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DISTÚRBIO NO Processo de pensamento: importante diagnóstico para o cuidado de enfermagem em saúde mental

Autores: Thiago da Silva Domingos, Julia Couto de Oliveira, Girliani Silva de Sousa, Tabata Galindo Honorato
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Objetivos

Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de

  • definir o Distúrbio no processo de pensamento (DPP) (00279);
  • explicar a psicopatologia aplicada ao raciocínio clínico para o diagnóstico de enfermagem (DE) DPP;
  • identificar as características definidoras e os fatores relacionados ao DE-DPP;
  • analisar criticamente os componentes do DE-DPP para a sua aplicação clínica;
  • identificar intervenções de enfermagem da Classificação das Intervenções de Enfermagem (NIC, do inglês, Nursing Intervention Classification) visando elaborar um plano de cuidados e resultados de enfermagem (REs) de acordo com a Classificação de Resultados de Enfermagem (NOC, do inglês, Nursing Outcomes Classification);
  • elaborar a assistência de enfermagem para pessoas com transtornos mentais que têm o DE-DPP de acordo com os cinco passos do processo de enfermagem, a partir da resolução de dois estudos de caso.

Esquema conceitual

Introdução

Os DEs fornecem dados precisos e adequados para o processo de inferência e precisão diagnóstica, bem como para o raciocínio clínico necessário à tomada de decisões.1

No processo de julgamento clínico, faz-se necessária a padronização da linguagem do DE-DPP para que o enfermeiro, na sua prática clínica, identifique os sinais e sintomas apresentados pelo indivíduo que sejam compatíveis com esse diagnóstico. Por conseguinte, o enfermeiro será capaz de escolher e implementar intervenções de enfermagem que levem à melhora do problema de saúde e/ou amenizem suas consequências, preservando sua autonomia e auxiliando-o no enfrentamento de sua situação.

O DE-DPP foi incluído na Taxonomia NANDA Internacional, Inc. (NANDA-I) desde a sua primeira edição em 1973, revisada em 1996. Por causa da escassez de evidências científicas para o seu desenvolvimento conceitual e a validação, desde 2009, esse diagnóstico foi excluído do sistema de classificação. Após revisão conceitual e validação por especialistas, houve a sua reintrodução na edição 2021–2023, com nível de evidência 2.3, e com o título Distúrbio no processo de pensamento.2

O DE-DPP está inserido no domínio 5 — percepção/cognição e classe 4 — cognição, definido por “ruptura na função cognitiva que afeta os processos mentais envolvidos no desenvolvimento de conceitos e categorias, raciocínio e solução de problemas”.2

A respeito das características definidoras do DE-DPP, destacam-se2

  • dificuldade para se comunicar verbalmente;
  • dificuldade para realizar atividades instrumentais da vida diária;
  • sequência de pensamentos desorganizada;
  • expressa pensamentos irreais;
  • interpretação de acontecimentos prejudicada;
  • julgamento prejudicado;
  • resposta emocional inadequada às situações;
  • capacidade limitada para encontrar soluções para situações cotidianas;
  • capacidade limitada para tomar decisões;
  • capacidade limitada para desempenhar papéis sociais esperados;
  • capacidade limitada para planejar atividades;
  • capacidade limitada para controlar impulsos;
  • obsessões;
  • transtornos fóbicos;
  • suspeições.

Os 10 fatores relacionados ao DE-DPP são2

  • confusão aguda;
  • ansiedade;
  • desorientação;
  • medo;
  • luto;
  • sintomas depressivos não psicóticos;
  • dor;
  • estressores;
  • abuso de substâncias;
  • trauma não abordado.

As populações de risco para o DE-DPP são2

  • indivíduos desfavorecidos economicamente;
  • indivíduos em pós-operatório imediato;
  • idosos;
  • mulheres grávidas.

Por fim, as condições associadas ao DE-DPP compreendem2

  • lesões encefálicas;
  • doença crítica;
  • alucinações;
  • transtornos mentais;
  • doenças neurodegenerativas;
  • preparações farmacêuticas.

A partir de revisão narrativa da literatura, com a palavra-chave “processo de pensamento perturbado” e o descritor “diagnóstico de enfermagem” nos portais de pesquisas no Banco de dados do National Center for Biotechnology Information (NCBI), PubMed, e Scientific Electronic Library Online (SciELO), o resultado apontou para 13 estudos, dos quais, após análise dos resumos, 10 referenciaram o DE-DPP na população de pacientes psiquiátricos e em idosos institucionalizados. Desses, apenas três trabalharam especificamente o refinamento e a validação do DE-DPP. Não há evidências brasileiras sobre o referido DE.3–5

Utilizou-se o termo “perturbado” somente para as buscas em português, uma vez que a mudança da tradução da versão em português com uso do termo DPP era recente à época em que foram realizadas.

Diversos referenciais foram traçados para o refinamento do DE-DPP, especificamente, em pacientes portadores de demência e em pessoas com transtornos mentais. Particularmente, em pessoas com transtornos mentais, a literatura advoga que se deve compreender o DE-DPP como pensamento irracional que pode estar presente em pessoas com diagnósticos psiquiátricos de depressão grave, psicose ou esquizofrenia, ou, ainda, com diferentes fatores psicossociais inter-relacionados, como a habilidade prejudicada para a resolução de problemas.3–5

Dentre as características definidoras propostas para o DE-DPP, citam-se como relevantes a desorganização de ideias, a falta de conexão e continuidade no pensamento.3–5

Estudos identificaram o DE-DPP entre um dos cinco mais prevalentes DE em pessoas com transtornos mentais em contexto de internação psiquiátrica. Contudo, em serviços de base comunitária e territorial, a prevalência foi baixa. A fragilidade dessas investigações se pauta por serem estudos retrospectivos com base documental, com dados coletados a partir dos prontuários.3–5

Deve-se realizar a atribuição do DE-DPP por meio da avaliação do estado mental conduzida por enfermeiros com base na observação dos sinais e sintomas e na coleta de dados subjetiva, realizada pela escuta dos relatos da pessoa, objetivando documentar o padrão de respostas e identificar os potenciais problemas circunscritos na vida desses indivíduos.3–6

Estudo de revisão integrativa sobre o DE-DPP identificou que a aplicação desse diagnóstico envolve a complexidade dos construtos do pensamento e da cognição, bem como suas correlações com processos cognitivos3

  • complexos:
    • pensamento;
    • linguagem;
    • inteligência;
    • criatividade;
  • simples:
    • sensação;
    • percepção;
    • atenção;
    • concentração;
    • memória;
    • imaginação.

Portanto, o conceito, as características definidoras e os fatores relacionados do DE-DPP não devem se concentrar exclusivamente no aspecto cognitivo do processo de pensamento, mas em uma abordagem clínica ampliada sobre as funções psíquicas e suas interações.3

Dada a relevância clínica do DE-DPP e a escassez de estudos brasileiros, espera-se que a identificação apropriada das características definidoras, dos fatores relacionados e da população em risco na condição associada a transtornos mentais, escolhida pelos autores diante de sua prevalência na literatura científica, possa facilitar a sua utilização na prática clínica dos enfermeiros e subsidiar a elaboração de planos de cuidados eficazes para os indivíduos em adoecimento psíquico.

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