- Introdução
O colesteatoma é uma doença inflamatória crônica da orelha média. É caracterizado pelo crescimento de uma massa de aspecto cístico, formada por epitélio escamoso queratinizado (matriz), tecido conectivo subepitelial (perimatriz) e progressiva retenção de queratina em seu interior. Embora possa surgir em qualquer região pneumatizada do osso temporal, acomete predominantemente as cavidades timpânica e mastóidea.
Por estar, muitas vezes, relacionado a infecções recorrentes da orelha média que não receberam os cuidados adequados, o colesteatoma é mais frequente nos países em desenvolvimento. Embora não haja dados oficiais sobre a prevalência da doença no Brasil, ela aparece como um importante problema de saúde pública, com filas de espera para o tratamento cirúrgico que comumente ultrapassam 1 ano.1
Clinicamente, o colesteatoma se manifesta por otorreias recorrentes, de odor intenso característico, hipoacusia condutiva e pouca otalgia. Por apresentar expansão progressiva, com reabsorção do tecido ósseo adjacente e episódios de agudização do processo inflamatório, pode levar a complicações decorrentes do acometimento de estruturas nobres que estão no interior ou são limítrofes ao osso temporal. Perda auditiva, disfunção vestibular, paralisia facial, meningite e abscesso cerebral são algumas dessas possíveis complicações.
Apesar de mais de um século de pesquisas sobre o tema, os mecanismos pelos quais as células do epitélio escamoso estratificado queratinizado chegam à orelha média ainda não estão totalmente esclarecidos. Cada vez mais se acredita que o aparecimento e a evolução do colesteatoma sejam acontecimentos multifatoriais, estando relacionados primariamente a características genéticas e moleculares.
O tratamento do colesteatoma é fundamentalmente cirúrgico e tem por objetivos a erradicação da doença e a reabilitação da audição. Apesar da grande variedade de técnicas descritas, a recidiva pós-operatória, seja por recorrência ou por doença residual, continua sendo o principal desafio. Dependendo da extensão da doença no momento da cirurgia e da técnica empregada, há recidiva em 20 a 70% dos casos.2
O colesteatoma em crianças costuma ser mais agressivo, causar maior erosão da cadeia ossicular e ter taxas de recidiva maiores do que em adultos. Ao mesmo tempo, a maior expectativa de vida aumenta a necessidade de erradicação da doença e preservação ou reabilitação da audição. Este capítulo destacará essencialmente as particularidades e os desafios do colesteatoma na faixa etária pediátrica.
Neste capítulo, foi dada preferência ao uso das palavras “fresa” e “fresagem” em vez de “broca” e “brocagem” (ou “broqueamento”), em função de os autores considerarem ser esses os termos mais adequados. A broca é um instrumento apenas de perfuração, com seu poder de corte na ponta, de ação no plano vertical; portanto, inadequada para cirurgia otológica. Já a fresa é um instrumento de corte em planos laterais, em vários sentidos, como a que se utiliza nas cirurgias. No espanhol, também se usa o substantivo “fresa” e o verbo “fresar” nos compêndios de cirurgia otológica.
- Objetivos
Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de:
- definir e classificar o colesteatoma;
- reconhecer a epidemiologia do colesteatoma em geral e em crianças;
- comparar as principais teorias de formação dos colesteatomas congênito e adquirido primário;
- identificar os mecanismos biomoleculares envolvidos no crescimento do colesteatoma;
- conhecer as principais técnicas cirúrgicas de tratamento do colesteatoma e suas particularidades em crianças;
- reconhecer as formas de seguimento pós-operatório do colesteatoma;
- analisar as perspectivas futuras de tratamento do colesteatoma.
- Esquema conceitual