Introdução
O suporte ventilatório, em pacientes com insuficiência respiratória aguda (IRpA), ao longo da história e, principalmente, nas últimas três décadas, vem passando por uma série de modificações.1
Da epidemia de poliomielite, em meados de 1950, à pandemia da doença causada pelo coronavírus em 2019 (COVID–19), inúmeros foram os avanços que perpassaram primeiramente pela manutenção da vida, como ventilação por pressão negativa no iron lung (pulmão de aço), traqueostomia e ventilação com pressão positiva manual, surgimento dos ventiladores mecânicos com pressão positiva, ventiladores mecânicos com pressão positiva expiratória final (PEEP), pressão positiva contínua nas vias aéreas (CPAP), ventilação não invasiva (VNI), além da apresentação gráfica escalar de variáveis de controle da ventilação mecânica (VM) com modos avançados cada vez mais modernos.1
No decorrer das décadas, não foram aperfeiçoadas somente as máquinas para aplicação de VM, mas também os conceitos que regem seu manejo.2 A VM pode ser considerada um inimigo necessário, porque sua utilização é indispensável para ganhar tempo até a resolução da condição que levou o indivíduo a necessitá-la. Entretanto, apresenta um potencial iatrogênico importante. Décadas de estudos fisiológicos e clínicos levaram ao desenvolvimento do conceito de ventilação protetora para minimizar o que hoje é chamado de lesão pulmonar induzida pelo ventilador (LPIV).1
A análise de gases sanguíneos por meio de gasometria é provavelmente a ferramenta de diagnóstico mais utilizada em terapia intensiva, e a interpretação de seus achados permite compreender a maioria dos distúrbios respiratórios, circulatórios e metabólicos que ocorrem em pacientes críticos.3 Por muito tempo, manter a pressão parcial de oxigênio no sangue arterial (PaO2) e a pressão parcial de dióxido de carbono no sangue arterial (PaCO2) configurou-se uma estratégia de primeira linha em pacientes em uso de VM.4
Contudo, a partir da década de 1990, essa estratégia gradativamente veio perdendo força, principalmente com a introdução do conceito de hipercapnia permissiva em pacientes com síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA).4 Atualmente, estratégias que visam somente à normalização de gases sanguíneos, em detrimento de estratégia de ventilação protetora, são desencorajadas.5
Neste capítulo, serão abordados os conceitos mais importantes da ventilação protetora em pacientes críticos, evidenciando sua importância como boa prática em VM, bem como estratégias que visam estabelecê-la da forma menos injuriosa possível, mantendo os gases sanguíneos dentro dos limites aceitáveis.
Objetivos
Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de:
- compreender o equilíbrio acidobásico e seus distúrbios;
- identificar os principais parâmetros que levam a classificar a VM como protetora;
- estabelecer ajustes ventilatórios e realizar condutas que, frente aos distúrbios acidobásicos, permitam a manutenção da ventilação mais protetora possível para o paciente.