- Introdução
O impacto da cirurgia causa perturbações homeostáticas importantes,1 ocasionando, como consequência do estresse cirúrgico, o aumento do catabolismo e da demanda de oxigênio pelo organismo do indivíduo. A extensão e a duração disso dependerão da complexidade da cirurgia e dos fatores de risco associados ao desenvolvimento de complicações pós-operatórias.2
A maioria dos pacientes é submetida a procedimentos cirúrgicos quando apresenta capacidade funcional reduzida no período perioperatório,3 que pode evoluir para incapacidade ou dependência funcional. A dependência funcional é caracterizada pela dificuldade ou necessidade de auxílio para realizar as atividades de vida diária básicas, como tomar banho e se alimentar, ou mais complexas, como fazer compras.4 Além disso, alguns fatores, como a inatividade física crônica, associada ao avanço da idade, podem acelerar a redução de capacidade funcional5 e aumentar o risco de desenvolvimentos de doenças crônicas graves, como6
- doenças cardiovasculares;
- obesidade;
- câncer;
- diabetes melito tipo 2.
Os efeitos dessa inatividade física podem aumentar o risco de complicações quando o paciente é submetido a cirurgias de grande porte.7
Uma alternativa para minimizar os efeitos da inatividade física no período pós-operatório e, logo, o risco de complicações pós-operatórias é o condicionamento físico pré-operatório, que é baseado no princípio de que indivíduos com maior capacidade funcional toleram melhor os procedimentos cirúrgicos. Estudos vêm mostrando, ainda, que esses indivíduos realmente apresentam menor risco de desenvolverem complicações pós-operatórias e melhores resultados funcionais, psicossociais e cirúrgicos relacionados às condições pré-operatórias.8–10
O programa para melhora do condicionamento físico pré-operatório pode envolver exercícios aeróbios, resistidos e respiratórios, que são aplicados a pacientes que aguardam cirurgias de grande porte ou cirurgias de alta complexidade por, pelo menos, 4 semanas antes do procedimento cirúrgico. Esse tipo de estratégia tem sido adotado há pouco tempo, mas as primeiras evidências mostram que a melhora do condicionamento físico pré-operatório parece impactar no pós-operatório, levando à
- redução da incidência de complicações pulmonares;
- redução do tempo de hospitalização;
- redução da mortalidade;
- melhora da capacidade funcional;
- melhora da força muscular;
- melhora da qualidade de vida relacionada à saúde;
- aceleração da recuperação dos pacientes.
Para a prescrição de programas de condicionamento físico pré-operatório é necessário realizar uma minuciosa avaliação do paciente cirúrgico, conhecer suas limitações e seus objetivos e definir quais tipos e intensidades de exercícios serão benéficos ao paciente. Além disso, os profissionais devem supervisionar cuidadosamente o paciente durante todas as sessões de exercícios ou garantir apoio adequado nos casos de programas em domicílio e realizar a reavaliação do paciente ao término do programa para analisar seus efeitos.
No presente artigo, serão abordados os conceitos de pré-habilitação cirúrgica e condicionamento físico pré-operatório, bem como as evidências científicas da aplicação desse condicionamento físico e os seus benefícios relacionados ao período pós-operatório de pacientes submetidos a cirurgias de grande porte ou de alta complexidade.
- Objetivos
Ao final da leitura deste artigo, o leitor será capaz de
- descrever as possíveis complicações pulmonares pós-operatórias (CPPcomplicação pulmonar pós-operatórias);
- descrever o conceito de programa de condicionamento físico pré-operatório;
- identificar os benefícios de um programa de condicionamento físico pré-operatório para pacientes submetidos a cirurgias de grande porte ou de alta complexidade;
- apresentar recomendações baseadas em evidências para a aplicação de um programa de condicionamento físico pré-operatório.