- Introdução
A calcemia não reflete o estoque de cálcio, uma vez que mais de 98% do cálcio corporal encontra-se no esqueleto como um complexo mineral e apenas 1% do total é que se apresenta na forma sérica. Desse total, 40% está ligado à albumina, 10% forma complexos com citrato ou fosfato e 50% está na sua forma iônica, que representa a fração livre e biologicamente ativa.1,2
No líquido extracelular, o cálcio é fundamental para inúmeros processos de dilatação e constrição vascular, contração e relaxamento muscular, transmissão de estímulo nervoso, secreção hormonal e sinalização intracelular. Pelas inúmeras funções importantes que desempenha no organismo, o balanço de cálcio é precisamente controlado, e são três os principais mecanismos que mantêm a normocalcemia:3
- absorção intestinal;
- reabsorção renal;
- turnover ósseo.
O cálcio é absorvido passivae ativamente na mucosa intestinal em toda a sua extensão. O mecanismo passivo é paracelular e depende basicamente do gradiente transluminal desse elemento e, portanto, da sua ingestão alimentar.3 Na vida adulta, 25% do cálcio ingerido são absorvidos passivamente no intestino delgado. O transporte ativo se faz intracelularmente e depende da 1,25(OH)2 vitamina D, ou calcitriol. Esse mecanismo se faz necessário e é fundamental em situações de baixa e moderada ingestão de cálcio, nas quais o organismo consegue maximizar sua absorção em até 37%.4
A excreção do cálcio ocorre pelo trato intestinal (nas fezes 75%) e pela via urinária (22%), sendo que os outros 3% correspondem às perdas insensíveis. No rim, 98% do cálcio filtrado são reabsorvidos passiva e ativamente, sendo 70% nos túbulos contornados proximais e o restante na alça de Henle (ramo ascendente), no túbulo contornado distal e no ducto coletor.5-7
O hormônio da paratiroide (PTHhormônio da paratiroide) é o principal hormônio responsável pela regulação homeostática do cálcio. As paratiroides possuem receptores sensíveis ao cálcio (CaSRreceptores sensíveis ao cálcio), e pequenas quedas nos seus níveis estimulam a produção e a secreção do PTHhormônio da paratiroide. Este, por sua vez, atua positivamente na regulação da calcemia, estimulando a reabsorção óssea, a síntese do calcitriol pela 1α hidroxilase renal e aumentando a reabsorção renal do cálcio (Figura 1). O calcitriol, por sua vez, aumenta a taxa de absorção intestinal de cálcio e fósforo e inibe a excreção renal do fósforo. Nas paratiroides, o calcitriol estabelece uma retroalimentação negativa, inibindo a síntese do PTHhormônio da paratiroide.10-12
Figura 1 – Fisiologia do cálcio.
Fonte: Adaptada van Abel e colaboradores (2005).9
A hipocalcemia pode ser didaticamente subdividida, baseada nos níveis de fósforo, em:
- normo/hiperfosfatêmica;
- hipofosfatêmica.
A classificação da hipocalcemia auxilia no diagnóstico diferencial e na abordagem terapêutica.11
Na hipocalcemia normo/hiperfosfatêmica, as principais etiologias são:
- hipoparatiroidismo (HPThipoparatiroidismo) (por deficiência ou resistência ao PTHhormônio da paratiroide – pseudo-HPT– PHPT);
- insuficiência renal crônica.
Na hipocalcemia hipofosfatêmica, as causas são:
- deficiência da vitamina D (em quantidade ou ação – raquitismo e osteomalácia);
- perda de cálcio urinário;
- depósito de cálcio nos ossos e outros tecidos moles, secundário a medicações.
- Objetivos
Após a leitura deste artigo, o leitor será capaz de:
- reconhecer as principais etiologias da hipocalcemia;
- identificar a apresentação clínica da hipocalcemia;
- realizar o adequado manejo terapêutico de cada situação de ocorrência de hipocalcemia.
- Esquema conceitual