Introdução
As unidades de terapia intensiva (UTIs) surgiram no Brasil por volta de 1960 e são caracterizadas por admissão de pacientes graves e funcionamento em ambiente hospitalar, bem como compostas pelos mais sofisticados equipamentos e recursos para suporte de vida. Esses ambientes também requerem equipe experiente em cuidados a pacientes graves.1 Na década de 1970, foram implantadas, no Brasil, as unidades de terapia intensiva pediátrica (UTIPs),2 com assistência a pacientes com idades entre 29 dias e 18 anos de idade.3
O número de crianças que necessitam de atendimento intensivo é crescente desde o início das UTIPs no Brasil.4 As UTIPs têm o objetivo de promover5
- o tratamento para crianças em fase aguda de doenças graves;
- a estabilização de doenças crônicas;
- os cuidados intensivos pós-cirúrgicos;
- o alívio imediato de sintomas.
Novos estudos e investimentos em tecnologias, equipamentos e medicamentos que auxiliam no suporte à vida vêm sendo desenvolvidos para aplicação nas UTIPs em razão da demanda de cuidados intensivos pediátricos.2 A evolução do conhecimento e da terapêutica nesse contexto resultaram em diminuição das taxas de mortalidade em aproximadamente 2% ao ano, desde o ano 2000.6–9 Entretanto, simultaneamente ao aumento de sobrevida dos pacientes pediátricos, a morbidade de sobreviventes aos cuidados críticos tem aumentado em decorrência do processo de adoecimento e tratamento durante a internação.8,10,11
Uma recente revisão de literatura aponta que um novo comprometimento funcional, no momento da alta da UTIP, pode ocorrer em 10 a 36% das crianças gravemente doentes.12 Tal comprometimento, também chamado de síndrome pós-cuidados intensivos (em inglês, post intensive care syndrome [PICS]), repercute de forma negativa no desempenho e no desenvolvimento global da criança, podendo persistir por meses a anos após a alta hospitalar.6,12,13
Atualmente, a assistência em saúde na UTIP está sendo direcionada não apenas para maximizar a sobrevivência, mas também para aumentar a sobrevida, mantendo a adequada funcionalidade dos pacientes internados.14 A doença crítica é um evento importante que requer mudança de estilo de vida para pacientes e suas famílias. Muitos sobreviventes podem evoluir com deficiências novas e persistentes relacionadas às funções física, psicológica, cognitiva e social.15
Além de mensurar as taxas de mortalidade, a avaliação da morbidade, da funcionalidade e do bem-estar tem se tornado muito relevante para o acompanhamento de pacientes sobreviventes de UTIP.16,17
Objetivos
Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de
- reconhecer como a PICS pode afetar a funcionalidade de crianças hospitalizadas em UTIP;
- identificar e interpretar os resultados fornecidos por escalas de avaliação da funcionalidade de crianças internadas em UTIP e pós-alta hospitalar, traduzidas, adaptadas e validadas para uso na população brasileira;
- elaborar raciocínio clínico baseado em evidências científicas sobre a avaliação da funcionalidade de crianças internadas e sobreviventes de UTIP.