços de saúde e os baixos índices de desenvolvimento humano, além do manejo diagnóstico e terapêutico das principais causas de anemia.

A anemia é a diminuição da taxa de hemoglobina (Hb) sanguínea abaixo de 13g/dL para homens adultos, 12g/dL para mulheres adultas e 11g/dL para gestantes, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).1 Tais critérios foram estabelecidos como parâmetros para estudos nutricionais internacionais. Para o cuidado dos pacientes, valores de concentração de Hb e de hematócrito (Ht) ou contagem de hemácias abaixo do esperado, para uma determinada população, correspondem à definição de anemia.

Apesar de a anemia ferropriva ser a principal causa a ser erradicada, o médico não deve esquecer que a anemia, no hemograma, não implica entidade nosológica específica, mas revela a necessidade de pesquisa adequada da etiologia para posterior proposta terapêutica.2,3

Método clínico centrado na pessoa

O MCCP corresponde ao método de abordagem do cuidado centrado no indivíduo e contribui para a prática clínica do médico e demais profissionais da saúde. Em sua descrição atual, apresenta quatro componentes interativos.

A proposta do MCCP visa superar a doença e compreender o paciente envolvido no processo de adoecimento com empatia e humanidade, englobando questões individuais (biológicas, emocionais, psicológicas, espirituais) e relacionais (profissional–pessoa, familiares, comunitárias).

O primeiro componente do MCCP é explorando a saúde, a doença e a experiência da doença. Compreender significados, aspirações relacionadas à saúde e metas de vida é muito importante como forma de promover a saúde. Coletar história clínica, exame físico e exames complementares, com detalhamento e rigorosidade, faz parte da compreensão do adoecimento.

A experiência da doença para cada indivíduo também deve ser obtida por meio do auxílio do mnemônico SIFE, que nomina sentimentos, ideias, funcionamento e expectativas do paciente. A compreensão dos três domínios (saúde, doença e experiência da doença) busca um entendimento integrado, síntese única para cada pessoa.

O segundo componente do MCCP — entendendo a pessoa como um todo — engloba características próprias do paciente, como princípios, valores morais, biografia, personalidade, do seu contexto próximo (ciclo de vida, abordagem familiar, redes de suporte) e do contexto amplo (comunidade, trabalho).

O terceiro componente do MCCP — elaborando um plano conjunto de manejo dos problemas — inclui a educação em saúde e a prevenção de doenças. É preciso estabelecer os problemas de saúde com definição de prioridades e metas de tratamento e identificar os papéis do paciente, do médico e de outros sujeitos envolvidos no cuidado, com tomada de decisão em conjunto.

O quarto componente do MCCP — intensificando a relação entre a pessoa e o médico — é relacional e corresponde à sustentação contínua necessária, em que os três outros componentes tomam forma. Envolve aspectos, como transferência, contratransferência, empatia e compaixão, e exige do médico postura ativa suscetível à construção do vínculo.4

Anemias

Sinais e sintomas

A síndrome anêmica pode se manifestar de modo assintomático/oligossintomático ou, ainda, com astenia, palidez cutaneomucosa, cefaleia, tontura, dispneia, palpitações, sopros cardíacos, entre outros. É fundamental questionar o paciente sobre comorbidades, histórico familiar, medicações em uso, cirurgias prévias, alimentação e perversão do apetite, história ginecológica, sintomas gastrintestinais e evolução dos sintomas.

Alterações no exame físico também podem sugerir causas específicas de anemia, como:5

  • coiloníquia e queilite angular (anemia ferropriva);
  • neuropatia, hiperpigmentação cutânea e queilite angular (anemia megaloblástica);
  • icterícia e história de colelitíase (anemia hemolítica);
  • raça negra, dores musculares e úlceras maleolares (anemia falciforme);
  • fácies em esquilo (talassemia), telangiectasias, eritema palmar, rarefação de pelos e ginecomastia (hepatopatia);
  • linfonodomegalias (doenças linfoproliferativas).

Fisiopatologia

Para compreender o manejo clínico das anemias, é necessário revisitar sua fisiopatologia.

Hematopoese

O conhecimento sobre a hematopoese, ou seja, o processo envolvido na produção das múltiplas células sanguíneas provenientes da célula-tronco hematopoética, é fundamental para compreensão do hemograma e das manifestações patológicas evidenciadas nele.

O sítio de produção fisiológica das células sanguíneas no ser humano é a medula óssea (MO). Estudos6–8 em seres humanos e murinos evidenciaram que outros sítios podem contribuir com a função de fabricação citológica na vida embrionária, entre eles, o saco vitelínico, a placenta, o sistema retículo-endotelial (fígado, baço e linfonodos) e a própria MO (Figura 1).

FIGURA 1: Sítios de hematopoese do período embrionário à vida adulta. // Fonte: Elaborada pelos autores.

Em condições patológicas que levam à anemia, pode-se observar um estímulo aumentado à produção dessas células na MO. Exemplo habitual é o que ocorre nas talassemias, em que os pacientes podem apresentar fácies em esquilo, decorrente do excesso de produção celular (hiperplasia) nos ossos longos do corpo.

De modo similar, em situações em que a MO se torna insuficiente em produzir as células hematopoéticas, é possível que os sítios de fabricação da vida embrionária retornem à antiga função e passem a produzir novamente células hematopoéticas. Não é incomum observar hepatomegalia, esplenomegalia e linfonodomegalia em pacientes com doenças hematológicas.

O processo descrito é conhecido como metaplasia mieloide, um dos mecanismos de aumento dos linfonodos, do baço e do fígado nas doenças hematológicas. Outro mecanismo de aumento desses órgãos, muito mais comum na hematologia, é a infiltração do sistema reticuloendotelial por células neoplásicas. Neste capítulo, será explicado como ocorre o estímulo à produção de novas células quando os níveis de Hb caem no sangue periférico.

Chegando ao processo de hematopoese de fato, a célula-tronco pluripotente presente na MO se diferencia em célula progenitora mieloide e linfoide. A célula progenitora mieloide diferencia-se em uma linhagem comprometida com a produção eritroide-megacariocítica e outra comprometida com a formação granulocítica-monocítica. Já a célula progenitora linfoide dará origem aos progenitores dos linfócitos B e T.

Em conjunto, as células jovens são conhecidas como blastos. Agregando um prefixo a essa nomenclatura, pode-se nomear os diversos tipos de células jovens, entre as quais, eritroblastos, megacarioblastos, monoblastos, mieloblastos e linfoblastos. Tais células precursoras darão origem, após alta atividade mitótica e alta capacidade de diferenciação, às células maduras com alta diferenciação e sem capacidade de divisão.

A partir desse conhecimento, pode-se relembrar a importância da leitura sempre completa do hemograma, assim como da avaliação clínica do paciente, uma vez que mutações pontuais em linhagens imaturas das células sanguíneas podem afetar várias linhagens celulares maduras, e um olhar desatento ao hemograma pode deixar de flagrar alguma alteração importante, implicando condutas incompletas ou insuficientes perante o diagnóstico provável.

Eritropoese

A eritropoese não foge do padrão evidenciado para as outras células. As células jovens são produzidas na MO. Inicialmente, há um processo de maturação nuclear e hemoglobinização do citoplasma da célula vermelha jovem. O citoplasma, antes basofílico (azulado), vai se tornando eosinofílico (avermelhado).

Após o estágio de eritroblasto ortocromático, a célula perde o núcleo. A célula seguinte, anucleada, recebe o nome de reticulócito. Tal nomenclatura é decorrente da presença de retículo ou rede de RNA ribossomal que mantém a célula ainda mais basofílica do que a célula madura.

A meia-vida do reticulócito é de aproximadamente 4 dias, e é a célula liberada pela MO para alcançar a circulação periférica. Ao alcançar sua meia-vida, ocorre a perda do retículo, e a célula atinge sua maturidade, recebendo a nomenclatura de hemácia ou eritrócito.

É fundamental conhecer a descrição da evolução da hemácia. A partir da medida da quantidade de reticulócitos no sangue periférico, é possível inferir a capacidade da MO de produzir novas células, diferenciando causas de anemia a partir dessa variável.

Existe um feedback positivo para a produção de hemácias. Principalmente as células renais produzem, quando expostas à hipóxia tecidual diante de anemia, eritropoetina, uma glicoproteína capaz de estimular a MO a produzir novas células vermelhas. A redução da produção de eritropoetina, em pacientes com insuficiência renal crônica, é causa relevante de anemia nesse grupo de pacientes.

A Figura 2 mostra a eritropoese na MO.

FIGURA 2: Eritropoese na MO com estímulo da eritropoetina produzida no rim e seguida de hemocaterese no baço após senescência fisiológica dos eritrócitos. // Fonte: Elaborada pelos autores.

De fato, a hemácia apresenta como principal função a troca gasosa, que se dá por meio da presença de Hb. Se o corpo apresenta dificuldade de produzir tal molécula, as hemácias podem ser formadas com tamanho reduzido (microcitose) e descoradas (hipocromia). Como será visto adiante, pode-se classificar as anemias de acordo com o tamanho das hemácias e sua coloração, o que pode facilitar o raciocínio diagnóstico.

Para produção das hemácias, a MO necessita de nutrientes, como ferro (essencial para a molécula de Hb realizar o transporte de oxigênio), cobalamina ou vitamina B12 e ácido fólico ou vitamina B9 (necessários para a síntese de DNA dos eritrócitos). Em conjunto, as anemias causadas pela deficiência desses nutrientes são denominadas anemias carenciais, e as principais são anemia ferropênica ou ferropriva (deficiência de ferro) e anemia megaloblástica (deficiência de cobalamina ou ácido fólico).

O nome “megaloblástica” tem relação com a incapacidade de maturação celular na ausência de nutrientes, ocasionando, de forma patológica, um processo de eritropoese ineficaz marcada por células com dificuldades de divisão, que se tornam grandes (megalo: grande; blasto: célula jovem).

Hemoglobina

Para compreensão das causas de anemia, é necessário conhecer, além da hematopoese e da eritropoese, o processo de formação da Hb. A molécula apresenta a função de carrear o oxigênio para os tecidos e órgãos após recebê-lo nos alvéolos pulmonares.

A Hb é composta por quatro cadeias polipeptídicas de globina. Cada globina se conecta a uma molécula heme, formada por uma molécula de protoporfirina IX (que contém quatro anéis aromáticos) ligada ao átomo de ferro capaz de se combinar a uma molécula de oxigênio.

Cada molécula de Hb é passível de se ligar a quatro moléculas de oxigênio, uma vez que contém quatro globinas ligadas a quatro grupamentos heme e a quatro átomos de ferro. Várias causas de anemia estão relacionadas a alterações da fisiologia da Hb. No adulto normal, a Hb A (ou A1) é o tipo mais comum, composta por duas cadeias de globina α e duas cadeias de globina β.

As hemoglobinopatias se manifestam como um tipo de anemia denominada hemolítica (definição de hemólise adiante neste capítulo). É possível observar que alterações quantitativas das cadeias de globina são conhecidas como talassemias — talassemia α — redução ou perda da capacidade de produção da globina α, e talassemia β — redução ou perda da capacidade de produção da globina β.

As alterações qualitativas das globinas são inúmeras, porém a mais importante, em nosso meio, é a responsável pelo conjunto de manifestações associadas à doença falciforme, ocasionada por mutação pontual na molécula de globina β, em que ocorre substituição do aminoácido ácido glutâmico pela valina.

Outra doença associada à Hb é a anemia sideroblástica, que consiste em uma desordem hereditária ou adquirida decorrente de defeito na produção do grupamento heme, deixando o ferro livre para exercer seu efeito tóxico à célula.

Quando a produção de Hb é deficiente pela falta de ferro acessível (anemia ferropênica e anemia da inflamação) ou por defeitos herdados ou adquiridos da globina (talassemias) e da protoporfirina (anemia sideroblástica), há uma tendência à produção de células menores (microcíticas) e menos coradas (hipocrômicas).9

A Figura 3 apresenta os componentes da Hb e as causas de anemia microcítica e hipocrômica.

FIGURA 3: Componentes da Hb e causas de anemia microcítica e hipocrômica decorrentes de alterações em seus componentes. // Fonte: Elaborada pelos autores.

Meia-vida das células e destruição celular

Após sua liberação na corrente sanguínea por diapedese, o eritrócito tem uma sobrevida de 120 dias, sendo destruído de forma fisiológica no baço, processo conhecido como hemocaterese. Quando ocorre destruição patológica prematura das hemácias perifericamente, que excede a capacidade produtiva compensatória da MO de manter os níveis de Hb, tem-se o conceito de hemólise.

As anemias hemolíticas são um grupo de desordens caracterizadas pela presença de hemólise. Além dos sinais e sintomas clássicos relacionados à anemia descritos previamente e já previstos por Hipócrates (como palidez e fadiga), os pacientes com hemólise podem apresentar outros achados em sua história clínica, exame físico e exames complementares, que servem de ferramentas para a elucidação diagnóstica.

Como produto final da degradação do grupo heme após hemólise, há produção de bilirrubina livre (não conjugada ou indireta), que, em excesso no plasma, ocasiona icterícia. Portanto, é importante pesquisar, na suspeita de hemólise, história pessoal ou familiar de icterícia.

A destruição celular pode ocorrer nos capilares sanguíneos ou fora deles no baço (ambiente hostil para as células) e ocasionar, além de anemia e icterícia, esplenomegalia, no caso da hemólise extravascular, e alteração da coloração urinária por hemoglobinúria e hemossidenúria, em situações que cursem com hemólise intravascular. Por consequência da destruição celular, há aumento da enzima desidrogenase lática (LDH) presente anteriormente no meio intracelular e agora no plasma.

A haptoglobina, por sua vez, é uma proteína de fase aguda que se liga ao grupamento de Hb livre no plasma após hemólise, degradando-a, podendo ser dosada no sangue e, em caso de hemólise, se apresentará diminuída, sendo o marcador mais específico.

Os rins não se abstêm de produzir eritropoetina na presença de anemia, estimulando a MO a produzir e a liberar, na corrente sanguínea, células jovens, como eritroblastos ortocromáticos e reticulócitos.

Conforme discutido, o diagnóstico de hemólise pode ser feito a partir da história clínica e do exame físico acrescidos de achados laboratoriais, como anemia ao hemograma, reticulocitose, hiperbilirrubinemia indireta, aumento da LDH e diminuição da haptoglobina.10

Ciclo e perfil do ferro

O ferro é absorvido principalmente no duodeno. Alimentos ricos em ferro são carne vermelha, ovos, laticínios (forma heme), vegetais e grãos (forma não heme). É mais bem absorvido em sua forma heme, na membrana apical das células intestinais. No interior da célula intestinal, a molécula de ferro pode ser armazenada na forma de ferritina ou encaminhada para a região da membrana basolateral para entrar em contato com o tecido sanguíneo, por meio de uma molécula chamada ferroportina.

Na corrente sanguínea, o ferro é transportado por outra glicoproteína, denominada transferrina, sintetizada e liberada principalmente no fígado. A hepcidina, por sua vez, é uma molécula de fase aguda que, quando liberada, regula o acesso do ferro à molécula de transferrina no plasma, dificultando a formação do complexo plasmático ferro-transferrina.

Uma vez na corrente sanguínea, o ferro ligado à transferrina pode ser levado até a MO, onde pode apresentar dois principais trajetos fisiológicos — ser armazenado na forma de ferritina ou ser utilizado como matéria-prima para produção de Hb e circular nas células vermelhas por até 120 dias, quando a hemocaterese ocorrerá nos macrófagos do baço, na MO ou no fígado.

Após a hemocaterese, o ferro, nas células esplênicas, pode novamente ser armazenado na forma de ferritina ou retornar para a circulação ligado à transferrina para reaproveitamento posterior. Mais uma vez, a hepcidina, na MO e no baço, assim como ocorre nas células intestinais, dificulta a ligação do ferro à transferrina. A hepcidina está na gênese fisiopatológica da anemia da inflamação ou da anemia da doença crônica.

O ferro é eliminado do organismo por secreções corpóreas de células intestinais ou epidermais ou por sangramento menstrual.

A ferritina é a molécula responsável pelo armazenamento do ferro no organismo e corresponde ao exame mais acurado isoladamente para identificar ferropenia. A transferrina é a glicoproteína responsável pelo transporte do ferro na corrente sanguínea quando ele não está formando a Hb. A hepcidina é a proteína de fase aguda que dificulta o contato do ferro armazenado no intestino, na MO e no baço com a transferrina para circulação no organismo. É a principal proteína envolvida na gênese da anemia da inflamação.

Por ser a principal causa de anemia, é importante afastar a ferropenia quando se está diante de um paciente anêmico. Para isso, deve-se compreender o ciclo do ferro no organismo humano a fim de interpretar seu perfil nos exames complementares, principalmente para diferenciação de anemia ferropriva e anemia da inflamação. Na anemia da inflamação, não há carência de ferro isoladamente, mas existe sua má distribuição no organismo mediado pela hepcidina.

A ferritina, representando os estoques de ferro e também uma proteína de fase aguda produzida em resposta a insultos inflamatórios, encontra-se reduzida na anemia ferropriva e aumentada na anemia da inflamação.

O ferro sérico é a medida laboratorial da quantidade de ferro na corrente sanguínea ligado à transferrina. Na anemia ferropriva, o ferro sérico costuma estar baixo por carência do mineral, enquanto, na anemia da inflamação, também costuma estar baixo, porém em função da presença da hepcidina, que dificulta sua entrada no plasma.

A transferrina também pode ser medida laboratorialmente, contudo é um exame caro e de mais difícil acesso. Uma forma de medi-la com maior acessibilidade é por meio de um exame chamado capacidade total de ligação do ferro (em inglês, total iron-binding capacity [TIBC]), que equivale ao número de sítios de ligação do ferro às moléculas de transferrina presentes no plasma.

Outra forma de explicar a TIBC é dizer que equivale ao valor do ferro sérico ligado à transferrina somado à capacidade latente de ligação do ferro. A capacidade latente de ligação do ferro corresponde aos sítios de transferrina existentes ainda livres de ferro. Na anemia ferropriva, a quantidade de transferrina e, consequentemente, da TIBC costumam estar altas em virtude dos mecanismos regulatórios que estimulam a produção de transferrina e receptores no fígado. Na anemia da inflamação, a TIBC pode estar normal ou diminuída.

Por fim, pode ser avaliada, também, a saturação de transferrina, que equivale à fração entre ferro sérico e TIBC e estima a relação entre sítios de transferrina ocupados e não ocupados por ferro. Como na anemia ferropriva, o ferro sérico está baixo (numerador) e a quantidade de transferrina ou TIBC está alta (denominador), a saturação de transferrina costuma estar baixa, enquanto na anemia da inflamação, o valor pode ser normal ou diminuído (lembrando que a hepcidina dificulta a ligação do ferro à transferrina).11

As Figuras 4A–D apresentam o ciclo do ferro.

FIGURA 4: Ciclo do ferro. A) Absorção do ferro no intestino. B) Formação do complexo plasmático ferro-transferrina e transporte do ferro até a MO para armazenamento e formação da Hb. C) O ferro circula na forma de Hb, em média, 120 dias até hemocaterese no baço, onde pode ser armazenado ou retornar para a corrente sanguínea ligado à transferrina. D) Ação da hepcidina impedindo a formação do complexo plasmático ferro-transferrina em intestino, MO e baço. // Fonte: Elaborada pelos autores.

Vitamina B12 (cobalamina) e vitamina B9 (ácido fólico)

A vitamina B12 pode ser obtida a partir de carnes, peixes e laticínios; já o ácido fólico, a partir de alimentos vegetais. A cobalamina e o ácido fólico são vitaminas que atuam como coenzimas no metabolismo dos ácidos nucleicos, sendo relevantes na fisiologia da divisão celular das células em geral e do sistema sanguíneo em particular. No contexto de deficiência dessas vitaminas, ocorre maturação nuclear defeituosa, retardo ou bloqueio da divisão celular, ocasionando eritropoese ineficaz e assincronia núcleo–citoplasma. Morfologicamente, isso pode ser expresso como anemia macrocítica ou normocítica, amplitude de distribuição dos glóbulos vermelhos (em inglês, red cell distribution widt [RDW]) alta, LDH aumentada, bilirrubina indireta aumentada, reticulócitos costumeiramente baixos e presença de neutrófilos hipersegmentados.

As células gástricas produzem fator intrínseco que se liga à vitamina B12 para que ocorra absorção dessa vitamina no íleo distal com posterior armazenamento no fígado. O diagnóstico pode ser complementado por meio de dosagem de cianocobalamina e ácido fólico séricos e aumento de homocisteína (ambas as deficiências) e de ácido metilmalônico (apenas na deficiência de B12).

A anemia megaloblástica pode ser causada por deficiência da ingestão de vitaminas, por má-absorção ou uso de medicações (como metformina, fenitoína e metotrexate). A presença de anticorpos anticélulas parietais e antifator intrínseco sugere o diagnóstico de anemia perniciosa em paciente com anemia megaloblástica e gastrite atrófica na esofagogastroduodenoscopia. Outras causas de anemia megaloblástica incluem:

  • pacientes submetidos à cirurgia bariátrica sem reposição adequada de uma ou ambas as vitaminas;
  • pancreatite crônica;
  • doença inflamatória intestinal;
  • síndrome da alça cega.

Clinicamente, o paciente apresentará síndrome anêmica acompanhada de manifestações neurológicas na deficiência de vitamina B12, como neuropatia periférica, síndrome demencial e até acometimento da medula espinhal, ocasionando neuropatia combinada subaguda. A associação de outras doenças autoimunes com a anemia perniciosa também é muito comum. Por prejudicar a divisão celular de outras linhagens de células, o paciente pode apresentar outras citopenias, assim como queilite angular e glossite.12

ATIVIDADES

1. Sobre o MCCP, assinale a alternativa correta.

A) É o método de abordagem do cuidado centrado no profissional de saúde e contribui para a prática clínica do médico.

B) Sua proposta visa tratar a doença e compreender o paciente envolvido no processo de adoecimento, englobando questões relacionais (profissional–pessoa e comunitárias).

C) Sua proposta objetiva superar a doença e compreender o paciente em processo de adoecimento com empatia e humanidade, englobando questões individuais e relacionais.

D) É o método de abordagem do cuidado centrado no indivíduo e apresenta seis componentes relacionados ao papel do médico no processo de saúde–doença.

Confira aqui a resposta

Resposta incorreta. A alternativa correta e a "C".


O MCCP corresponde ao método de abordagem do cuidado centrado no indivíduo e contribui para a prática clínica do médico e demais profissionais da saúde. Em sua descrição atual, apresenta quatro componentes interativos. A proposta do MCCP visa superar a doença e compreender o paciente envolvido no processo de adoecimento com empatia e humanidade, englobando questões individuais (biológicas, emocionais, psicológicas, espirituais) e relacionais (profissional–pessoa, familiares, comunitárias).

Resposta correta.


O MCCP corresponde ao método de abordagem do cuidado centrado no indivíduo e contribui para a prática clínica do médico e demais profissionais da saúde. Em sua descrição atual, apresenta quatro componentes interativos. A proposta do MCCP visa superar a doença e compreender o paciente envolvido no processo de adoecimento com empatia e humanidade, englobando questões individuais (biológicas, emocionais, psicológicas, espirituais) e relacionais (profissional–pessoa, familiares, comunitárias).

A alternativa correta e a "C".


O MCCP corresponde ao método de abordagem do cuidado centrado no indivíduo e contribui para a prática clínica do médico e demais profissionais da saúde. Em sua descrição atual, apresenta quatro componentes interativos. A proposta do MCCP visa superar a doença e compreender o paciente envolvido no processo de adoecimento com empatia e humanidade, englobando questões individuais (biológicas, emocionais, psicológicas, espirituais) e relacionais (profissional–pessoa, familiares, comunitárias).

2. Quais os sinais e sintomas da síndrome anêmica?

Confira aqui a resposta

A síndrome anêmica pode se manifestar de modo assintomático/oligossintomático ou, ainda, com astenia, palidez cutaneomucosa, cefaleia, tontura, dispneia, palpitações, sopros cardíacos, entre outros. É fundamental questionar o paciente sobre comorbidades, histórico familiar, medicações em uso, cirurgias prévias, alimentação e perversão do apetite, história ginecológica, sintomas gastrintestinais e evolução dos sintomas.

Resposta correta.


A síndrome anêmica pode se manifestar de modo assintomático/oligossintomático ou, ainda, com astenia, palidez cutaneomucosa, cefaleia, tontura, dispneia, palpitações, sopros cardíacos, entre outros. É fundamental questionar o paciente sobre comorbidades, histórico familiar, medicações em uso, cirurgias prévias, alimentação e perversão do apetite, história ginecológica, sintomas gastrintestinais e evolução dos sintomas.

A síndrome anêmica pode se manifestar de modo assintomático/oligossintomático ou, ainda, com astenia, palidez cutaneomucosa, cefaleia, tontura, dispneia, palpitações, sopros cardíacos, entre outros. É fundamental questionar o paciente sobre comorbidades, histórico familiar, medicações em uso, cirurgias prévias, alimentação e perversão do apetite, história ginecológica, sintomas gastrintestinais e evolução dos sintomas.

3. Sobre a destruição celular, assinale a alternativa correta.

A) Depois da sua liberação na corrente sanguínea por diapedese, o eritrócito tem sobrevida de 60 dias.

B) Hemólise é quando acontece destruição patológica prematura das hemácias perifericamente que excede a capacidade produtiva compensatória da MO de manter os níveis de Hb.

C) A destruição celular se dá nos capilares sanguíneos, um ambiente hostil para as células.

D) A destruição celular pode ocasionar, além de anemia e icterícia, esplenomegalia e alteração da coloração urinária por hemoglobinúria e hemossidenúria em caso de hemólise intravascular.

Confira aqui a resposta

Resposta incorreta. A alternativa correta e a "B".


Após sua liberação na corrente sanguínea por diapedese, o eritrócito tem uma sobrevida de 120 dias, sendo destruído fisiologicamente no baço, caracterizando hemocaterese. A destruição celular pode ocorrer nos capilares sanguíneos ou fora deles no baço (ambiente hostil para as células) e ocasionar, além de anemia e icterícia, esplenomegalia, no caso da hemólise extravascular, e alteração da coloração urinária por hemoglobinúria e hemossidenúria, em situações que cursem com hemólise intravascular. Por consequência da destruição celular, há aumento da enzima LDH presente anteriormente no meio intracelular e, agora, no plasma.

Resposta correta.


Após sua liberação na corrente sanguínea por diapedese, o eritrócito tem uma sobrevida de 120 dias, sendo destruído fisiologicamente no baço, caracterizando hemocaterese. A destruição celular pode ocorrer nos capilares sanguíneos ou fora deles no baço (ambiente hostil para as células) e ocasionar, além de anemia e icterícia, esplenomegalia, no caso da hemólise extravascular, e alteração da coloração urinária por hemoglobinúria e hemossidenúria, em situações que cursem com hemólise intravascular. Por consequência da destruição celular, há aumento da enzima LDH presente anteriormente no meio intracelular e, agora, no plasma.

A alternativa correta e a "B".


Após sua liberação na corrente sanguínea por diapedese, o eritrócito tem uma sobrevida de 120 dias, sendo destruído fisiologicamente no baço, caracterizando hemocaterese. A destruição celular pode ocorrer nos capilares sanguíneos ou fora deles no baço (ambiente hostil para as células) e ocasionar, além de anemia e icterícia, esplenomegalia, no caso da hemólise extravascular, e alteração da coloração urinária por hemoglobinúria e hemossidenúria, em situações que cursem com hemólise intravascular. Por consequência da destruição celular, há aumento da enzima LDH presente anteriormente no meio intracelular e, agora, no plasma.

4. Segundo a OMS, qual a definição de anemia?

A) Sinais e sintomas clínicos caracterizados por síndrome anêmica, como fadiga, palidez e dispneia.

B) Níveis de Hb baixos associados à elevação no número de plaquetas.

C) Perfil do ferro alterado, com ferro sérico, índice de saturação de transferrina e ferritina diminuídos e TIBC aumentada.

D) Definição predominantemente laboratorial, estando relacionada a níveis de Hb, Ht ou contagem de hemácias abaixo do esperado para grupos populacionais específicos.

Confira aqui a resposta

Resposta incorreta. A alternativa correta e a "D".


A definição de anemia não se relaciona exclusivamente aos sinais e sintomas clínicos, tampouco aos níveis do perfil do ferro ou ao número de plaquetas. Anemia é a diminuição da taxa de Hb sanguínea <13g/dL para homens adultos, 12g/dL para mulheres adultas e 11g/dL para gestantes, segundo a OMS. Tais critérios foram estabelecidos como parâmetros para estudos nutricionais internacionais. Para o cuidado dos pacientes, valores de concentração de Hb, Ht ou contagem de hemácias abaixo do esperado para uma determinada população correspondem à definição de anemia.

Resposta correta.


A definição de anemia não se relaciona exclusivamente aos sinais e sintomas clínicos, tampouco aos níveis do perfil do ferro ou ao número de plaquetas. Anemia é a diminuição da taxa de Hb sanguínea <13g/dL para homens adultos, 12g/dL para mulheres adultas e 11g/dL para gestantes, segundo a OMS. Tais critérios foram estabelecidos como parâmetros para estudos nutricionais internacionais. Para o cuidado dos pacientes, valores de concentração de Hb, Ht ou contagem de hemácias abaixo do esperado para uma determinada população correspondem à definição de anemia.

A alternativa correta e a "D".


A definição de anemia não se relaciona exclusivamente aos sinais e sintomas clínicos, tampouco aos níveis do perfil do ferro ou ao número de plaquetas. Anemia é a diminuição da taxa de Hb sanguínea <13g/dL para homens adultos, 12g/dL para mulheres adultas e 11g/dL para gestantes, segundo a OMS. Tais critérios foram estabelecidos como parâmetros para estudos nutricionais internacionais. Para o cuidado dos pacientes, valores de concentração de Hb, Ht ou contagem de hemácias abaixo do esperado para uma determinada população correspondem à definição de anemia.

5. Sobre o perfil do ferro, assinale a alternativa correta.

A) É absorvido, principalmente, no estômago. Alimentos ricos em ferro são carne vermelha (forma heme) e ovos e laticínios (forma não heme).

B) É mais bem absorvido em sua forma não heme na membrana apical das células intestinais.

C) A molécula de ferro é conduzida para a região da membrana basolateral para entrar em contato com o tecido sanguíneo por meio da ferritina.

D) É absorvido principalmente no duodeno. Alimentos ricos em ferro são carne vermelha, ovos, laticínios (forma heme) e vegetais e grãos (forma não heme).

Confira aqui a resposta

Resposta incorreta. A alternativa correta e a "D".


O ferro é absorvido principalmente no duodeno. Alimentos ricos em ferro são carne vermelha, ovos, laticínios (forma heme), vegetais e grãos (forma não heme). É mais bem absorvido em sua forma heme, na membrana apical das células intestinais. No interior da célula intestinal, a molécula de ferro pode ser armazenada na forma de ferritina ou encaminhada para a região da membrana basolateral para entrar em contato com o tecido sanguíneo, por meio de uma molécula chamada ferroportina.

Resposta correta.


O ferro é absorvido principalmente no duodeno. Alimentos ricos em ferro são carne vermelha, ovos, laticínios (forma heme), vegetais e grãos (forma não heme). É mais bem absorvido em sua forma heme, na membrana apical das células intestinais. No interior da célula intestinal, a molécula de ferro pode ser armazenada na forma de ferritina ou encaminhada para a região da membrana basolateral para entrar em contato com o tecido sanguíneo, por meio de uma molécula chamada ferroportina.

A alternativa correta e a "D".


O ferro é absorvido principalmente no duodeno. Alimentos ricos em ferro são carne vermelha, ovos, laticínios (forma heme), vegetais e grãos (forma não heme). É mais bem absorvido em sua forma heme, na membrana apical das células intestinais. No interior da célula intestinal, a molécula de ferro pode ser armazenada na forma de ferritina ou encaminhada para a região da membrana basolateral para entrar em contato com o tecido sanguíneo, por meio de uma molécula chamada ferroportina.

Valores de referência sugeridos no adulto

A Tabela 1 apresenta os valores de referência relacionados à anemia no adulto.

Tabela 1

VALORES DE REFERÊNCIA RELACIONADOS À ANEMIA NO ADULTO

Exame complementar

Valor de referência sugerido

Contagem de hemácias

4,5–6 x 106 (M)/4–5,4 x 106 (F)

Hb

13–6% (M)/12–16% (F)

Ht

40-52% (M)/36-48% (F)

Volume corpuscular médio

80–100fL

Hb corpuscular média

30–34pg

Concentração de Hb corpuscular média

30–36%

RDW

12–15%

Reticulócitos

20.000–100.000/µL

Haptoglobina

16–206mg/dL

Eletroforese de Hb

HbA >95%; HbA2: 1,5–3,5%; HbF 2%

Ferritina

30–400ng/mL (M)/13–150ng/mL (F)

Ferro sérico

65–175ug/dL (M)/50–170µg/dL (F)

Transferrina

200–360mg/dL

TIBC

250–450µg/dL

Índice de saturação de transferrina

20–50 (M)/15–50 (F)

Vitamina B12

206–678pg/mL

Ácido fólico

2,6–12,2ng/mL

F: feminino; M: masculino. // Fonte: Adaptado de Goldman e Schafer (2019).13

Classificação das anemias

Diante da discussão sobre a fisiologia das células vermelhas, é possível adquirir o substrato necessário para compreensão da classificação das anemias e como abordá-las diante do paciente. Do ponto de vista fisiopatológico, existem dois tipos de classificação das anemias que se complementam e facilitam o raciocínio diagnóstico de modo didático. Contudo, a mesma etiologia de anemia pode pertencer a mais de um dos grupos.

A primeira forma de classificar divide as anemias em três grupos de mecanismos fisiopatológicos distintos:

  • anemia por redução da produção de células hematopoéticas, decorrente de deficiências nutricionais, inflamação sistêmica, insuficiência de eritropoetina, lesão imunomediada ou infecção dos progenitores eritroides, defeitos genéticos adquiridos;
  • anemia por excesso de destruição de células hematopoéticas, que corresponde à ocasionada por hemólise pelos seguintes mecanismos:
    • anormalidades genéticas hereditárias ou adquiridas;
    • anormalidades dos lipídeos da membrana celular;
    • sequestro esplênico;
    • lesões imunomediadas, traumáticas, tóxicas ou químicas;
    • infecção dos eritrócitos;
  • anemia por perdas sanguíneas, que corresponde ao grupo de anemias decorrentes da perda sanguínea aguda ou crônica. A anemia por perda sanguínea crônica decorre da redução das reservas de ferro no organismo, enquanto a anemia por perda sanguínea aguda é secundária à perda de massa eritrocitária após lesão vascular.

A segunda forma de classificar divide as anemias quanto à capacidade da MO de produzir precursores eritropoéticos para o sangue periférico (reticulócitos):

  • anemia hipoproliferativa (índice de reticulócitos normal ou diminuído): incluem-se, nesse grupo, as anemias por redução da produção de células hematopoéticas e a anemia por perda sanguínea crônica. Nesses casos, a MO não é competente para otimizar a produção de novas células de forma compensatória;
  • anemia hiperproliferativa (índice de reticulócitos costumeiramente aumentado): incluem-se anemias por excesso de destruição de células hematopoéticas (hemólise), perda sanguínea aguda ou anemias carenciais após tratamento adequado. Nesse grupo, quando não ocorre tratamento adequado, a MO é competente ao produzir reticulócitos, porém as células são perdidas perifericamente.

Forma importantíssima de classificar as anemias é quanto à morfologia da célula no hemograma, de acordo com o VCM da hemácia:

  • anemias microcíticas (VCM <80fL) — ferropenia, anemia da inflamação ou da doença crônica, talassemias, anemia sideroblástica, saturnismo, deficiência de vitamina B6, deficiência de cobre;
  • anemias normocíticas (80fL < VCM < 100fL) — ferropenia, anemia da inflamação ou da doença crônica, insuficiência renal crônica, síndrome mielodisplásica, mielofibrose primária, anemia aplásica;
  • anemias macrocíticas (VCM >100fL) — deficiência de vitamina B12 ou ácido fólico, hepatopatias, tireoidopatias, síndromes mielodisplásicas, etilismo, anemia aplásica.

Anamnese, exame físico, avaliação completa do hemograma, incluindo lâmina de distensão sanguínea, exames complementares e atenção a sinais de alarme, como outras citopenias, evidência de disfunção hepática e/ou renal, sangramento anormal ou oculto do trato gastrintestinal e do trato ginecológico e idade avançada são fundamentais para abordar o paciente anêmico.14,15

Existem inúmeras causas de anemia na prática médica. Também se sabe que, no cenário da APS, a grande maioria das causas de anemia será decorrente de ferropenia por carência de ferro na dieta ou perdas sanguíneas crônicas, por exemplo, perdas menstruais, sobretudo na adolescência.

O MFC não deve simplificar o tratamento de todas as anemias para a simples reposição de ferro e não deve deixar de investigar clinicamente condições graves no paciente que se apresenta com anemia secundária a sangramentos ginecológicos e gastrintestinais anormais ou anemia da doença crônica, sob o risco de não diagnosticar neoplasias, doenças autoimunes e infecciosas potencialmente graves, assim como aliviar os sintomas do paciente.

Abordagem diagnóstica

A Figura 5 apresenta o algoritmo de abordagem diagnóstica do paciente anêmico.

FIGURA 5: Abordagem diagnóstica do paciente anêmico. AH: anemia hemolítica; HPN: hemoglobinúria paroxística noturna. // Fonte: Ruiz e Cervantes (2015);10 Silva (2019).14

Plano terapêutico

Em geral, deve-se investigar a etiologia da anemia e, após o correto diagnóstico, é possível propor o tratamento clínico adequado. No caso das anemias carenciais, por exemplo, o diagnóstico da carência por si só não é suficiente. É necessário compreender o que está levando à deficiência daquele nutriente.

O protocolo clínico e as diretrizes terapêuticas do Ministério da Saúde (MS) de anemia por deficiência de ferro orientam, na suspeita desse tipo de anemia, a dosagem de, pelo menos, hemograma e ferritina.16

No contexto de anemia ferropriva, os alimentos fontes de ferro devem ser recomendados, principalmente carnes vermelhas, vísceras (fígado e miúdos), carnes de aves, peixes e hortaliças verde-escuras, entre outros. Chás, café, cereais e leite prejudicam a absorção de ferro. A via oral é a primeira escolha. O sal de ferro é mais bem absorvido se ingerido com fruta ou suco cítrico que contenha vitamina C, como laranja e limão, em jejum ou 1 a 2 horas antes das refeições. A via parenteral passa a ser opção em ambiente hospitalar, sob o cuidado da hematologia, em casos de intolerância gastrintestinal ou de anemia refratária à reposição oral.

A transfusão sanguínea somente está indicada em caso de instabilidade hemodinâmica ameaçadora.

Em adultos, a dose terapêutica é de 120 a 180mg de ferro elementar/dia. No sulfato ferroso, em geral, há 20% de ferro elementar em relação à quantidade de sal, ou seja, cada 5mg de sulfato ferroso contém 1mg de ferro elementar.

O tempo de tratamento indicado é de 6 meses após a normalização da anemia. Normalmente, são necessárias 6 a 8 semanas de tratamento para melhorar a anemia e 6 meses para repor as reservas de ferro. A monitoração do tratamento pode ser realizada com vigilância da Hb a cada 2 meses e da ferritina, a cada 3 meses. Ocorre pico de reticulócitos no décimo dia, mas do quarto ao sétimo dia já pode ocorrer aumento do número de reticulócitos no sangue periférico.

Existem, no mercado, formulações de sulfato ferroso por via oral em gotas, comprimido ou xarope. Outros sais de ferro podem ser utilizados como alternativa, com menos efeitos colaterais.

A Tabela 2 resume as apresentações de ferro disponíveis por via oral.

Tabela 2

APRESENTAÇÕES DE FERRO DISPONÍVEIS POR VIA ORAL

Nome

Formulação

Apresentação

Ferro elementar

Sulfato ferroso

Gotas

68mg/mL

0,68mg FeE/gt

125mg/mL (1mL = 20gts)

1,25mg FeE/gt

125mg/mL (1mL = 35gts)

0,71mg FeE/gt

Comprimido

109mg

40mg FeE

Xarope

25mg/mL

5mg FeE/mL

Ferripolimaltose

Gotas

50mg/mL

2,5mg FeE/gt

100mg/mL

5mg FeE/gt

Comprimido

400mg

100mg FeE

100mg

100mg FeE

Xarope

10mg/mL

10mg FeE/mL

Glicinato férrico

Gotas

250mg/mL

2,5mg FeE/gt

Glicinato férrico + associação

Gotas

131,58mg/mL

2,5mg FeE/gt

Xarope

275,8mg/10mL

5,2mg FeE/ml

Ferro quelato glicinato

Gotas

250mg/mL

2,5mg FeE/gt

Comprimido

150mg

30mg FeE

300mg

60mg FeE

FeE: quantidade de ferro elementar. // Fonte: Bula das medicações. Elaborado por Gervásio Mendonça Colares.

Entre as causas de refratariedade, estão má-adesão, infecção por Helicobacter pylori, perda de ferro por sangramento crônico superior à dose de ferro ingerida (por exemplo, pacientes com doença inflamatória intestinal, sangramento oculto por neoplasia) e outra etiologia associada.

Sais de ferro não devem ser ingeridos com antiácidos, bloqueadores da bomba de prótons, bebidas, suplementos com cálcio, antibióticos (quinolonas e tetraciclinas), café, chás, leite ou ovos. Devem ser administrados 2 horas antes dos antiácidos ou 4 horas após.

Na suspeita de sangramento gastrintestinal alto ou baixo, devem ser solicitadas esofagogastroduodenoscopia e colonoscopia, respectivamente. Da mesma forma, diante de sangramento uterino anormal, deve ser procedida propedêutica ginecológica adequada.17

Short e Domagalski18 apresentam um fluxograma prático para avaliação da anemia ferropriva no adulto, a depender da população envolvida — mulher na pré-menopausa ou mulher na pós-menopausa e homem, conforme mostra a Figura 6. Os autores consideram uma resposta adequada ao tratamento o aumento de 1g/dL de Hb após o primeiro mês de tratamento.18

FIGURA 6: Propedêutica diante de anemia por deficiência de ferro. // Fonte: Adaptada de Short e Domagalski (2013).18

O tratamento da deficiência de vitamina B12, por sua vez, realizado comumente, por via parenteral, muscular ou subcutânea. Existem múltiplas maneiras de prescrever a reposição de vitamina B12. O Tratado de Medicina de Família e Comunidade propõe 1.000µg/dia, durante 7 dias, seguidos de 1.000µg por semana, durante 3 semanas e, após, 1.000µg por mês. Se a condição clínica não puder ser corrigida, manter reposição mensal indefinidamente.

O tratamento da deficiência de ácido fólico é realizado por via oral. Estão disponíveis, em nosso meio, comprimidos de 5mg. O ácido fólico deve ser reposto até a normalização dos níveis terapêuticos. A deficiência é confirmada com níveis séricos de 5mg/mL.

Na reposição de vitamina B12 e ácido fólico, o monitoramento é semelhante ao da anemia ferropriva, com aumento de reticulócitos de 5 a 7 dias e correção hematológica após o segundo mês de tratamento.

Diante da suspeita clínica de deficiência combinada de ácido fólico e vitamina B12, é necessária a reposição conjunta das vitaminas, pelo risco de piora neurológica após a reposição única de ácido fólico em paciente com deficiência de vitamina B12.17

Outras possibilidades também para a APS são o aconselhamento genético de pacientes com hemoglobinopatias. As talassemias e outras variantes estruturais da globina são desordens autossômicas recessivas. O manejo das hemoglobinopatias deve ser realizado em conjunto com a atenção especializada. Atentar para a relevância de vacinação específica para indivíduos com anemia falciforme, em função do maior risco de infecções decorrentes de asplenia.

Anemia na gestação

A anemia na gestação ainda é uma importante questão de saúde pública mundial. No Brasil, a OMS estima que, de cada 10 gestantes que realizam o pré-natal, três têm anemia.19 É um dos principais fatores desencadeantes de morbidade e mortalidade materno-infantil, aumentando a predisposição a fatores, como hemorragia pós-parto, hipertensão gestacional, parto pré-termo, sepse neonatal e baixo peso ao nascer.20

Na gravidez, a anemia é definida quando a paciente apresenta valor de Hb <11g/dL, sendo classificada como leve a moderada quando esse valor é >8g/dL e grave quando <8g/dL.21

Entendendo a anemia na gestação

No contexto da gestação, é comum que haja predisposição a redução do valor da Hb plasmática por hemodiluição. A gestante tem aumento de sua volemia em 45 a 50% em relação às mulheres não grávidas, em virtude do acréscimo de volume plasmático e do aumento de volume celular das hemácias. Essas transformações já se iniciam no primeiro trimestre da gravidez e elevam a produção de hemácias, gerando cerca de 450mL a mais de células vermelhas.22

Sabe-se também que o consumo de ferro livre total, no período gestacional, se intensifica pelo aumento do consumo da unidade fetoplacentária, pela utilização para produção de Hb e mioglobina e pela depleção por meio das perdas sanguíneas e do aleitamento materno. Portanto, se não houver suplementação adequada de ferro, nesse período, a maioria das gestantes desenvolverá anemia.22

Além da hemodiluição fisiológica observada nas gestantes, outros fatores de risco para o aparecimento de anemia na gravidez são:20,21

  • dieta pobre em ferro e outros minerais;
  • variáveis sociodemográficas, como baixa renda e baixo nível de educação;
  • idade inferior a 16 anos;
  • intervalo curto entre duas gestações;
  • gestação gemelar;
  • baixo índice de massa corporal (IMC);
  • perdas sanguíneas por procedimentos ou lesões;
  • presença de doenças crônicas, como doença renal crônica (DRC), hipotireoidismo, doenças autoimunes, entre outras;
  • histórico familiar de anemia herdada, como talassemia ou anemia falciforme.

Em função da relevância e a da prevalência da anemia na gestação, o MS, a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) e o Colégio Americano de Ginecologia e Obstetrícia (ACOG) recomendam que seja feito o rastreio para anemia o mais precocemente possível, de preferência, junto com o diagnóstico de gravidez, por meio da história clínica, do exame físico e do hemograma. Recomenda-se, ainda, continuar fazendo esse rastreio rotineiramente durante o pré-natal, sendo sugerido pelo MS repetir o hemograma com 28 semanas de gestação.21–23

Suplementação e tratamento

Uma vez que a principal causa de anemia durante a gravidez é a deficiência de ferro no organismo, sua suplementação para todas as gestantes é recomendada e deve ser iniciada por volta da 20ª. semana gestacional.21

A suplementação feita de forma adequada pode reduzir em até 70% o risco de anemia materna em gestações a termo segundo revisões sistemáticas.22 Deve-se, no entanto, evitar o uso de sulfato ferroso de forma suplementar no período da embriogênese, pois ele pode causar indução de estresse oxidativo trofoblástico, levando à maior incidência de diabetes gestacional e pré-eclâmpsia.22

Uma vez diagnosticada a anemia durante a gestação, o tratamento com sulfato ferroso deve ser prontamente instituído. A quantidade diária de ferro elementar necessária para corrigir a anemia varia de 60 a 240mg/dia na literatura.21,23

O MS recomenda, para casos leves e moderados, que seja solicitado exame parasitológico de fezes e tratada a verminose, caso o exame seja positivo. Além disso, recomenda iniciar cinco comprimidos de sulfato ferroso por dia (200mg/dia), que devem ser tomados junto com sucos cítricos para melhor absorção. O hemograma deve ser repetido após 30 ou 60 dias, e o tratamento deve ser interrompido quando o valor da Hb estiver acima de 11g/dL, passando a ser usada a dose de suplementação.21

Para os casos de anemia grave (Hb <8g/dL) ou de refratariedade ao tratamento instituído, deve-se encaminhar a gestante para acompanhamento com especialista em pré-natal de alto risco.21,22

O Quadro 1 apresenta a conduta de acordo com o valor da Hb no pré-natal.

Quadro 1

CONDUTA DE ACORDO COM O VALOR DA HEMOGLOBINA NO PRÉ-NATAL

Valor da hemoglobina

Conduta

>11g/dL

  • Suplementação de ferro a partir da 20ª semana: 40mg/dia de ferro elementar

Entre 8–11g/dL

  • Solicitar exame parasitológico de fezes e tratar as parasitoses, se presentes
  • Tratar a anemia com 120 a 240mg/dia de ferro elementar
  • Repetir a dosagem de Hb entre 30 e 60 dias:
    • se os níveis estiverem subindo, manter o tratamento até a Hb atingir 11g/dL, quando deverá ser iniciada a dose de suplementação
    • se a Hb permanecer em níveis estacionários ou diminuir, será necessário referir a gestante ao pré-natal de alto risco

Menor que 8g/dL

  • Referir a gestante ao pré-natal de alto risco

// Fonte: Adaptado de Brasil (2012).21

Além da suplementação com sulfato ferroso, é importante que a gestante tenha acesso a acompanhamento nutricional adequado. Na gravidez, o consumo diário de ferro vindo da alimentação deve aumentar de 15 para 30mg. Também se sabe que o consumo diário de cerca de 2.700UI de vitamina A está relacionado à redução de anemia materna.22

A suplementação com 40mg/dia de ferro elementar para gestantes sem anemia deve continuar até o terceiro mês pós-parto ou pós-aborto, a fim de repor as reservas corporais maternas, mesmo que haja impossibilidade de amamentação.24

ATIVIDADES

6. Sobre a anemia na gestação, assinale a alternativa correta.

A) Não é uma condição frequente na APS e, por isso, o MFC não necessita solicitar rastreio no pré-natal.

B) O valor de corte para a Hb na gestação é de 12g/dL.

C) A suplementação de ferro deve ser iniciada desde o início da gravidez até o terceiro mês pós-parto.

D) O rastreio para anemia deve iniciar o mais precocemente possível no pré-natal e ser feito de forma rotineira.

Confira aqui a resposta

Resposta incorreta. A alternativa correta e a "D".


A anemia na gestação ainda é uma importante questão de saúde pública mundial e no Brasil, devendo ser rotina seu rastreio pelo MFC no pré-natal. O valor de corte para a Hb na gestação é <11g/dL, mais baixo do que para a mulher não grávida em função da hemodiluição fisiológica da gravidez. É importante lembrar que, para gestantes com valores de Hb normais, recomenda-se iniciar a suplementação de ferro a partir da 20ª. semana de gestação, evitando o estresse oxidativo trofoblástico no período da embriogênese.

Resposta correta.


A anemia na gestação ainda é uma importante questão de saúde pública mundial e no Brasil, devendo ser rotina seu rastreio pelo MFC no pré-natal. O valor de corte para a Hb na gestação é <11g/dL, mais baixo do que para a mulher não grávida em função da hemodiluição fisiológica da gravidez. É importante lembrar que, para gestantes com valores de Hb normais, recomenda-se iniciar a suplementação de ferro a partir da 20ª. semana de gestação, evitando o estresse oxidativo trofoblástico no período da embriogênese.

A alternativa correta e a "D".


A anemia na gestação ainda é uma importante questão de saúde pública mundial e no Brasil, devendo ser rotina seu rastreio pelo MFC no pré-natal. O valor de corte para a Hb na gestação é <11g/dL, mais baixo do que para a mulher não grávida em função da hemodiluição fisiológica da gravidez. É importante lembrar que, para gestantes com valores de Hb normais, recomenda-se iniciar a suplementação de ferro a partir da 20ª. semana de gestação, evitando o estresse oxidativo trofoblástico no período da embriogênese.

7. Cite quatro fatores de risco para a anemia na gestação.

Confira aqui a resposta

Além da hemodiluição fisiológica observada nas gestantes, outros fatores de risco para o aparecimento de anemia na gravidez são dieta pobre em ferro e outros minerais, variáveis sociodemográficas, como baixa renda e baixo nível de educação, idade inferior a 16 anos, intervalo curto entre duas gestações, gestação gemelar, baixo IMC, perdas sanguíneas em função de procedimentos ou lesões, presença de doenças crônicas, como DRC, hipotireoidismo, doenças autoimunes, entre outras, histórico familiar de anemia herdada, como talassemia ou anemia falciforme.

Resposta correta.


Além da hemodiluição fisiológica observada nas gestantes, outros fatores de risco para o aparecimento de anemia na gravidez são dieta pobre em ferro e outros minerais, variáveis sociodemográficas, como baixa renda e baixo nível de educação, idade inferior a 16 anos, intervalo curto entre duas gestações, gestação gemelar, baixo IMC, perdas sanguíneas em função de procedimentos ou lesões, presença de doenças crônicas, como DRC, hipotireoidismo, doenças autoimunes, entre outras, histórico familiar de anemia herdada, como talassemia ou anemia falciforme.

Além da hemodiluição fisiológica observada nas gestantes, outros fatores de risco para o aparecimento de anemia na gravidez são dieta pobre em ferro e outros minerais, variáveis sociodemográficas, como baixa renda e baixo nível de educação, idade inferior a 16 anos, intervalo curto entre duas gestações, gestação gemelar, baixo IMC, perdas sanguíneas em função de procedimentos ou lesões, presença de doenças crônicas, como DRC, hipotireoidismo, doenças autoimunes, entre outras, histórico familiar de anemia herdada, como talassemia ou anemia falciforme.

Anemia na infância

A anemia é uma situação clínica frequente em consultas de puericultura na APS. No geral, a principal causa de anemia na pediatria é a deficiência de ferro,25 e o MFC necessita saber manejá-la de forma adequada, assim como excluir outras causas menos comuns.

A deficiência de ferro pode causar sérios déficits de crescimento e de desenvolvimento cognitivo na criança desde o período pré-natal, gerando impactos no seu comportamento, na sua linguagem e nas suas atividades motoras.26

Os pontos de corte de Hb, estabelecidos pela OMS, são de menos de 11g/dL para crianças entre 6 e 60 meses, e de menos de 11,5g/dL para crianças de 5 a 11 anos de idade.26

Causas de anemia por faixa etária

É importante lembrar que a criança a termo nasce com Hb >14g/dL, a qual decai rapidamente entre a 6ª. e a 9ª. semana de vida, em virtude da chamada anemia fisiológica da infância. Esse fenômeno ocorre porque a eritropoese diminui drasticamente, enquanto a demanda tissular por oxigênio aumenta de forma importante. Já entre os 3 e 6 meses de idade, a existência de anemia deve alertar para a possibilidade de hemoglobinopatias.

De forma generalizada, pode-se dividir as principais causas de anemia na infância da seguinte forma:

  • do nascimento aos 3 meses de vida — anemia fisiológica do recém-nascido (RN);
  • de 3 a 6 meses — hemoglobinopatias;
  • após 6 meses — deficiência de ferro

É importante, em todas as faixas etárias, estar atento para sinais clínicos e laboratoriais que possam sugerir outras etiologias das não citadas.27

Fatores de risco

Apesar das políticas públicas de proteção ao aleitamento materno, suplementação de ferro e fortificação de alimentos e refeições, alguns fatores de risco contribuem para que a deficiência de ferro, levando à anemia, ainda seja frequente no Brasil.26 Entre os principais, estão:

  • prematuridade;
  • baixo peso ao nascer
  • uso de fórmula sem quantidade de ferro adequada;
  • introdução de leite de vaca antes de 1 ano de vida;
  • aleitamento materno exclusivo sem suplementação;
  • ingestão de mais de 680g de leite de vaca por dia na dieta.

O leite de vaca, além de ter menos biodisponibilidade de ferro do que o leite materno, pode interferir potencialmente na absorção desse mineral encontrado em outros alimentos.25 Por isso, todos profissionais da estratégia saúde da família (ESF) devem estimular o aleitamento materno durante as consultas do pré-natal e consolidar essa ideia nas visitas domiciliares de puerpério e nas consultas de puericultura.

Diagnóstico clínico e laboratorial

O MFC precisa estar atento, em todas as consultas de puericultura, para os dados da anamnese e os sinais e sintomas clínicos sugestivos de anemia.26 Durante a anamnese, é essencial entender o contexto socioeconômico da família e abordar questões sobre pré-natal, história familiar e pessoal de anemia, sintomas de sangramento, histórico dietético da criança, comportamentos de perversão alimentar e exposição a drogas ou toxinas.27

No exame físico, achados comuns nas crianças, de acordo com o estágio da anemia, são:

  • apatia;
  • astenia;
  • taquicardia;
  • dispneia;
  • palidez de face e mucosas;
  • irritabilidade;
  • distúrbio psicomotor;
  • distúrbio de conduta;
  • unhas quebradiças e rugosas;
  • estomatite angular.

Os achados clínicos são encontrados apenas após a doença já estar instalada com deficiência de ferro intensa, não sendo úteis para prevenção da anemia. Portanto, o MFC necessita lançar mão de exames laboratoriais tanto para diagnóstico como para profilaxia dessa condição, assim como para excluir outras etiologias que necessitem de acompanhamento especializado. Os exames utilizados de rotina para esse fim são hemograma, contagem de reticulócitos e dosagem de ferritina.26

Utilizar a ferritina como marcador precoce de depleção de ferro pode prevenir déficits cognitivos irremediáveis. A recomendação da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) é a de que se faça um rastreio com esses exames a partir dos 12 meses de vida.26 A Academia Americana de Pediatria (AAP) recomenda que esse mesmo rastreio seja feito entre 9 e 12 meses de idade.25

O valor de ferritina indicado para crianças é que esteja acima de 30µg/dL, sendo que valores abaixo de 15µg/dL definem deficiência grave de ferro.26

Suplementação de ferro

Uma vez instalada a anemia por deficiência de ferro, seu tratamento adequado pode melhorar os déficits neurocognitivos já instalados, porém é incapaz de revertê-los completamente. Por isso, somente a prevenção da anemia ferropriva é capaz de garantir um desenvolvimento neuropsicomotor adequado.25,26

Para alcançar a prevenção adequada da anemia ferropriva, a OMS recomenda o aleitamento materno exclusivo até os 6 meses de idade25 e, após esse período, a introdução de alimentos ricos em ferro a serem consumidos diariamente. Além disso, o Programa Nacional de Suplementação de Ferro (PNSF) recomenda a suplementação com ferro elementar a partir dos 6 meses até os 2 anos de vida.24 Atualmente, a SBP sugere iniciar essa suplementação aos 3 meses de idade, com dose de 1mg/kg/dia de ferro elementar caso a criança tenha nascido a termo e com peso adequado.26

As variações das doses de suplementação conforme o peso e a idade gestacional (IG) ao nascer podem ser verificadas no Quadro 2.

Quadro 2

SUPLEMENTAÇÃO COM FERRO ELEMENTAR CONFORME PESO E IDADE GESTACIONAL

Situação

Recomendação

RN a termo com peso adequado para IG

  • 1mg de ferro elementar/kg/dia a partir do 3º mês até 24º mês de vida

RN a termo com peso <2.500g

  • 2mg/kg/dia a partir de 30 dias, durante 1 ano. Após esse período, 1mg/kg/dia por mais 1 ano

RN pré-termo com peso entre 1.500–2.500g

  • 2mg/kg/dia a partir de 30 dias, durante 1 ano. Após esse período, 1mg/kg/dia por mais 1 ano

RN pré-termo com peso entre 1.000–1.500g

  • 3mg/kg de peso/dia, a partir de 30 dias durante um ano. Após esse período, 1mg/kg/dia por mais 1 ano

RN pré-termo com peso <1.000g

  • 4mg/kg de peso/dia a partir de 30 dias, durante 1 ano. Após esse período, 1mg/kg/dia por mais 1 ano

// Fonte: Adaptado de Fisberg e colaboradores (2018).26

Em relação às crianças entre 2 e 12 anos, que vivem em regiões com prevalência de anemia ferropriva acima de 40%, recomenda-se a suplementação diária com 30mg de ferro elementar.26

Tratamento

O tratamento da anemia ferropriva consiste em corrigir a causa primária de deficiência de ferro, consumir alimentos ricos em ferro e repor de 3 a 5mg/kg/dia de ferro elementar por 3 a 6 meses. É necessário fazer a monitoração da reposição por meio de hemograma e dosagem de ferritina a cada 30 ou 60 dias. Ao final do tratamento, a ferritina deve se manter, idealmente, acima de 30µg/dL.26

Anemia no idoso

A anemia tem sua maior prevalência na população idosa. Estima-se que, mundialmente, 17% dos idosos apresentem algum nível de anemia.28 Essa prevalência difere entre os sexos e aumenta com a idade, chegando a 26% nos idosos do sexo masculino com 85 anos ou mais.29

Na APS, o MFC precisa estar apto para avaliar e identificar os pacientes idosos com anemia e saber tratar as causas básicas reversíveis, assim como encaminhar o paciente para a atenção especializada com brevidade, quando necessário.28

A anemia é uma condição bastante relevante na prática clínica geriátrica por ser comprovada sua atuação como importante fator de risco para diversas morbidades, como:30

  • doenças cardiovasculares;
  • déficit cognitivo;
  • insônia;
  • humor deprimido;
  • redução da função executiva;
  • quedas e fraturas;
  • maior frequência de hospitalização.

Avaliação diagnóstica

Os sintomas de anemia no paciente idoso são, de forma geral, bastante inespecíficos. O MFC deve estar atento para correlacionar a história clínica do doente com estes sintomas genéricos, como fadiga, fraqueza, dispneia, descompensação de comorbidades e palidez cutaneomucosa.

No geral, a abordagem diagnóstica é semelhante à realizada no adulto com anemia, porém deve-se atentar para algumas particularidades frequentes no idoso, como a polifarmácia, que tem significativo potencial para gerar anemia em função da toxicidade de algumas medicações.

Os exames laboratoriais iniciais devem abranger hemograma e contagem de reticulócitos. Os valores de corte para a Hb são sugeridos pela OMS1 como os mesmos da população adulta (<12g/dL para mulheres e <13g/dL para homens). Após interpretação do hemograma, deve-se solicitar novos exames, como cinética do ferro, vitamina B12, folato, entre outros.

Se o perfil do ferro estiver alterado no idoso, é necessário prosseguir com a investigação diagnóstica da causa dessa deficiência. Para isso, exames, como pesquisa de sangue oculto nas fezes e endoscopia digestiva alta e/ou baixa podem ser necessários.29

Causas e tratamentos das anemias no idoso

As causas de anemia no idoso são diversas e, muitas vezes, estão sobrepostas. O tratamento deve ser feito por meio da correção do problema que desencadeou a anemia. De forma genérica, pode-se dividir as anemias no idoso em três grupos principais,29,30 descritos a seguir.

Deficiência nutricional de ferro, folato e/ou vitamina B12

A deficiência de ferro é a principal causa de anemia no idoso, e ocorre mais comumente por sangramento crônico do sistema gastrintestinal e, em menor frequência, por déficit de ferro na dieta ou por má-absorção do nutriente.

Outra importante causa de anemia por carência nutricional é a deficiência de vitamina B12, que atinge cerca de 10 a 15% das pessoas com mais de 65 anos, sendo a principal causa de anemia megaloblástica. Isso ocorre por absorção inadequada da vitamina, anemia perniciosa secundária ou doença gástrica. A deficiência de ácido fólico no idoso é atribuída à ingestão insuficiente e/ou ao alcoolismo. Mais raramente, a hipocloridria ou a gastrite atrófica podem ser causa de redução na absorção de folato.

O tratamento da anemia causada por deficiência de nutrientes se baseia na sua reposição e correção, quando possível, da causa dessa deficiência. Além das orientações dietéticas, as seguintes doses terapêuticas estão indicadas para idosos:

  • deficiência de ferro — de 150 a 200mg de ferro elementar por dia, durante 2 a 6 meses;
  • deficiência de vitamina B12 — 1.000µg intramuscular ao dia, por 1 semana, seguidas de 1.000µg intramuscular por semana, durante 1 mês, seguidas de 1.000µg por mês;
  • deficiência de folato — de 1 a 5mg de ácido fólico por dia, durante 1 a 4 meses.

A reposição de vitamina B12, em idosos, também pode ser feita por via oral, necessitando de doses maiores (cerca de 2.000µg).

Anemia relacionada à doença renal crônica

A DRC tem alta prevalência no Brasil e no mundo. Por isso, é comum, na prática clínica do MFC, encontrar pacientes com anemia relacionada à DRC. Caracteriza-se por ser uma anemia normocítica e normocrômica e sua fisiopatologia está relacionada à diminuição da eritropoetina, deficiência de ferro, supressão da MO pela uremia, perda sanguínea e inflamação.

O tratamento para essa condição deve ser feito por meio de análogos da eritropoetina administrados por via intravenosa ou subcutânea, 1 vez por semana ou a cada 2 semanas.

Anemia de doenças crônicas ou inflamações crônicas

Cerca de 19% das anemias em idosos estão relacionadas a inflamações crônicas, que, por sua vez, são causadas por infecções, neoplasias, vasculites, artrite reumatoide, entre outras doenças. O mecanismo fisiopatológico se dá pela liberação de citocinas inflamatórias que estimulam a produção de hepcidina, hormônio que provoca a redução da absorção de ferro intestinal e diminuição de sua liberação pelos macrófagos.

O tratamento dessa condição consiste no controle da doença de base associada e, em casos selecionados, na reposição de ferro e de eritropoetina.29

Anemias clonais e inexplicadas

Com o envelhecimento, aumenta a incidência de hematopoiese ineficaz. Como consequência desse processo, surgem as anemias inexplicadas, que não têm critérios para se classificarem em outra parte. Sabe-se que uma parcela considerável de idosos com anemia inexplicada se apresenta com síndrome mielodisplásica, causada por displasia celular, que leva à pancitopenia e apresenta morbidade e mortalidade altas.29,30

Não há tratamento específico para essas condições, devendo-se acompanhar o paciente em conjunto com o especialista e proporcionar medidas de conforto para alívio dos sintomas.

Quando encaminhar para a atenção especializada

Cabe à equipe de APS realizar a coordenação do cuidado do paciente anêmico. O Tratado de Medicina de Família e Comunidade apresenta algumas indicações de acompanhamento com especialista focal em hematologia ou referenciamento para ambiente hospitalar. Entre essas indicações, são citadas:17

  • ausência de resposta ao tratamento proposto após revisão diagnóstica;
  • necessidade de reposição parenteral de ferro;
  • sinais de instabilidade hemodinâmica;
  • após diagnóstico de hemoglobinopatia.

Pode-se acrescentar, ainda, etiologia desconhecida de anemia após investigação adequada, doença falciforme com crises álgicas e presença de outras citopenias com critérios de gravidade.

ATIVIDADES

8. Sobre a prevenção e o tratamento da anemia ferropriva, assinale V (verdadeiro) ou F (falso).

A recomendação é a de que se inicie o rastreio laboratorial para anemia em crianças a partir de 9 a 12 meses de vida.

O RN a termo, que nasceu com peso adequado para IG, deve iniciar a suplementação de ferro com 1mg/kg/dia a partir do terceiro mês de vida e continuar até os 2 anos de idade.

O RN pré-termo, que nasceu com 970kg, deve iniciar suplementação de ferro com 4mg/kg/dia a partir do trigésimo dia de vida e continuar com esse esquema até os 2 anos de idade.

O tratamento da anemia por deficiência de ferro, na infância, deve ser feito com 3 a 5mg/kg/dia de ferro elementar por 3 a 6 meses.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência correta.

A) V — V — F — V

B) F — F — V — V

C) F — F — V — F

D) V — V — F — F

Confira aqui a resposta

Resposta incorreta. A alternativa correta e a "A".


Segundo as recomendações da SBP, o RN pré-termo que nasce com peso <1.000g deve iniciar suplementação de ferro com 4mg/kg/dia a partir do 30º dia de vida e continuar com esse esquema até o primeiro ano de vida. Após, deve-se continuar a suplementação com 1mg/kg/dia de ferro até o segundo ano de vida.

Resposta correta.


Segundo as recomendações da SBP, o RN pré-termo que nasce com peso <1.000g deve iniciar suplementação de ferro com 4mg/kg/dia a partir do 30º dia de vida e continuar com esse esquema até o primeiro ano de vida. Após, deve-se continuar a suplementação com 1mg/kg/dia de ferro até o segundo ano de vida.

A alternativa correta e a "A".


Segundo as recomendações da SBP, o RN pré-termo que nasce com peso <1.000g deve iniciar suplementação de ferro com 4mg/kg/dia a partir do 30º dia de vida e continuar com esse esquema até o primeiro ano de vida. Após, deve-se continuar a suplementação com 1mg/kg/dia de ferro até o segundo ano de vida.

9. Sobre as causas de anemia no idoso e suas respectivas condutas, assinale a alternativa correta.

A) A anemia por deficiência de vitamina B12 deve ser tratada exclusivamente por via intramuscular.

B) Na anemia relacionada à DRC, nunca está indicada a reposição de ferro, pois a causa dessa anemia é por deficiência de eritropoetina.

C) Na anemia relacionada às doenças inflamatórias crônicas, está indicada, em alguns casos, a reposição de ferro, pois sua deficiência pode fazer parte da fisiopatologia da doença.

D) Nas anemias de causas inexplicadas, a reposição de ferro é o tratamento mais adequado.

Confira aqui a resposta

Resposta incorreta. A alternativa correta e a "C".


Em alguns casos, a anemia por deficiência de vitamina B12 pode ser tratada por reposição via oral, porém em doses maiores do que por via intramuscular. Na anemia por DRC, assim como por doenças inflamatórias crônicas, a reposição de ferro também está indicada em algumas situações, pois existe deficiência de ferro sobreposta, em função da fisiopatologia da doença. Já nas anemias de causas inexplicadas, o tratamento consiste em medidas de alívio de sintomas, feitas em conjunto com o especialista, pois, muitas vezes, essas anemias são causadas por síndromes mielodisplásicas.

Resposta correta.


Em alguns casos, a anemia por deficiência de vitamina B12 pode ser tratada por reposição via oral, porém em doses maiores do que por via intramuscular. Na anemia por DRC, assim como por doenças inflamatórias crônicas, a reposição de ferro também está indicada em algumas situações, pois existe deficiência de ferro sobreposta, em função da fisiopatologia da doença. Já nas anemias de causas inexplicadas, o tratamento consiste em medidas de alívio de sintomas, feitas em conjunto com o especialista, pois, muitas vezes, essas anemias são causadas por síndromes mielodisplásicas.

A alternativa correta e a "C".


Em alguns casos, a anemia por deficiência de vitamina B12 pode ser tratada por reposição via oral, porém em doses maiores do que por via intramuscular. Na anemia por DRC, assim como por doenças inflamatórias crônicas, a reposição de ferro também está indicada em algumas situações, pois existe deficiência de ferro sobreposta, em função da fisiopatologia da doença. Já nas anemias de causas inexplicadas, o tratamento consiste em medidas de alívio de sintomas, feitas em conjunto com o especialista, pois, muitas vezes, essas anemias são causadas por síndromes mielodisplásicas.

10. Considerando o metabolismo do ferro, quais proteínas estão diretamente relacionadas, respectivamente, com o armazenamento e o transporte de ferro no organismo e como se encontram os níveis dessas proteínas nos exames complementares em pacientes com anemia ferropriva?

A) Hepcidina e transferrina — a hepcidina encontra-se alta e a transferrina, baixa.

B) Ferritina e ferroportina — a ferritina encontra-se baixa e a ferroportina, baixa.

C) Transferrina e ferritina — a transferrina encontra-se baixa e a ferritina, baixa.

D) Ferritina e transferrina — a ferritina encontra-se baixa e a transferrina, alta.

Confira aqui a resposta

Resposta incorreta. A alternativa correta e a "D".


As proteínas responsáveis pelo armazenamento e transporte de ferro no organismo são, respectivamente, ferritina e transferrina. Na anemia ferropriva, caracteristicamente, a ferritina costuma estar baixa e a transferrina, alta. Uma forma indireta e mais acessível de avaliar os níveis de transferrina no plasma é por meio da avaliação da TIBC.

Resposta correta.


As proteínas responsáveis pelo armazenamento e transporte de ferro no organismo são, respectivamente, ferritina e transferrina. Na anemia ferropriva, caracteristicamente, a ferritina costuma estar baixa e a transferrina, alta. Uma forma indireta e mais acessível de avaliar os níveis de transferrina no plasma é por meio da avaliação da TIBC.

A alternativa correta e a "D".


As proteínas responsáveis pelo armazenamento e transporte de ferro no organismo são, respectivamente, ferritina e transferrina. Na anemia ferropriva, caracteristicamente, a ferritina costuma estar baixa e a transferrina, alta. Uma forma indireta e mais acessível de avaliar os níveis de transferrina no plasma é por meio da avaliação da TIBC.

11. Observe as afirmativas sobre as formas de classificar as anemias.

I. As anemias carenciais, como ferropriva e megaloblástica, costumam apresentar-se como anemias hipoproliferativas, com índice de reticulócitos rotineiramente reduzidos.

II. As principais causas de anemia classicamente microcítica são anemia ferropriva e talassemias.

III. São causas de reticulócitos aumentados sugerindo anemia hiperproliferativa as hemólises, a perda aguda de sangue e as anemias carenciais logo após o início de tratamento adequado.

IV. A anemia da doença crônica ou anemia da inflamação corresponde à causa de anemia classicamente microcítica e hipocrômica.

Quais estão corretas?

A) Apenas a I e a II.

B) Apenas a I, a II e a III.

C) Apenas a II, a III e a IV.

D) Apenas a III e a IV.

Confira aqui a resposta

Resposta incorreta. A alternativa correta e a "B".


Há muitas formas complementares de abordar as anemias na prática clínica. Classificá-las quanto à morfologia das hemácias e quanto aos mecanismos fisiopatológicos é uma delas. As causas mais comuns de anemia microcítica são a anemia ferropriva e as talassemias, correspondendo a diagnóstico diferencial importante. O índice de reticulócitos pode auxiliar na compreensão do mecanismo da anemia. As anemias carenciais são as hipoproliferativas, com índice de reticulócitos costumeiramente reduzidos, enquanto hemólise, perda de sangue aguda e após tratamento de anemias carenciais pode ser observado índice de reticulócitos aumentado. A anemia de doença crônica ou anemia da inflamação corresponde à anemia costumeiramente normocítica. A anemia ferropriva, comumente, é microcítica, mas, pela sua alta prevalência, é a principal causa de anemia normocítica em nosso meio.

Resposta correta.


Há muitas formas complementares de abordar as anemias na prática clínica. Classificá-las quanto à morfologia das hemácias e quanto aos mecanismos fisiopatológicos é uma delas. As causas mais comuns de anemia microcítica são a anemia ferropriva e as talassemias, correspondendo a diagnóstico diferencial importante. O índice de reticulócitos pode auxiliar na compreensão do mecanismo da anemia. As anemias carenciais são as hipoproliferativas, com índice de reticulócitos costumeiramente reduzidos, enquanto hemólise, perda de sangue aguda e após tratamento de anemias carenciais pode ser observado índice de reticulócitos aumentado. A anemia de doença crônica ou anemia da inflamação corresponde à anemia costumeiramente normocítica. A anemia ferropriva, comumente, é microcítica, mas, pela sua alta prevalência, é a principal causa de anemia normocítica em nosso meio.

A alternativa correta e a "B".


Há muitas formas complementares de abordar as anemias na prática clínica. Classificá-las quanto à morfologia das hemácias e quanto aos mecanismos fisiopatológicos é uma delas. As causas mais comuns de anemia microcítica são a anemia ferropriva e as talassemias, correspondendo a diagnóstico diferencial importante. O índice de reticulócitos pode auxiliar na compreensão do mecanismo da anemia. As anemias carenciais são as hipoproliferativas, com índice de reticulócitos costumeiramente reduzidos, enquanto hemólise, perda de sangue aguda e após tratamento de anemias carenciais pode ser observado índice de reticulócitos aumentado. A anemia de doença crônica ou anemia da inflamação corresponde à anemia costumeiramente normocítica. A anemia ferropriva, comumente, é microcítica, mas, pela sua alta prevalência, é a principal causa de anemia normocítica em nosso meio.

12. Sobre a monitoração do tratamento das anemias carenciais, assinale a alternativa correta.

A) A normalização da Hb após reposição de ferro costuma ocorrer no primeiro mês de tratamento.

B) O pico de reticulócitos após o tratamento de anemia carencial costuma ocorrer nos primeiros 2 dias.

C) O tempo de tratamento de 2 meses de reposição de ferro comumente é suficiente para reposição das reservas corpóreas.

D) A monitoração do tratamento de anemia ferropriva pode ser realizada com vigilância da Hb a cada 2 meses e da ferritina a cada 3 meses.

Confira aqui a resposta

Resposta incorreta. A alternativa correta e a "D".


A normalização da Hb após reposição de ferro costuma ocorrer no segundo mês de tratamento. O tempo de tratamento indicado é de 6 meses após a normalização da anemia. Normalmente, são necessárias 6 a 8 semanas de tratamento para melhorar a anemia e 6 meses para repor as reservas de ferro. A monitoração do tratamento pode ser feita com vigilância da Hb a cada 2 meses e da ferritina, a cada 3 meses. Há pico de reticulócitos no décimo dia, mas do quarto ao sétimo dia já pode ocorrer aumento de reticulócitos.

Resposta correta.


A normalização da Hb após reposição de ferro costuma ocorrer no segundo mês de tratamento. O tempo de tratamento indicado é de 6 meses após a normalização da anemia. Normalmente, são necessárias 6 a 8 semanas de tratamento para melhorar a anemia e 6 meses para repor as reservas de ferro. A monitoração do tratamento pode ser feita com vigilância da Hb a cada 2 meses e da ferritina, a cada 3 meses. Há pico de reticulócitos no décimo dia, mas do quarto ao sétimo dia já pode ocorrer aumento de reticulócitos.

A alternativa correta e a "D".


A normalização da Hb após reposição de ferro costuma ocorrer no segundo mês de tratamento. O tempo de tratamento indicado é de 6 meses após a normalização da anemia. Normalmente, são necessárias 6 a 8 semanas de tratamento para melhorar a anemia e 6 meses para repor as reservas de ferro. A monitoração do tratamento pode ser feita com vigilância da Hb a cada 2 meses e da ferritina, a cada 3 meses. Há pico de reticulócitos no décimo dia, mas do quarto ao sétimo dia já pode ocorrer aumento de reticulócitos.

Paciente R. P. S., do sexo feminino, 58 anos de idade. Trabalha como vendedora em um shopping center, mora sozinha, católica, solteira, é natural de Pedreiras (MA) e procedente de Caucaia (CE). Faz acompanhamento de rotina em uma unidade de APS. Refere, em consulta, história de anemia desde o ano 2000, descoberta quando se propôs a doar sangue. Na época, foi impedida de doar em função da anemia e foi orientada a procurar acompanhamento médico.

A paciente nega queixas clínicas no momento, apenas relata discreta indisposição para realização de atividade física regular, mas que não atrapalha sua caminhada, a zumba, o pilates e a musculação. Afirma não gostar de carne vermelha, porém faz ingestão, ao menos, duas vezes na semana. Nega palidez, icterícia ou fezes escurecidas. Relata menarca aos 13 anos e menopausa aos 44 anos. Durante a menacme, menstruação com duração de 4 a 5 dias, com volume considerado normal.

Há descrição, no prontuário da paciente, de múltiplos tratamentos com reposição de ferro já realizados para anemia, porém sem correção.

Experiência da doença (SIFE):

  • sentimento — preocupa-se com sua situação, pois traz a experiência de uma amiga que descobriu um câncer após identificar anemia: “Nunca procurei hematologista; quando me disseram que eu iria para um hematologista uma vez, eu fiquei um pouco nervosa.”;
  • ideia — “Fiquei preocupada de ser leucemia, mas por ter um sobrinho criança com anemia diferente pensei que poderia ter relação.”;
  • funcionamento — “Nunca me atrapalhou, apenas alguns períodos de indisposição.”;
  • expectativa — “Minha expectativa é descobrir do que se trata essa anemia e saber se preciso ficar tomando ferro para sempre.”

A mãe da paciente apresenta anemia a esclarecer há longa data, o sobrinho, que mora na Itália, tem diagnóstico de anemia do mediterrâneo, a irmã com diagnóstico de anemia falciforme e o respectivo filho com diagnóstico de β-talassemia minor.

Ao exame físico, verificaram-se as seguintes condições:

  • paciente pálida (2+/4+), ictérica (+/4+), peso adequado, acianótica;
  • ausculta cardiopulmonar normal;
  • abdome sem massas ou visceromegalias palpáveis.

A Tabela 3 apresenta os exames complementares e as condutas realizadas previamente pela paciente do caso clínico.

Tabela 3

EXAMES COMPLEMENTARES E CONDUTAS REALIZADOS PREVIAMENTE

2015

2017

2018

2019

2020.1

2020.2

Hemácias

5,41

5,25

4,6

Hemoglobina

10,3

10,7

11,3

10,9

11,3

9,2

Hematócrito

31,5

34,3

36,3

32,5

28,9

VCM

64,2

67,1

61,9

62,8

CHCM

31,4

33,53

31,8

RDW

17,1

16,9

14

Leucócitos

5.200

4.860

5.290

5.080

4.100

4.500

Neutrófilos

2.814

2.184

1.575

Linfócitos

1.885

2.235

2.430

Plaquetas

323.000

286.000

300.000

338.000

252.000

227.000

Hematoscopia

 

 

Anisocitose (+)

Microcitose (++) Hipocromia (++) Anisocromia (+) Policromasia (+) Poiquilocitose (+)

Hemácias em alvo (+)

Hemácias normocíticas e normocrômicas

Hipocromia/microcitose

Anemia com hipocromia (+) e microcitose (+)

Conduta

Sulfato ferroso: 1cp; solicitados ferritina, ferro sérico, SOF

16/09/2014:

ferro sérico 66 (N); ferritina 183,8 (N), SOF (-)

Solicitada colonoscopia e prescrito ferro. 17/04/2018: prescrito albendazol. Na consulta seguinte 02/10/2018: foram solicitadas bilirrubinas

Bilirrubina direta: 0,16; bilirrubina indireta: 0,28; ferritina: 281,7; ferro sérico: 103; LDH: 131 (N); SOF: negativo.

Prescrito antiparasitário e mantido sulfato ferroso, 2cp, por 3 meses

2018: Ferro sérico 50 (N), Ferritina 120 (N). Solicitada eletroforese de hemoglobina

28/01/2020:

A1: 91,8 (A1 >95); A2: 5 (A2 <2); fetal: 2 (F <2); S: 0 (S = 0)

SOF: sangue oculto nas fezes. // Fonte: Elaborada pelos autores.

Avaliação:

Β-talassemia minor (eletroforese de Hb: HbA2 alterada).

Plano:

Realizado esclarecimento sobre a etiologia da anemia (sem indícios de malignidade), ausência de benefício de terapia com sulfato ferroso e aconselhamento genético. Suspensão do sulfato ferroso e solicitada interconsulta com hematologista e posterior contrarreferenciamento.

ATIVIDADES

13. Como deve ser a abordagem da paciente em relação à sua anemia?

Confira aqui a resposta

No âmbito da abordagem às anemias, como no caso exposto, foi essencial compreender, além da história de adoecimento, realizando diagnóstico clínico adequado, que os anseios e as demandas da paciente também são fundamentais para tranquilizá-la frente ao medo de que se tratasse de um sinal de leucemia ou outro câncer. Ademais, os antecedentes patológicos familiares foram abordados no primeiro componente e complementados pela perspectiva da família no âmbito do sistema complexo e das relações no segundo componente, facilitando o diagnóstico de anemia de causa hereditária e a identificação de que a reposição de ferro, sem o diagnóstico correto da causa de anemia, não traria benefícios para a paciente e poderia trazer desfechos iatrogênicos. Como analisado no caso clínico, a anemia crônica pode apresentar-se de forma oligossintomática ou assintomática. Primeiramente, é necessário identificar a causa da anemia e depois tratá-la. A paciente do caso clínico poderia ter sido diagnosticada precocemente (teste do pezinho), durante toda a infância e a vida adulta. Uma abordagem diagnóstica precoce poderia ter evitado a reposição desnecessária de ferro, que poderia causar iatrogenias, como hemocromatose.

Resposta correta.


No âmbito da abordagem às anemias, como no caso exposto, foi essencial compreender, além da história de adoecimento, realizando diagnóstico clínico adequado, que os anseios e as demandas da paciente também são fundamentais para tranquilizá-la frente ao medo de que se tratasse de um sinal de leucemia ou outro câncer. Ademais, os antecedentes patológicos familiares foram abordados no primeiro componente e complementados pela perspectiva da família no âmbito do sistema complexo e das relações no segundo componente, facilitando o diagnóstico de anemia de causa hereditária e a identificação de que a reposição de ferro, sem o diagnóstico correto da causa de anemia, não traria benefícios para a paciente e poderia trazer desfechos iatrogênicos. Como analisado no caso clínico, a anemia crônica pode apresentar-se de forma oligossintomática ou assintomática. Primeiramente, é necessário identificar a causa da anemia e depois tratá-la. A paciente do caso clínico poderia ter sido diagnosticada precocemente (teste do pezinho), durante toda a infância e a vida adulta. Uma abordagem diagnóstica precoce poderia ter evitado a reposição desnecessária de ferro, que poderia causar iatrogenias, como hemocromatose.

No âmbito da abordagem às anemias, como no caso exposto, foi essencial compreender, além da história de adoecimento, realizando diagnóstico clínico adequado, que os anseios e as demandas da paciente também são fundamentais para tranquilizá-la frente ao medo de que se tratasse de um sinal de leucemia ou outro câncer. Ademais, os antecedentes patológicos familiares foram abordados no primeiro componente e complementados pela perspectiva da família no âmbito do sistema complexo e das relações no segundo componente, facilitando o diagnóstico de anemia de causa hereditária e a identificação de que a reposição de ferro, sem o diagnóstico correto da causa de anemia, não traria benefícios para a paciente e poderia trazer desfechos iatrogênicos. Como analisado no caso clínico, a anemia crônica pode apresentar-se de forma oligossintomática ou assintomática. Primeiramente, é necessário identificar a causa da anemia e depois tratá-la. A paciente do caso clínico poderia ter sido diagnosticada precocemente (teste do pezinho), durante toda a infância e a vida adulta. Uma abordagem diagnóstica precoce poderia ter evitado a reposição desnecessária de ferro, que poderia causar iatrogenias, como hemocromatose.

Conclusão

Uma vez que a anemia ferropriva é a principal causa de anemia e atinge primariamente populações menos favorecidas socialmente, é necessária a garantia de avaliação e aporte nutricional à população vulnerável, controle de doenças infecciosas e parasitárias, ampliação da rede de saneamento básico, higiene pessoal e água tratada, prevenção da gravidez na adolescência, planejamento familiar, estímulo ao pré-natal precoce, acesso a cuidados perinatais e pós-natais (clampeamento adequado do cordão umbilical, prevenção de hemorragia pós-parto e intervalo intergestacional >18 meses) e aleitamento materno exclusivo até os 6 meses de idade.

É aspecto relevante do trabalho do MFC compreender os determinantes sociais de saúde e intervir nas suas respectivas comunidades. Diante da anemia resistente ao tratamento com ferro, deve-se pensar em outras causas e revisitar o diagnóstico.

Talassemias são diagnósticos diferenciais de anemia microcítica, cuja principal causa é a anemia ferropênica. Normalmente, apresenta-se com anemia microcítica hipocrômica, RDW normal, perfil de ferro sem alterações, número de hemácias normal. Seu diagnóstico ocorre por meio do estudo da Hb. O método padrão-ouro é o high performance liquid cromatography (HPLC).

O manejo da reposição de ferro, em todas as fases do ciclo de vida, é competência essencial na atuação do médico na APS, sendo importante sua atualização permanente. Revisões como essa contribuem para a formação para a APS. A medicina centrada na pessoa, além de fortalecer o vínculo profissional–pessoa, auxilia no diagnóstico clínico e pode ser utilizada de modo tempo-efetivo no contexto da APS, em conjunto com a metodologia subjetivo, objetivo, avaliação e plano SOAP.

Atividades: Respostas

Atividade 1 // Resposta: C

Comentário: O MCCP corresponde ao método de abordagem do cuidado centrado no indivíduo e contribui para a prática clínica do médico e demais profissionais da saúde. Em sua descrição atual, apresenta quatro componentes interativos. A proposta do MCCP visa superar a doença e compreender o paciente envolvido no processo de adoecimento com empatia e humanidade, englobando questões individuais (biológicas, emocionais, psicológicas, espirituais) e relacionais (profissional–pessoa, familiares, comunitárias).

Atividade 2

RESPOSTA: A síndrome anêmica pode se manifestar de modo assintomático/oligossintomático ou, ainda, com astenia, palidez cutaneomucosa, cefaleia, tontura, dispneia, palpitações, sopros cardíacos, entre outros. É fundamental questionar o paciente sobre comorbidades, histórico familiar, medicações em uso, cirurgias prévias, alimentação e perversão do apetite, história ginecológica, sintomas gastrintestinais e evolução dos sintomas.

Atividade 3 // Resposta: B

Comentário: Após sua liberação na corrente sanguínea por diapedese, o eritrócito tem uma sobrevida de 120 dias, sendo destruído fisiologicamente no baço, caracterizando hemocaterese. A destruição celular pode ocorrer nos capilares sanguíneos ou fora deles no baço (ambiente hostil para as células) e ocasionar, além de anemia e icterícia, esplenomegalia, no caso da hemólise extravascular, e alteração da coloração urinária por hemoglobinúria e hemossidenúria, em situações que cursem com hemólise intravascular. Por consequência da destruição celular, há aumento da enzima LDH presente anteriormente no meio intracelular e, agora, no plasma.

Atividade 4 // Resposta: D

Comentário: A definição de anemia não se relaciona exclusivamente aos sinais e sintomas clínicos, tampouco aos níveis do perfil do ferro ou ao número de plaquetas. Anemia é a diminuição da taxa de Hb sanguínea <13g/dL para homens adultos, 12g/dL para mulheres adultas e 11g/dL para gestantes, segundo a OMS. Tais critérios foram estabelecidos como parâmetros para estudos nutricionais internacionais. Para o cuidado dos pacientes, valores de concentração de Hb, Ht ou contagem de hemácias abaixo do esperado para uma determinada população correspondem à definição de anemia.

Atividade 5 // Resposta: D

Comentário: O ferro é absorvido principalmente no duodeno. Alimentos ricos em ferro são carne vermelha, ovos, laticínios (forma heme), vegetais e grãos (forma não heme). É mais bem absorvido em sua forma heme, na membrana apical das células intestinais. No interior da célula intestinal, a molécula de ferro pode ser armazenada na forma de ferritina ou encaminhada para a região da membrana basolateral para entrar em contato com o tecido sanguíneo, por meio de uma molécula chamada ferroportina.

Atividade 6 // Resposta: D

Comentário: A anemia na gestação ainda é uma importante questão de saúde pública mundial e no Brasil, devendo ser rotina seu rastreio pelo MFC no pré-natal. O valor de corte para a Hb na gestação é <11g/dL, mais baixo do que para a mulher não grávida em função da hemodiluição fisiológica da gravidez. É importante lembrar que, para gestantes com valores de Hb normais, recomenda-se iniciar a suplementação de ferro a partir da 20ª. semana de gestação, evitando o estresse oxidativo trofoblástico no período da embriogênese.

Atividade 7

RESPOSTA: Além da hemodiluição fisiológica observada nas gestantes, outros fatores de risco para o aparecimento de anemia na gravidez são dieta pobre em ferro e outros minerais, variáveis sociodemográficas, como baixa renda e baixo nível de educação, idade inferior a 16 anos, intervalo curto entre duas gestações, gestação gemelar, baixo IMC, perdas sanguíneas em função de procedimentos ou lesões, presença de doenças crônicas, como DRC, hipotireoidismo, doenças autoimunes, entre outras, histórico familiar de anemia herdada, como talassemia ou anemia falciforme.

Atividade 8 // Resposta: A

Comentário: Segundo as recomendações da SBP, o RN pré-termo que nasce com peso <1.000g deve iniciar suplementação de ferro com 4mg/kg/dia a partir do 30º dia de vida e continuar com esse esquema até o primeiro ano de vida. Após, deve-se continuar a suplementação com 1mg/kg/dia de ferro até o segundo ano de vida.

Atividade 9 // Resposta: C

Comentário: Em alguns casos, a anemia por deficiência de vitamina B12 pode ser tratada por reposição via oral, porém em doses maiores do que por via intramuscular. Na anemia por DRC, assim como por doenças inflamatórias crônicas, a reposição de ferro também está indicada em algumas situações, pois existe deficiência de ferro sobreposta, em função da fisiopatologia da doença. Já nas anemias de causas inexplicadas, o tratamento consiste em medidas de alívio de sintomas, feitas em conjunto com o especialista, pois, muitas vezes, essas anemias são causadas por síndromes mielodisplásicas.

Atividade 10 // Resposta: D

Comentário: As proteínas responsáveis pelo armazenamento e transporte de ferro no organismo são, respectivamente, ferritina e transferrina. Na anemia ferropriva, caracteristicamente, a ferritina costuma estar baixa e a transferrina, alta. Uma forma indireta e mais acessível de avaliar os níveis de transferrina no plasma é por meio da avaliação da TIBC.

Atividade 11 // Resposta: B

Comentário: Há muitas formas complementares de abordar as anemias na prática clínica. Classificá-las quanto à morfologia das hemácias e quanto aos mecanismos fisiopatológicos é uma delas. As causas mais comuns de anemia microcítica são a anemia ferropriva e as talassemias, correspondendo a diagnóstico diferencial importante. O índice de reticulócitos pode auxiliar na compreensão do mecanismo da anemia. As anemias carenciais são as hipoproliferativas, com índice de reticulócitos costumeiramente reduzidos, enquanto hemólise, perda de sangue aguda e após tratamento de anemias carenciais pode ser observado índice de reticulócitos aumentado. A anemia de doença crônica ou anemia da inflamação corresponde à anemia costumeiramente normocítica. A anemia ferropriva, comumente, é microcítica, mas, pela sua alta prevalência, é a principal causa de anemia normocítica em nosso meio.

Atividade 12 // Resposta: D

Comentário: A normalização da Hb após reposição de ferro costuma ocorrer no segundo mês de tratamento. O tempo de tratamento indicado é de 6 meses após a normalização da anemia. Normalmente, são necessárias 6 a 8 semanas de tratamento para melhorar a anemia e 6 meses para repor as reservas de ferro. A monitoração do tratamento pode ser feita com vigilância da Hb a cada 2 meses e da ferritina, a cada 3 meses. Há pico de reticulócitos no décimo dia, mas do quarto ao sétimo dia já pode ocorrer aumento de reticulócitos.

Atividade 13

RESPOSTA: No âmbito da abordagem às anemias, como no caso exposto, foi essencial compreender, além da história de adoecimento, realizando diagnóstico clínico adequado, que os anseios e as demandas da paciente também são fundamentais para tranquilizá-la frente ao medo de que se tratasse de um sinal de leucemia ou outro câncer. Ademais, os antecedentes patológicos familiares foram abordados no primeiro componente e complementados pela perspectiva da família no âmbito do sistema complexo e das relações no segundo componente, facilitando o diagnóstico de anemia de causa hereditária e a identificação de que a reposição de ferro, sem o diagnóstico correto da causa de anemia, não traria benefícios para a paciente e poderia trazer desfechos iatrogênicos. Como analisado no caso clínico, a anemia crônica pode apresentar-se de forma oligossintomática ou assintomática. Primeiramente, é necessário identificar a causa da anemia e depois tratá-la. A paciente do caso clínico poderia ter sido diagnosticada precocemente (teste do pezinho), durante toda a infância e a vida adulta. Uma abordagem diagnóstica precoce poderia ter evitado a reposição desnecessária de ferro, que poderia causar iatrogenias, como hemocromatose.

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Como citar a versão impressa deste documento

Dias MMS, Lobo BLV. Abordagem a pessoas com anemia na atenção primária à saúde. In: Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade; Sassi AP, Fiuza TM, Dias RB, organizadores. PROMEF Programa de Atualização em Medicina de Família e Comunidade: Ciclo 16. Porto Alegre: Artmed Panamericana; 2021. p. 71–108. (Sistema de Educação Continuada a Distância, v. 3). https://doi.org/10.5935/978-65-5848-403-5.C0001

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