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FISIOTERAPIA APLICADA AOS ESPORTES ELETRÔNICOS

Gustavo Toledo Mendes de Castro

Bruno Portes Fredi

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Objetivos

Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de

  • revisar como surgiram e em que momento histórico estão os Esports;
  • identificar as semelhanças e diferenças das modalidades que compõem o cenário dos Esports atualmente;
  • reconhecer fatores de risco e acometimentos físicos a que os atletas de Esports estão expostos;
  • indicar estratégias das quais o fisioterapeuta pode participar em uma equipe de Esports.

Esquema conceitual

Introdução

Atualmente, vive-se em um mundo totalmente informatizado, digital, no qual a tecnologia e suas derivações ganharam um espaço extremamente importante, interferindo diretamente no estilo de vida humano, abrindo possibilidades que as pessoas nunca haviam imaginado, e com os eletronic sports (Esports) não foi diferente.

Os jogos eletrônicos foram criados como uma forma de diversão, mas que também trazia o sentimento de competição, sendo o adversário a própria máquina ou, até mesmo, uma outra pessoa, e, por isso, a evolução desse cenário aconteceu de forma natural e gradativa.

O termo Esports pode ser definido como “Uma forma de esporte em que os seus aspectos primários são facilitados por sistemas eletrônicos; a participação de jogadores e equipes, bem como o sistema dos Esports, são mediadas por interfaces homem-computador”,1 ou seja, está se falando de um cenário competitivo profissional dos jogos eletrônicos, que, geralmente, são coordenados por diferentes ligas, torneios e afins, em que os jogadores costumam pertencer a equipes ou organizações.

Apesar da nomenclatura e das definições, ainda existem grandes divergências de opiniões em realmente considerar os Esports como, de fato, modalidades esportivas, pois muitas pessoas defendem que, para se considerar esporte, demanda medir a execução de tarefas que dependem de uma competência física.1,2

Tanto comitês esportivos internacionais quanto as áreas esportivas filosóficas, sociológicas e políticas apontam que são as capacidades físicas e o esforço dos competidores que determinam o resultado final, seja vencedor, seja perdedor,1,2 e esse é o principal ponto em que os Esports acabam sendo julgados.

Porém, em cima desse mesmo argumento existe uma contrapartida apresentada por Witkowski,2 em que defende a “esportividade dos Esports” ao descrever a capacidade de evolução coordenativa dos atletas oriunda de treinamento, além de aprimoramento dos conhecimentos teóricos e estratégicos, resultando em um desempenho físico necessário de um patamar profissional, pois, ao afastar o atleta dessas atividades por muito tempo, isso resulta também na queda da habilidade e de performance corporal necessária para o desempenho.

Por isso, Witkowski2 ainda compara citações de autores que estudam o “esporte” de forma acadêmica com o relatado anteriormente, reforçando ainda mais suas defesas, como demonstrado a seguir:

[...] os participantes do esporte têm um entendimento de como praticar seu esporte, e esse entendimento não é apenas cognitivo, mas também corporal, desenvolvido pela imersão do corpo nas práticas habituais de treinamento.3

O crescimento do cenário de forma exponencial chamou muito a atenção da indústria de todas as formas, que conseguiu projetar uma área de mercado nova e com alta tendência de lucratividade, desde o desenvolvimento das produtoras dos jogos até a exploração do entretenimento, como transmissões em larga escala por televisão e internet e altas premiações em dinheiro em competições.4

Estima-se que 90% das crianças nos Estados Unidos jogam algum jogo eletrônico regularmente4 e que cerca de 75% dos adolescentes brasileiros (entre 12 e 14 anos) gastam mais de 2 horas de tempo de tela (screentime) por dia, no computador, na televisão ou em smartphones.5

Nos Estados Unidos, já existem programas de bolsas de estudo em faculdades, times regulares de Esports nas escolas e campeonatos nacionais bem organizados, assim como acontece nos esportes tradicionais, cuja tendência é aumentar cada vez mais o número de participantes.6

A questão financeira fica muito atrativa para que mais pessoas se profissionalizem nos Esports; já aconteceram, por exemplo, premiações de cerca de US$ 11 milhões para um time de Defense of the Ancients 2 (Dota 2)7 e um prêmio individual de US$ 3 milhões para o vencedor do Fortnite World Cup, Kyle “Bugha” Giersdof, de 16 anos, sendo que, nessa mesma competição, um garoto argentino, Thiago “k1nG” Lapp, de apenas 13 anos, faturou US$ 900 mil com a terceira colocação.8,9

As transmissões de jogos e campeonatos são parte integrante desse sistema, e plataformas como Facebook, YouTube e Twitch (essa última criada especificamente para a transmissão de jogos eletrônicos, tanto de forma competitiva quanto recreacional) são grandes responsáveis pela repercussão mundial, sendo que já estão documentadas milhões de horas de visualizações e transmissões ao vivo simultâneas de competições de Esports, ultrapassando, algumas vezes, até competições como jogos da National Basketball Association (NBA).9

Com a facilidade do acesso à produção, à visualização e à transmissão de conteúdo on-line, uma pessoa pode fazer streaming dos jogos de casa, podendo transformar isso em possibilidades de profissionalização e contratação por organizações, como o exemplo do streamer Tyler “Ninja” Blevins, que já assinou até patrocínios com marcas de roupas esportivas e acumula milhões de dólares, ou seja, o público profissional não se limita apenas aos competidores, mas engloba, também, todos que seguem rotinas similares.

Após as discussões e análises envolvendo todos os órgãos relacionados e seguindo de perto o crescimento exponencial do número de pessoas envolvidas no cenário gamer, o Comitê Olímpico Internacional (COI), em 2017,10 decidiu incluir os Esports como tema das suas conferências, abrindo mais espaço para que essa comunidade pudesse estar mais próxima da comunidade esportiva tradicional.10–12

Diante disso, o COI definiu que os Esports competitivos são considerados uma atividade esportiva (mas que não se aplica aos jogos eletrônicos de lazer), já que os jogadores envolvidos se preparam e treinam com uma intensidade que pode ser comparada à dos atletas nos esportes tradicionais, ou seja, reconhecendo a demanda física e mental necessária para competir em nível profissional, mesmo que a literatura ainda se apresente escassa quando se foca em mudanças fisiológicas nesses praticantes.10–12

Além de tudo, o COI ainda declarou que, para os Esports serem considerados esportes, precisariam se enquadrar nos Valores Olímpicos (amizade, respeito, excelência) e que deve existir uma organização responsável para garantir o cumprimento das regras e regulamentos do Movimento Olímpico (antidoping, controle sobre apostas e manipulação de resultados, entre outros).10–12

Dessa forma, o COI firmou compromisso com a comunidade gamer de manter aberto o espaço ao diálogo e a pesquisas, mas dificuldades foram encontradas pelos órgãos supremos do esporte, pois alguns jogos e modalidades conhecidos no cenário competitivo não são compatíveis com os Valores Olímpicos, como, por exemplo, os jogos que retratam situações de violência, além do crescimento desordenado da indústria e do comércio relacionados aos Esports, o que também conflita diretamente com as diretrizes do Movimento Olímpico, que se baseiam em valores, e não no comércio.10–12

Por conta de todas essas incertezas, ainda está bem prematura a ideia de que os Esports se enquadrem em um evento de medalha olímpica, mas o Olympic Council of Asia (OCA), visando aos interesses regionais, realizou eventos demonstrativos de Esports durante os Jogos Asiáticos em 2018 (não interferindo diretamente no desempenho dos países), mas a previsão é de que, na próxima edição dos Jogos Asiáticos, programados para 2022, os Esports sejam implementados.10–12

O COI, juntamente com as federações internacionais dos esportes tradicionais, aprova a cooperação acelerada com os produtores e desenvolvedores de jogos de simulação real desses esportes, que estão se tornando cada vez mais físicos, graças à realidade virtual e aumentada, a fim de explorar possíveis benefícios e aplicação dessas versões eletrônicas.10–12

Em relação aos outros jogos eletrônicos que não têm envolvimento com os esportes tradicionais, o COI define que o movimento esportivo deve se concentrar nos jogadores, e não em jogos específicos, ou seja, o foco nos indivíduos deve promover a participação no esporte e seus benefícios, assim como no estilo de vida saudável em todos os níveis, incluindo um modelo de gerenciamento de saúde para os competidores de elite dos esportes eletrônicos, englobando saúde física e mental. Para isso, o desenvolvimento das equipes multidisciplinares dentro dessa área começa a ganhar cada vez mais espaço.10–12

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