Objetivos
Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de
- identificar a anatomia e os achados normais da placenta na ressonância magnética (RM);
- reconhecer a técnica e o protocolo da RM de placenta;
- identificar as principais patologias placentárias, bem como seus achados na RM.
Esquema conceitual
Introdução
As anormalidades placentárias são de importância clínica considerável em razão de sua associação com altas taxas de morbidade e mortalidade fetal. A modalidade de avaliação de primeira linha é a ultrassonografia (USG), que é realizada rotineiramente durante a triagem fetal, entre 18 e 20 semanas de gestação. A USG tem um alto valor preditivo negativo para anormalidades placentárias. A avaliação por RM é realizada nos casos em que a USG é inconclusiva, em pacientes com alto risco clínico para acretismo placentário ou quando a avaliação da placenta é limitada (localizada posteriormente, por exemplo).1,2
Como a RM na maioria dos casos é realizada após a suspeita de uma anormalidade na USG, isso por si só aumenta a probabilidade pré-teste de uma anormalidade e pode introduzir viés na avaliação. Ao contrário da USG, a RM não é afetada por orientação fetal, oligoidrâmnio, ossos sobrejacentes ou obesidade e fornece melhor contraste de tecidos moles e imagens multiplanares com um campo de visão mais amplo.1
O momento ideal para avaliação da placenta com um exame de RM dedicado é controverso na literatura, sendo geralmente limitado pelo momento da detecção de uma anormalidade na USG, que, na maioria das vezes, ocorre no segundo ou terceiro trimestre de gestação.1 Para a avaliação de desordem de adesão placentária, por exemplo, o período ideal para avaliação é entre 28 e 32 semanas, e, nos casos em que a USG já fez um diagnóstico definitivo, a RM costuma ser usada para planejar o parto cesáreo e a histerectomia periparto.3
Neste capítulo, será discutido o papel da RM pré-natal na avaliação da placenta, com revisão de protocolos e técnicas, a anatomia da placenta e as características na RM das principais anormalidades placentárias.
Ressonância magnética na gestação
Atualmente, não há evidências de que a RM produza efeitos nocivos sobre o feto. As diretrizes do American College of Radiology (ACR) Manual on MR Safety de 2020 declaram que a RM pode ser usada em pacientes gestantes, independentemente da idade gestacional, quando os benefícios superam os riscos, conforme determinado pelo radiologista.4
A RM da paciente gestante pode ser realizada com segurança em 1,5 ou 3,0T, conforme indicado pelo ACR em seu documento de orientação, com base na ausência de efeitos deletérios ao feto na literatura atual. Já o uso de campo magnético superior a 3T (isto é, 7T) não é claro. A prática comum é usar um campo magnético menor (1,5T) sempre que possível.4,5
Agentes de contraste à base de gadolínio não são usados na gestação, a menos que seja absolutamente necessário. Esses agentes são classificados como substâncias da categoria C. Eles atravessam a placenta, e os dados que descrevem seus efeitos adversos de curto e longo prazo no feto humano são limitados.6
Protocolo
O exame de RM é realizado com a paciente, de preferência, em posição supina (o decúbito lateral esquerdo pode ser usado para diminuir o risco de compressão da veia cava pelo útero gravídico), com bexiga em pequena/média repleção, e uma bobina de superfície multicanal é usada para maximizar o sinal.7 O butilbrometo de escopolamina intramuscular (IM) ou intravenoso (IV) — Buscopan® — pode ser utilizado para reduzir o peristaltismo intestinal, mas não há um consenso. Além disso, especialmente no terceiro trimestre da gestação, o útero aumentado move as alças intestinais da região pélvica, e os artefatos de movimento na RM são principalmente devidos aos movimentos da mãe ou do feto, e não ao peristaltismo intestinal.8
A avaliação da placenta baseia-se em duas sequências principais:
- T2-weighted half-Fourier rapid acquisition with a relaxed enhancement (RARE) technique, com variantes conhecidas como half-acquisition turbo spin-echo (HASTE) ou half-Fourier single-shot fast spin-echo/turbo spin-echo (SSFSE/SSTSE);
- balanced steady-state free precession — fast-imaging employing steady-state acquisition (FIESTA), true fast imaging with steady-state precession (TrueFISP) e balanced fast field echo (balanced FFE).
Essas sequências são adquiridas nos planos axial, sagital e coronal, preferencialmente durante a respiração materna. Esses tipos de sequências são relativamente resistentes aos movimentos materno e fetal, resultando em menos artefatos relacionados ao movimento, e fornecem diferenciação anatômica razoável entre a placenta e o miométrio subjacente. O protocolo deve incluir pelo menos uma sequência ponderada em T1 gradiente com supressão de gordura em apneia para avaliar produtos sanguíneos de alta intensidade de sinal relacionados à hemorragia.1,2
A experiência com imagens ponderadas por difusão (DWI) na avaliação da placenta é limitada; entretanto, pode ajudar a diferenciar a placenta do miométrio subjacente. O tempo total de varredura do exame varia de 25 a 35 minutos, e, se possível, um radiologista pode avaliar as imagens iniciais e decidir se planos oblíquos ou sequências adicionais são necessários para melhor delinear a interface placenta–miométrio ou placenta–bexiga em casos de suspeita de desordem do espectro da placenta acreta (DEPA).1,2 O Quadro 1 resume o protocolo sugerido.
QUADRO 1
RESUMO DO PROTOCOLO SUGERIDO PARA RESSONÂNCIA MAGNÉTICA DE PLACENTA |
|||
Sequência |
Plano |
Espessura |
Justificativa |
T2 FSE/SSFSE/HASTE |
Coronal, sagital, axial |
≤ 4mm |
Localização placentária, detalhes anatômicos, sinais de acretismo |
T2 FIESTA/TrueFISP/balance FFE com saturação de gordura |
Coronal, sagital, axial |
4mm |
Anatomia, margens placentárias e vascularização |
T1 3D com saturação de gordura |
Axial ou sagital |
3mm |
Pesquisa de sangramentos, hemorragia intra ou extraplacentária |
T2 FSE/SSFSE/HASTE (foco no colo uterino) |
Sagital, axial |
4mm |
Estudo do colo, mensuração da distância da margem placentária ao orifício cervical interno |
Difusão (b0/b50 e b600/b1.000) |
Axial |
≤ 5mm |
Pesquisa de invasão placentária |
FSE: fast spin-echo; SSFSE: single-shot fast spin-echo; HASTE: half-acquisition turbo spin-echo; FIESTA: fast-imaging employing steady-state acquisition; TrueFISP: true fast imaging with steady-state precession; FFE: fast field echo. 3D: tridimensional. // Fonte: Adaptado de Concatto e colaboradores (2022).2
Placenta normal
A placenta tem morfologia variável, apresentando, mais comumente, forma discoide. Implanta-se em diferentes locais ao longo das paredes anterior, posterior ou fúndica, com a decídua basal normal fornecendo um plano de separação entre a placenta e a parede uterina. O tamanho da placenta é descrito pela espessura de sua porção média, que normalmente varia entre 2 e 4cm, em direção às bordas, que aparecem como ângulos suaves nas imagens em corte transversal. Placentas espessas são observadas em condições como:1,2
- hidropisia fetal;
- infecções anteparto;
- diabetes materno;
- anemia fetal ou materna;
- anomalias cromossômicas.
Em geral, a placenta tem um sinal predominantemente isointenso em relação ao miométrio circundante em imagens ponderadas em T2, e uma linha fina de separação entre o miométrio e a placenta pode ser visualizada (interface placenta–miométrio).1,2
No início do segundo trimestre, a placenta tem sinal mais homogêneo, com uma superfície plana e lisa. À medida que a idade gestacional aumenta e a placenta amadurece, ocorre um aumento do grau de lobulação, heterogeneidade e desenvolvimento de calcificações. A superfície materna da placenta, também referida como placa basal, contém lóbulos placentários ou cotilédones (Figura 1B), que correspondem a estruturas arredondadas de alto sinal em T2, delineadas por septos periféricos sutis de baixo sinal. A superfície fetal, também conhecida como placa coriônica, é o local onde o cordão umbilical se insere (Figura 1A).1,2
FIGURA 1: Ilustração. A) Superfície fetal da placenta, conhecida como placa coriônica, onde o cordão umbilical se insere. B) Superfície materna da placenta, conhecida como placa basal, que contém os cotilédones. // Fonte: Adaptada de Sajurra (2023).9
O miométrio uterino também varia de aparência durante a gestação. Com menos de 30 semanas, o miométrio tem aparência trilaminar: a camada interna, que compreende a decídua basal e o miométrio interno, forma a interface uteroplacentária, enquanto a camada externa representa a serosa uterina.3,10
As camadas interna e externa do miométrio apresentam baixo sinal em T2, enquanto a camada intermediária, mais espessa, apresenta alto sinal em relação ao sinal da placenta.3,10
À medida que o miométrio se afina com a progressão da gestação, especialmente após 30 semanas, as camadas se tornam menos distintas e são visualizadas como uma banda ou faixa contínua de baixo sinal em T2 ao redor da placenta. A placenta, em geral, é claramente distinta do miométrio subjacente por uma interface placenta–miométrio de baixo sinal em T2 (linha ou banda retroplacentária). O útero gravídico apresenta contorno liso, com fundo e corpo mais largos do que o segmento inferior (aspecto em formato de pera invertida — Figura 2).3,10
FIGURA 2: T2 sagital TrueFISP de paciente de 30 anos com placenta normal, apresentando útero com formato de pera invertida. // Fonte: Arquivo de imagens das autoras.
Alguns poucos flow voids de menos de 5mm podem ser vistos na região subplacentária e no parênquima placentário, muitas vezes, perto da inserção do cordão umbilical e também na camada média do miométrio.2
Formatos e variações de placenta: atipias
Existem algumas formas variantes da placenta:
- bilobada — dois lobos de tamanhos semelhantes (Figura 3A); aumenta o risco de vasa previa (VP) e ruptura dos vasos entre os lobos durante o parto;1,7
- sucenturiada — pequeno lobo acessório separado do restante da placenta (Figura 3B e Figura 4); apresenta risco de ruptura dos vasos entre os lobos ou retenção do lobo acessório com consequente hemorragia pós-parto;1,7
- circunvalada — desproporção entre as faces placentárias, sendo a coriônica menor, com tecido placentário periférico sobressalente (Figura 3C); tem um risco aumentado de descolamento da placenta, parto prematuro, baixo peso e hemorragia;1,7
- membranácea ou difusa — configuração membranosa fina que ocupa circunferencialmente a periferia do córion (Figura 3D); aumenta o risco de placenta prévia (PP), sangramento vaginal e parto prematuro.1,7
FIGURA 3: Esquema dos tipos de placentas. A) Bilobada. B) Sucenturiada. C) Circunvalada. D) Membranácea. // Fonte: Arquivo de imagens das autoras.
FIGURA 4: T2 sagital HASTE de paciente de 34 anos com placenta sucenturiada. Lobo principal com implantação posterior e lobo acessório anterior (seta). // Fonte: Arquivo de imagens das autoras.
Há outros tipos também descritos na literatura, extremamente raros, como placenta fenestrada e placenta anular (em forma de anel).
Inserção do cordão umbilical
Na inserção excêntrica ou marginal (Figura 5A), o cordão umbilical insere-se a uma distância de 1 a 2cm da borda placentária.1,7
Na inserção velamentosa (Figura 5B e Figura 6), o cordão umbilical insere-se nas membranas corioamnióticas, e não na massa placentária. Essa conformação associa-se a baixo peso fetal e batimentos cardíacos anormais no parto.1,7
FIGURA 5: Inserções anômalas do cordão umbilical. A) Marginal. B) Velamentosa. // Fonte: Adaptada de Krasavina (2023);11 Krasavina (2023).12
FIGURA 6: T2 sagital HASTE de paciente de 37 anos com placenta sucenturiada, apresentando inserção velamentosa do cordão (seta) entre as membranas que conectam os lobos (cabeças de setas), junto ao orifício cervical interno, configurando VP do tipo I. // Fonte: Arquivo de imagens das autoras.
Gestações gemelares
Os sinais ultrassonográficos usados para distinguir duas placentas também são aplicáveis à RM:
- sinal do lambda — está relacionado à projeção triangular do tecido placentário ao longo da membrana intergêmea e é geralmente observado no início do segundo trimestre em gestações dicoriônicas e diamnióticas (Figura 7A e Figura 8);1
- sinal do T — indica interseção de 90º da placenta única com a membrana intergêmea em uma gestação monocoriônica e diamniótica (Figura 7B).1
FIGURA 7: A) Sinal do lambda em gestações gemelares dicoriônicas e diamnióticas. B) Sinal do T em gestações gemelares monocoriônicas e diamnióticas. C) Gestações gemelares monocoriônicas e monoamnióticas. // Fonte: Arquivo de imagens das autoras.
FIGURA 8: T2 coronal HASTE mostrando o sinal do lambda (cabeça de seta) em gestação gemelar dicoriônica e diamniótica. // Fonte: Arquivo de imagens das autoras.
Anormalidade de posição
As anormalidades de posição incluem PP e VP.
Placenta prévia
A placenta prévia (PP) implanta-se no segmento uterino inferior, sendo dividida em subtipos de acordo com sua localização em relação ao orifício cervical interno (Figura 9A–D):1,13
- marginal — sua borda inferior é adjacente ou dentro de 20mm do orifício cervical interno;
- parcial — sua borda cobre o orifício cervical interno parcialmente;
- completa — a maior parte da massa placentária cobre o orifício cervical interno.
FIGURA 9: A) Placenta com inserção normal. Suptipos de PP: B) marginal, C) parcial e D) completa. // Fonte: Arquivo de imagens das autoras.
O diagnóstico definitivo de PP deve ser evitado no início da gestação, uma vez que a relação da placenta com o orifício interno do colo do útero muda à medida que a gestação progride, e mais de 90% das placentas de implantação baixa desaparecem no terceiro trimestre.1,13
Um painel de especialistas do American Institute of Ultrasound in Medicine recomendou recentemente o fim do uso dos termos “parcial” e “marginal” e o uso do termo “placenta prévia” apenas quando a placenta estiver diretamente sobre o orifício interno. A placenta deve ser relatada como “baixa” quando sua borda está a menos de 2cm do orifício interno e como normal quando sua borda está a mais de 2cm do orifício interno.14
Os fatores de risco para o desenvolvimento de PP incluem:1
- cirurgia uterina anterior (cesariana);
- tabagismo;
- idade materna avançada;
- multiparidade;
- gestações múltiplas.
A PP aumenta o risco de complicações com risco de vida, como sangramento materno, prematuridade, natimorto e morte neonatal. Essa condição é, por si só, um fator de risco para placenta acreta (Figura 10) e outras formas avançadas de placentação anormal.1
FIGURA 10: T2 sagital HASTE de paciente de 30 anos com PP completa e sinais sugestivos de acretismo placentário, apresentando vasos subplacentários proeminentes especialmente na interface miométrio-vesical (seta). // Fonte: Arquivo de imagens das autoras.
Vasa previa
A vasa previa (VP) é uma condição rara e subnotificada, com uma taxa de mortalidade relatada variando entre 33 e 100%. Na VP, vasos fetais anormais atravessam as membranas amnióticas (membranas fetais) e cruzam o orifício cervical ou passam perto dele (dentro de 2,0cm). Esses vasos anormais não são protegidos por tecido placentário ou geleia de Wharton. Eles conectam uma inserção velamentosa do cordão com o corpo da placenta ou duas porções de uma placenta bilobada ou sucenturiada. Estão, portanto, em maior risco de lesão e ruptura durante o parto quando as membranas de suporte se rompem.1
Os fatores de risco para VP incluem fertilização in vitro, PP, placenta bilobada, placenta sucenturiada e gestações múltiplas. O diagnóstico de VP também deve ser confirmado no final da gestação, uma vez que, de forma semelhante à PP, a VP pode desaparecer à medida que o útero aumenta de tamanho.1
A VP pode ser classificada em três tipos (Figura 11A–C):15
- tipo I — inserção velamentosa de cordão;
- tipo II — vasos conectando os lobos de uma placenta bilobada ou sucenturiada (Figura 12A e B);
- tipo III — placenta defeituosa, com vasos fetais desprotegidos saindo para fora da placenta.
FIGURA 11: Esquema dos tipos de VP. A) Tipo I. B) Tipo II. C) Tipo III. A passagem de vasos sanguíneos desprotegidos através ou perto do orifício cervical interno é comum a todos os três tipos. // Fonte: Arquivo de imagens das autoras.
FIGURA 12: T2 sagital HASTE (A) e T2 axial HASTE (B) de paciente de 36 anos com placenta bilobada. Observam-se vasos que conectam os dois lobos cruzando o orifício cervical interno, configurando VP do tipo II (setas). // Fonte: Arquivo de imagens das autoras.
Anormalidade de implantação
Desordem do espectro da placenta acreta
A desordem do espectro da placenta acreta (DEPA) é a terminologia atual recomendada pela Federação Internacional de Obstetrícia e Ginecologia (FIGO) e deve substituir termos como “placenta acreta/invasiva”.16
A DEPA é uma condição caracterizada pela implantação anormal da placenta, que ocorre quando as vilosidades coriônicas invadem o miométrio por meio de um defeito da decídua basal. A incidência da DEPA aumentou nas últimas décadas, especialmente pelo maior número de partos cesáreos.3
Tradicionalmente a DEPA é subdividida em três tipos de acordo com o seu grau de invasão (Figura 13):16–18
- acreta (entre 60 e 75% do casos) — quando há ultrapassagem da decídua basal e aderência ao miométrio;
- increta — quando há penetração do miométrio;
- percreta — quando há invasão da serosa do útero ou de tecidos ou órgãos adjacentes a ele.
A literatura mais recente prefere os termos placenta mioaderente (placenta acreta) e mioinvasiva (placenta increta e percreta).19,20
FIGURA 13: Classificação tradicional da placentação: placenta normal, placenta acreta, placenta increta e placenta percreta. Na placentação anormal, as vilosidades coriônicas (marrom) invadem a decídua basal (laranja) e o miométrio uterino subjacente (rosa claro) em diferentes profundidades. // Fonte: Arquivo de imagens das autoras.
Os principais fatores de risco para DEPA são3,16,18
- história prévia de cesariana (principal);
- PP;
- técnicas de reprodução assistida;
- procedimento uterino prévio (miomectomia);
- idade materna avançada;
- multiparidade;
- endometrite pós-parto;
- histeroscopia;
- síndrome de Asherman.
A DEPA está associada a aumento do risco de hemorragia, histerectomia periparto, complicações cirúrgicas, coagulopatia disseminada, falência renal e disfunção respiratória aguda, podendo também estar associada a hemorragia intratável ou maciça, com necessidade de múltiplas terapias de transfusão de sangue e aumento significativo de morbidade e mortalidade materna.10,21
Os exames de escolha são a USG e a RM. A USG com Doppler colorido é o exame de imagem de primeira linha, mais acessível, amplamente disponível e com boa sensibilidade e especificidade.20
A RM tem um papel complementar em caso de suspeita de DEPA na USG. Também é a modalidade de imagem preferida para planejamento cirúrgico, pois oferece maior campo de visão e maior reprodutibilidade em comparação com a USG. No entanto, deve-se notar que a precisão da RM da placenta depende dos níveis de experiência dos radiologistas, sendo que a experiência específica em RM da placenta melhora significativamente o desempenho diagnóstico.22
A RM é realizada especialmente quando a avaliação USG é duvidosa, em casos de pacientes com fatores de risco clínicos para acretismo, de placenta localizada posteriormente, de pacientes obesas ou planejamento cirúrgico (cesariana ou histerectomia) nos casos confirmados, sendo o período ideal de avaliação entre 28 e 32 semanas.3
A avaliação antes de 28 semanas de gestação é limitada em virtude da maturidade placentária incompleta e pode ser desafiadora após 32 semanas de gestação em decorrência de características sobrepostas de gestação tardia normal e a DEPA.20 No entanto, mais recentemente, viu-se que características da DEPA também podem ser observadas no primeiro trimestre. A implantação anterior baixa próxima ou no local de uma histerotomia anterior é preocupante para a gestação em cicatriz de cesariana, um precursor de DEPA grave, mais bem detalhada na próxima sessão.19,20
Muitas características de RM da DEPA são descritas na literatura, com sensibilidades e especificidades diferentes. Para padronizar a avaliação em RM, a Sociedade de Radiologia Abdominal (SAR) e a Sociedade Europeia de Radiologia Urogenital (ESUR) divulgaram um Consenso fornecendo orientação para aquisição e interpretação de imagens de RM, um léxico de relatórios.19,20 Durante a interpretação da imagem, nenhum desses achados é avaliado isoladamente, e o uso de mais de um critério aumenta a confiabilidade do diagnóstico.10,18
Os achados recomendados pelo Consenso estão relacionados a seguir.
- Bandas hipointensas em T2 intraplacentárias — representam áreas de depósito de fibrina em decorrência de hemorragia e infartos. São áreas nodulares ou lineares irregulares de baixo sinal em T2 que se estendem na interface placenta–miométrio, variando em tamanho de 6 a 20 mm. Essas bandas são mais espessas que os septos finos placentários normais e mostram distribuição randômica. Esse sinal é o mais sensível na RM, e o maior volume de bandas está associado a maior profundidade de invasão (Figura 14A e B).3,10,16,19,20
- Abaulamento uteroplacentário — desvio da serosa uterina do plano esperado. A serosa uterina permanece intacta; no entanto, a forma uterina é distorcida morfologicamente. Existem duas formas, a primeira é um abaulamento difuso do contorno do segmento uterino inferior, que resulta na perda da forma típica de pera invertida, desenvolvendo uma configuração de ampulheta ou boneco de neve (isso pode ser observado em gestações normais). A outra é um abaulamento focal menor no miométrio, que foi relatado como mais útil para o diagnóstico da DEPA e está associado a invasões miometriais mais profundas. A protuberância placentária uterina em conjunto com outros achados da DEPA é 100% preditiva de invasão miometrial; no entanto, o sinal da protuberância uterina sozinho, sem outras características, pode levar a resultados falsos-positivos.10,19,20
- Afilamento miometrial — é definido como afilamento menor que 1 mm ou imperceptível. A perda da aparência trilaminar normal do miométrio pode estar presente na placenta normal, em virtude do afilamento fisiológico do miométrio à medida que a gestação progride, principalmente no local de uma cicatriz anterior de cesariana; no entanto, a linha hipointensa T2 na margem serosa deve permanecer intacta. Esse sinal deve ser usado apenas em conjunto com outros achados que apoiem o diagnóstico da DEPA, particularmente se a imagem for realizada após 32 semanas de gestação.10,19,20
- Perda da zona de baixo sinal em T2 retroplacentária — a perda focal ou difusa da linha hipointensa em T2 da interface placenta–miométrio pode ser observada na DEPA. Muitas vezes, é vista em conjunto com o afilamento do miométrio, e essa linha pode ser difícil de se visualizar no final da gestação e deve ser interpretada em conjunto com outros achados (Figura 14C e D).3,10,19,20
- Massa exofítica focal — refere-se a invasão de tecido placentário para o miométrio, rompendo a margem serosa uterina hipointensa em T2, com extensão variável além da superfície serosa. Esse sinal é visto com mais frequência ao longo do aspecto anterior do útero em direção à bexiga ou no paramétrio. Esse achado é altamente específico para placenta percreta. A descrição detalhada do envolvimento de estruturas adjacentes como bexiga, intestino, paramétrio, parede lateral pélvica, vasos, ureteres e parede abdominal é fundamental para o planejamento cirúrgico (Figura 15A e B).10,19,20
- Vascularização anormal do leito placentário — o leito retroplacentário consiste em vasos normais, decídua e miométrio adjacente. Em virtude das alterações vasculares placentárias nos distúrbios da DEPA, esses vasos perdem sua aparência uniforme e tornam-se heterogêneos em tamanho, com ruptura da interface uteroplacentária. Essa rede de vasos anormais pode se estender até o miométrio e seguir ao longo da serosa, aparecendo hipertrofiada ao redor da bexiga, do útero e da vagina. A presença de vasos no espaço vesicouterino é altamente suspeita de envolvimento da parede da bexiga. Da mesma forma, a presença dos vasos que se estendem da superfície uterina para a gordura parametrial — o sinal do vaso parametrial —, sendo um preditor independente de invasão parametrial. O aumento normal da vascularização periuterina no final da gestação é uma armadilha conhecida.10,19,20
- Interrupção da parede da bexiga — a interrupção focal ou irregularidade da parede normal da bexiga hipointensa em T2 é preocupante para o seu envolvimento. A invasão nodular direta da placenta na bexiga é diagnóstica de placenta percreta, mas raramente é observada; da mesma forma, a presença do sinal da tenda da bexiga, o qual apresenta alta especificidade. O sinal do vaso vesical e o sinal do vaso seroso — que se referem a flow voids na parede da bexiga e na serosa ou no espaço vesicouterino — também são altamente suspeitos de envolvimento da parede da bexiga.10,19,20
Recursos de imagem adicionais também são discutidos no Consenso como preditores da DEPA; no entanto, essas características foram categorizadas como incertas. A incapacidade de chegar a um consenso foi atribuída à natureza subjetiva, à variabilidade entre os leitores e à sobreposição com as características esperadas da evolução da placenta no final da gestação.19,20
Os recursos adicionais pelo Consenso estão relacionados a seguir.
- Heterogeneidade placentária — causada pela interação entre hemorragia, bandas hipointensas intraplacentárias e flow voids. Embora a heterogeneidade placentária não tenha alcançado o Consenso, esse achado foi descrito na literatura como tendo boa sensibilidade e especificidade para DEPA. A placenta homogênea pode excluir a placentação anormal com altos níveis de confiança. Um grau leve a moderado de heterogeneidade placentária é considerado um sinal menos útil de invasão placentária, porque a intensidade de sinal heterogênea também pode ser vista normalmente no terceiro trimestre (“heterogeneidade de envelhecimento”). Esse sinal é um indicador relativamente inespecífico em decorrência do alto grau de subjetividade na avaliação.3,10,16,19,20
- Espessamento assimétrico ou forma de placenta — espessamento na área de suspeita de DEPA, que geralmente está localizada sobre o orifício cervical interno (nos casos de PP).19,20
- Vascularização intraplacentária anormal — flow voids tortuosos dilatados ou aglomerados intraplacentários. Tradicionalmente considerado quando o diâmetro do vaso é maior que 6mm, no entanto, a literatura recente sugere que sejam considerados quando forem maiores que 3mm e de origem fetal, estendendo-se do cordão umbilical ou da superfície coriônica ou subcoriônica da placenta até o miométrio subjacente.19,20
- Infarto isquêmico placentário — áreas de afilamento assimétrico da placenta decorrentes de infartos repetidos. No entanto, áreas de infarto periférico podem ser observadas na placenta normal no final da gestação, especialmente no cenário de insuficiência placentária subjacente.19,20
FIGURA 14: Paciente de 36 anos. T2 sagital HASTE (A) e T2 sagital TrueFISP (B) demostrando vasos intraplacentários anômalos (setas longas) e bandas intraplacentárias (setas curtas). As bandas são hipointensas tanto no T2 HASTE quanto no TrueFISP, ao contrário dos vasos, que ficam hipointensos no TrueFISP. T2 axial HASTE (C) e T2 axial TrueFISP (D): observam-se placenta lobulada, com afilamento miometrial e perda da interface placenta–miométrio, e vasos retroplacentários proeminentes (setas pontilhadas). Esses achados sugerem DEPA (mioaderente). // Fonte: Arquivo de imagens das autoras.
Embora o diagnóstico definitivo seja estabelecido por uma classificação clínica e histopatológica combinada no momento do parto, o diagnóstico pré-natal preciso e o manejo multidisciplinar são essenciais para orientar o tratamento e garantir resultados ideais para essas pacientes, diminuindo a morbidade e a mortalidade materna e fetal.20
FIGURA 15: T2 coronal HASTE (A) e T2 axial HASTE (B) de paciente de 35 anos apresentando lobulação do contorno externo do útero na parede anterolateral esquerda da porção inferior, com sinais de extensão extrauterina (setas) nessa localização, sugerindo placenta percreta (mioinvasiva). // Fonte: Arquivo de imagens das autoras.
Gestação em cicatriz de cesariana
A gestação em cicatriz de cesariana (GCC) é uma complicação na qual há implantação do saco gestacional na cicatriz de uma cesariana anterior. Ela também é citada na literatura como gestação ectópica na cicatriz de cesariana, gestação heterotópica em cicatriz de cesariana ou gestação ístmica. O aumento do número de partos cesáreos nas últimas décadas levou a um aumento da incidência de GCC. A gestação ectópica em cicatriz de histerotomia também foi relatada após miomectomia, acretismo placentário anterior, metroplastia, histeroscopia e fertilização in vitro. Duas entidades distintas são identificadas:23,24
- tipo 1 (endógena/na cicatriz) — implantação no tecido cicatricial do miométrio com expansão em direção ao espaço cervicoístmico ou à cavidade uterina; possui o potencial de alcançar uma gestação viável a termo, mas com risco de placenta acreta e hemorragia obstétrica importante;
- tipo 2 (exógena/no nicho) — implantação dentro do defeito ou nicho de uma cicatriz incompleta cicatrizada/deiscente anterior (Figura 16A e B), com crescimento infiltrativo no miométrio uterino e na superfície serosa uterina, em direção à bexiga urinária e à parede abdominal; pode resultar em ruptura uterina e hemorragia maciça no primeiro trimestre da gestação.
FIGURA 16: T2 sagital HASTE (A) e T1 axial pós-contraste (B) de paciente de 35 anos apresentando gestação na cicatriz de cesariana, com tecido trofoblástico implantado dentro do defeito/nicho. // Fonte: Arquivo de imagens das autoras.
A GCC representa uma patologia diferente em comparação com a gestação intrauterina com placenta acreta.23,24
A GCC caracteriza-se pela implantação do saco gestacional no interior da cicatriz de cesariana, circundado por miométrio e tecido conjuntivo, completamente separado da cavidade endometrial. No acretismo, a gestação localiza-se essencialmente no interior da cavidade uterina e caracteriza-se pela ausência de decídua basal e por graus variados de invasão do miométrio pelo trofoblasto.23,24
A GCC é considerada como um evento mais agressivo do que o acretismo placentário em razão da precocidade da invasão miometrial.23,24
Neoplasias placentárias
As massas placentárias podem ser classificadas como de origem trofoblástica ou não trofoblástica (Quadro 2).
QUADRO 2
CLASSIFICAÇÃO DAS MASSAS PLACENTÁRIAS |
|
Trofoblásticas |
Não trofoblásticas |
|
|
// Fonte: Adaptado de Jha e colaboradores (2020).25
Doenças trofoblásticas gestacionais
A maioria das neoplasias placentárias é de origem trofoblástica. A doença trofoblástica gestacional (DTG) é um grupo heterogêneo de distúrbios relacionados à gestação caracterizados pela proliferação anormal do tecido trofoblástico. Abrange:26
- molas hidatiformes pré-malignas (completa e parcial);
- mola invasiva maligna;
- coriocarcinoma;
- tumor trofoblástico de sítio placentário (TTSP);
- tumor trofoblástico epitelioide (ETT).
As formas malignas da doença também são conhecidas coletivamente como neoplasia trofoblástica gestacional (NTG).26
Quase 80% de todas as DTG são do tipo mola hidatiforme pré-maligna. O coriocarcinoma é o mais raro de todos os tipos. Aproximadamente 50% dos coriocarcinomas surgem de gestações molares, 25% de gestações a termo ou pré-termo e o restante da interrupção da gestação.1,7
Os fatores de risco para DTG incluem:1,7
- idade materna (menos de 20 anos e mais de 40 anos);
- história de gestação molar prévia;
- história de uso de contraceptivos orais.
Na DTG, a RM é útil na avaliação de invasão miometrial e no estadiamento local.1,7
Mola hidatiforme (completa e parcial)
Ambos os tipos, mola hidatiforme completa e parcial, são condições pré-malignas que resultam de erros de fertilização. A mola hidatiforme completa é a mais comum e ocorre após a fertilização de um óvulo vazio, já a mola hidatiforme parcial é menos comum e resulta da fertilização de um óvulo normal por dois espermatozoides, gerando um genótipo triploide.26 Estudos recentes apontam que a mola hidatiforme parcial é mais frequente e, muitas vezes, subdiagnosticada.27 As molas completas carecem de tecido fetal e aparecem como uma massa multicística complexa. Nas molas parciais, a aparência pode se assemelhar à da completa, mas, nesse caso, o tecido fetal também está presente e pode sobreviver até o segundo trimestre.1,28
Os cistos tecaluteínicos são vistos em 25 a 40% dos pacientes com molas hidatiformes completas em decorrência dos níveis elevados de gonadotrofina coriônica humana (B-HCG), resultando em aumento ovariano multicístico bilateral.1,28
A RM não é realizada rotineiramente para distinguir entre molas hidatiformes parciais e completas, mas pode ser obtida para determinar se há um componente invasivo. Os achados da RM permanecem inespecíficos para gestações molares, aparecendo como tecido heterogêneo expandindo a cavidade endometrial com espaços multicísticos representando as vilosidades hidrópicas, com algumas áreas focais de hemorragia e intenso realce (Figura 17A e B).1,28
FIGURA 17: T2 sagital (A) e T1 coronal pós-contraste (B) em gestante de 10 semanas, mostrando lesão sólido-cística (setas longas) estendendo-se do endométrio para o miométrio, sugestiva de gestação molar com componente invasivo. Notam-se os múltiplos cistos tecaluteínicos (setas curtas). // Fonte: Adaptada de Fadl e colaboradores (2017).29
Neoplasia trofoblástica gestacional
As molas invasivas resultam do crescimento do tecido trofoblástico para dentro e além do miométrio por extensão direta e através de canais venosos. Quase 10 a 17% das molas hidatiformes resultarão em molas invasivas, e cerca de 15% delas metastizarão para os pulmões ou a vagina. No coriocarcinoma, a disseminação vascular para locais distantes é mais comum. O pulmão é o local mais comum (76 a 87%), seguido pela vagina. Também podem ocorrer metástases para fígado, cérebro, rins, trato gastrintestinal e baço.28
Na RM, molas invasivas e coriocarcinomas têm características de imagem semelhantes, sendo o papel mais significativo da RM a avaliação da invasão miometrial e parametrial para o estadiamento da doença. Esses tumores geralmente aparecem como uma massa intrauterina multicística. Às vezes, o coriocarcinoma mostra mais áreas de necrose, hemorragia e componentes sólidos de tecidos moles que realçam vivamente ao contraste em razão da sua vascularização aumentada. A ruptura da zona juncional com focos realçados dentro do miométrio indica invasão miometrial. A RM é útil para determinar a profundidade da invasão da mola invasiva e do coriocarcinoma, mas não pode distinguir, com segurança, essas duas entidades.28
Neoplasias benignas
As neoplasias benignas incluem corioangioma, teratoma placentário e cistos.
Corioangioma
O corioangioma é o tumor placentário não trofoblástico mais comum, seguido pelo teratoma, identificado em 1% de todas as placentas avaliadas histologicamente. Os corioangiomas são tumores vasculares benignos, que podem demonstrar hemorragia intratumoral ou infarto, normalmente encontrados junto à inserção do cordão umbilical (Figura 18). Às vezes, diferenciá-los de hematomas pode ser difícil na RM.1,7,25
FIGURA 18: T2 coronal mostrando volumosa massa exofítica heterogênea protruindo da face fetal da placenta próximo à inserção do cordão umbilical (seta). // Fonte: Adaptada de Jha e colaboradores (2020).25
Na RM, os corioangiomas geralmente são massas arredondadas, bem circunscritas, isointensas à placenta nas imagens ponderadas em T1, heterogêneas e principalmente hiperintensas à placenta nas imagens em T2. A hiperintensidade em T1 intrínseca pode se desenvolver na periferia do tumor relacionada à hemorragia. Um dos pontos críticos na avaliação é procurar vasos proeminentes ao longo da superfície fetal da massa em razão do potencial de efeitos hemodinâmicos perigosos no feto.1,7,25
Teratoma placentário
O teratoma placentário é o segundo tumor benigno mais comum; no entanto, é raro, com evolução muito favorável. Suas massas incluem componentes de todas as três linhagens de células germinativas e sempre se situam entre o âmnio e o córion, geralmente na superfície fetal da placenta. Os achados na RM incluem demonstração de tecidos de intensidades de sinal demonstrando gordura intratumoral, calcificações e fluidos.25
Cistos
Os cistos são geralmente pequenos e incidentais. Ocorrem na superfície fetal da placenta, perto da inserção do cordão umbilical (Figura 19A e B). Eles seguem o sinal de fluido na RM e não demonstram realce.28
FIGURA 19: T2 coronal HASTE (A) e T1 axial (B) de paciente de 33 anos. Observa-se formação cística com conteúdo de alto sinal em T1 (hemático e/ou alto teor proteico) junto à inserção do cordão umbilical na placenta. // Fonte: Arquivo de imagens das autoras.
Metástases
As metástases para a placenta são muito raras, acreditando-se que ocorram por disseminação hematogênica com deposição no espaço interviloso da placenta. A placenta pode obter metástases de tumores primários maternos, sendo o melanoma a neoplasia maligna primária mais comum a metastizar para a placenta, e outras menos frequentes, como neoplasias pulmonares, mamárias, gástricas e ginecológicas. Metástase de malignidade fetal, como neuroblastoma, também pode ocorrer.23,25,28
Retenção de produtos da concepção
A retenção de produtos da concepção (RPCO) é a persistência de tecido placentário e/ou fetal no útero, podendo ocorrer após o parto, interrupção da gestação (médica), aborto espontâneo e DEPA. Essa condição geralmente ocorre após o segundo trimestre (40%). Na RM, a RPCO apresenta-se como massas com sinal heterogêneo em T1 e T2 relacionados aos graus variáveis de hemorragia e necrose, com graus variáveis de realce. Essa aparência, às vezes, é indistinguível da DTG. No entanto, os níveis de B-HCG estão levemente elevados ou normais em RPCO.1,28
Outras lesões hipervasculares, especialmente a vascularização miometrial aumentada (EMV) — de enhanced myometrial vascularity —, também podem ser confundidas com RPCO. EMV é a terminologia recente para malformação arteriovenosa (MAV) uterina adquirida, condição rara, porém mais comum que MAV congênita. É caracterizada por formação de múltiplas comunicações arteriovenosas dentro do útero sem uma rede capilar, podendo ocorrer após gestações múltiplas, aborto espontâneo, cirurgia uterina anterior, cesariana, subinvolução do leito placentário, dilatação e curetagem, infecção, malignidades ginecológicas, doença trofoblástica gestacional, exposição ao dietilestilboestrol. Pode estar ou não associada a RPCO (mais frequentemente associada).1,28
Embora as massas nem sempre estejam presentes, uma das pistas de diferenciação é que o epicentro da massa vascular realçada está no endométrio em casos de RPCO (Figura 20A e B), enquanto, na EMV, está localizado dentro do miométrio (Figura 20C e D). O diagnóstico final geralmente é confirmado por angiografia, podendo ser por RM, com vasos serpiginosos com realce, e, algumas vezes, áreas de artefatos de suscetibilidade. É crucial excluir a possibilidade de EMV antes de se tentarem dilatação e curetagem para evitar sangramento com risco de vida.1,28
FIGURA 20: T2 sagital HASTE (A) e T1 sagital pós-contraste (B) de paciente de 36 anos, com história de curetagem pós-aborto. Observa-se formação irregular e lobulada na cavidade uterina, com intenso realce precoce ao gadolínio, sem evidência de washout, compatível com RPCO. Não há sinais de extensão ou infiltração miometrial. T2 axial HASTE (C) e T1 axial pré-contraste (D) de outra paciente, de 31 anos, com sangramento pós-abortamento, apresentando estruturas serpiginosas relacionadas a flow voids no miométrio da parede uterina anterior (setas), com conteúdo hemático no interior da cavidade uterina, sem formação sólida associada, sugestivas de EMV. // Fonte: Arquivo de imagens das autoras.
Hematoma placentário e descolamento prematuro da placenta
A placa coriônica refere-se ao lado fetal da placenta, e a placa basal refere-se ao lado materno da placenta. Com base nisso, os hematomas placentários podem ser classificados em quatros tipos (Figura 21A–D):26
- retroplacentário — abrange 43% dos casos, está localizado atrás da placa basal e geralmente resulta da ruptura de pequenas arteríolas deciduais; o tamanho do hematoma retroplacentário correlaciona-se com o prognóstico fetal;7,18
- subcoriônico — abarca 57% dos casos e está localizado perifericamente atrás da placa basal, elevando a borda placentária e estendendo-se atrás do córion, geralmente por ruptura de veias uteroplacentárias (Figura 22);7,18
- pré-placentário (subamniótico) — é menos comum, está localizado atrás do âmnio, acima da placa coriônica, e geralmente é limitado pelo cordão umbilical;18
- intraplacentário — é caracterizado por sangramento no espaço interviloso da placenta; essa condição incomum pode ocorrer primária ou secundariamente a grande hematoma retroplacentário que se dispersa pelos espaços intervilosos; o hematoma intraplacentário acarreta um risco maior de resultados maternos e fetais adversos do que o hematoma retroplacentário.18
FIGURA 21: Esquema representando os hematomas placentários. O retroplacentário (A) está localizado atrás da placa basal e eleva a placenta do miométrio subjacente. O hematoma subcoriônico marginal (B) está localizado perifericamente atrás da margem placentária e estende-se atrás do córion (linha marrom). O hematoma pré-placentário (C) está localizado anteriormente à placenta, acima da placa coriônica, atrás do âmnio (linha azul). O hematoma intraplacentário (D) é indicativo de sangramento dentro da placenta. // Fonte: Arquivo de imagens das autoras.
FIGURA 22: T1 axial com saturação de gordura de paciente de 25 anos, com gestação gemelar dicoriônica diamniótica, mostrando fina lâmina hiperintensa em T1 (setas) compatível com hematoma subcoriônico. // Fonte: Arquivo de imagens das autoras.
Hematomas subcoriônicos que ocorrem no primeiro trimestre separam o córion da decídua. São um achado incidental frequente, com incidência de até 22%. A resolução espontânea da hemorragia subcoriônica até o final do segundo trimestre ocorre em aproximadamente 70% dos casos.18
O manejo do hematoma subcoriônico é sempre expectante e está associado a risco aumentado de aborto espontâneo, descolamento prematura da placenta (DPP) e parto prematuro. Alguns hematomas persistem durante toda a gestação e estão associados a desfechos ruins.18
O termo descolamento prematuro da placenta (DPP) é usado para se referir ao descolamento parcial ou completo da placenta do miométrio subjacente antes do tempo esperado para o parto. A maioria dos artigos na literatura não especifica em quais semanas de gestação o termo deve ser usado; no entanto, alguns trabalhos usaram o termo específico quando essa separação ocorre após a 20ª semana de gestação. O DPP complica 0,4 a 1% das gestações, sendo a maior incidência relatada entre 24 e 26 semanas, com queda da incidência com o avanço da idade gestacional.18
Os fatores de risco para DPP incluem:18
- tabagismo;
- multiparidade;
- trombofilia;
- hipertensão crônica e gestacional;
- ruptura prematura de membranas;
- história prévia de DPP;
- fertilização in vitro;
- consumo de álcool e uso de drogas (como cocaína);
- tabagismo;
- hipertensão materna.
O DPP está associado ao aumento da morbidade e da mortalidade materna, fetal e neonatal.18
A RM pode retratar, com precisão, a hemorragia relacionada à placenta com alta sensibilidade e alta especificidade e ajuda a determinar a idade dos produtos sanguíneos com base nas características do sinal da hemoglobina. Hematomas placentários subagudos, agudos ou precoces são considerados hematomas instáveis com maior risco de progressão rápida ou ressangramento, o que pode exigir mudança no manejo.18
Tipicamente, os hematomas placentários agudos são hipointensos em T2 e hiperintensos em T1. DWI mostrando difusão restrita e artefato de suscetibilidade em imagens de eco de gradiente T1 são úteis para a detecção de hematoma.18
Insuficiência placentária
A aparência geral da placenta pode variar, e patologias vasculares da placenta podem ser suspeitadas por análise morfológica. Os valores de T2 e T2* são menores nos casos de insuficiência placentária, conferindo à placenta um aspecto mais escuro, com maior heterogeneidade, possivelmente em decorrência de áreas de infarto e fibrose. A placenta também é menor na restrição de crescimento intrauterino em comparação com fetos com crescimento normal e tem uma aparência globular espessa.30
Em razão da ausência de informações de segurança adequadas em fetos humanos, a injeção de gadolínio permanece controversa e atualmente não é recomendada na RM fetal ou placentária de rotina para explorar a vascularização.30
Caso o contraste à base de gadolínio seja administrado, as áreas apresentam hiporrealce em comparação com o tecido placentário viável adjacente.23
No que se refere ao crescimento fetal e aos resultados da gestação, técnicas funcionais estão sendo desenvolvidas para obter uma melhor compreensão e aprofundar a exploração dessa fisiologia, com exemplo notável sendo as sequências arterial spin labelling (ASL) ou blood oxygenation level dependent (BOLD).30
ATIVIDADES
1. Quais são as principais indicações do estudo de RM da placenta?
Confira aqui a resposta
As principais indicações do estudo de RM da placenta incluem casos em que a USG é inconclusiva, pacientes com alto risco clínico para acretismo placentário ou quando a avaliação da placenta é limitada (localizada posteriormente). A RM também pode ser feita nos casos em que a USG já fez um diagnóstico definitivo para planejar o parto cesáreo e a histerectomia periparto.
Resposta correta.
As principais indicações do estudo de RM da placenta incluem casos em que a USG é inconclusiva, pacientes com alto risco clínico para acretismo placentário ou quando a avaliação da placenta é limitada (localizada posteriormente). A RM também pode ser feita nos casos em que a USG já fez um diagnóstico definitivo para planejar o parto cesáreo e a histerectomia periparto.
As principais indicações do estudo de RM da placenta incluem casos em que a USG é inconclusiva, pacientes com alto risco clínico para acretismo placentário ou quando a avaliação da placenta é limitada (localizada posteriormente). A RM também pode ser feita nos casos em que a USG já fez um diagnóstico definitivo para planejar o parto cesáreo e a histerectomia periparto.
2. Sobre as gestações gemelares, assinale a alternativa correta.
A) O sinal do T refere-se a gestações dicoriônicas e diamnióticas.
B) O sinal do lambda refere-se a gestações dicoriônicas e monoamnióticas.
C) O sinal do T refere-se a gestações monocoriônicas e diamnióticas.
D) O sinal do lambda refere-se a gestações monocoriônicas e monoamnióticas.
Confira aqui a resposta
Resposta incorreta. A alternativa correta é a "C".
O sinal do lambda está relacionado à projeção triangular do tecido placentário ao longo da membrana intergêmea e é geralmente observado em gestações dicoriônicas e diamnióticas. Já o sinal do T apresenta uma interseção de 90º da placenta única com a membrana intergêmea, vista em uma gestação monocoriônica e diamniótica.
Resposta correta.
O sinal do lambda está relacionado à projeção triangular do tecido placentário ao longo da membrana intergêmea e é geralmente observado em gestações dicoriônicas e diamnióticas. Já o sinal do T apresenta uma interseção de 90º da placenta única com a membrana intergêmea, vista em uma gestação monocoriônica e diamniótica.
A alternativa correta é a "C".
O sinal do lambda está relacionado à projeção triangular do tecido placentário ao longo da membrana intergêmea e é geralmente observado em gestações dicoriônicas e diamnióticas. Já o sinal do T apresenta uma interseção de 90º da placenta única com a membrana intergêmea, vista em uma gestação monocoriônica e diamniótica.
3. Quanto ao maior fator de risco para DEPA, assinale a alternativa correta.
A) Cesariana prévia.
B) PP.
C) Técnicas de reprodução assistida.
D) Multiparidade.
Confira aqui a resposta
Resposta incorreta. A alternativa correta é a "A".
O principal fator de risco para DEPA é a cesariana prévia. Outros fatores de risco incluem PP, técnicas de reprodução assistida, procedimento uterino prévio (miomectomia), idade materna avançada, multiparidade, endometrite pós-parto, histeroscopia e síndrome de Asherman.
Resposta correta.
O principal fator de risco para DEPA é a cesariana prévia. Outros fatores de risco incluem PP, técnicas de reprodução assistida, procedimento uterino prévio (miomectomia), idade materna avançada, multiparidade, endometrite pós-parto, histeroscopia e síndrome de Asherman.
A alternativa correta é a "A".
O principal fator de risco para DEPA é a cesariana prévia. Outros fatores de risco incluem PP, técnicas de reprodução assistida, procedimento uterino prévio (miomectomia), idade materna avançada, multiparidade, endometrite pós-parto, histeroscopia e síndrome de Asherman.
4. Quanto ao momento ideal para a realização da RM da placenta para avaliação de DEPA, assinale a alternativa correta.
A) Entre 12 e 15 semanas.
B) Entre 20 e 26 semanas.
C) Entre 28 e 32 semanas.
D) Entre 32 e 36 semanas.
Confira aqui a resposta
Resposta incorreta. A alternativa correta é a "C".
O momento ideal para rastreio ecográfico é entre 20 e 24 semanas de gestação, sendo o método mais acessível, com boa sensibilidade e moderada acurácia. A RM é um método complementar indicado na investigação diagnóstica quando a avaliação ultrassonográfica é duvidosa, para pacientes com fatores de risco clínico para DEPA ou quando a placenta está localizada posteriormente, sendo o período ideal para avaliação por esse método entre 28 e 32 semanas.
Resposta correta.
O momento ideal para rastreio ecográfico é entre 20 e 24 semanas de gestação, sendo o método mais acessível, com boa sensibilidade e moderada acurácia. A RM é um método complementar indicado na investigação diagnóstica quando a avaliação ultrassonográfica é duvidosa, para pacientes com fatores de risco clínico para DEPA ou quando a placenta está localizada posteriormente, sendo o período ideal para avaliação por esse método entre 28 e 32 semanas.
A alternativa correta é a "C".
O momento ideal para rastreio ecográfico é entre 20 e 24 semanas de gestação, sendo o método mais acessível, com boa sensibilidade e moderada acurácia. A RM é um método complementar indicado na investigação diagnóstica quando a avaliação ultrassonográfica é duvidosa, para pacientes com fatores de risco clínico para DEPA ou quando a placenta está localizada posteriormente, sendo o período ideal para avaliação por esse método entre 28 e 32 semanas.
5. Quanto aos hematomas placentários, correlacione a primeira e a segunda colunas.
1 Retroplacentário 2 Subcoriônico 3 Pré-placentário 4 Intraplacentário |
É menos comum, está localizado atrás do âmnio (subamniótico), acima da placa coriônica, e geralmente é limitado pelo cordão umbilical. É mais comum, está localizado perifericamente atrás da placa basal, elevando a borda placentária e estendendo-se atrás do córion. É caracterizado por sangramento no espaço interviloso da placenta, podendo ser primário ou secundário. É o segundo mais comum, localizado atrás da placa basal. |
Assinale a alternativa que apresenta a sequência correta.
A) 4 — 1 — 2 — 3
B) 1 — 4 — 3 — 2
C) 2 — 3 — 1 — 4
D) 3 — 2 — 4 — 1
Confira aqui a resposta
Resposta incorreta. A alternativa correta é a "D".
A RM apresenta alta sensibilidade e alta especificidade para hematomas placentários e ajuda a determinar a idade dos produtos sanguíneos com base nas características do sinal da hemoglobina. Hematomas placentários subagudos, agudos ou precoces são considerados hematomas instáveis com maior risco de progressão rápida ou ressangramento e são tipicamente hipointensos em T2 e hiperintensos em T1.
Resposta correta.
A RM apresenta alta sensibilidade e alta especificidade para hematomas placentários e ajuda a determinar a idade dos produtos sanguíneos com base nas características do sinal da hemoglobina. Hematomas placentários subagudos, agudos ou precoces são considerados hematomas instáveis com maior risco de progressão rápida ou ressangramento e são tipicamente hipointensos em T2 e hiperintensos em T1.
A alternativa correta é a "D".
A RM apresenta alta sensibilidade e alta especificidade para hematomas placentários e ajuda a determinar a idade dos produtos sanguíneos com base nas características do sinal da hemoglobina. Hematomas placentários subagudos, agudos ou precoces são considerados hematomas instáveis com maior risco de progressão rápida ou ressangramento e são tipicamente hipointensos em T2 e hiperintensos em T1.
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Paciente de 34 anos, com 35 semanas de gestação, realizou RM por suspeita de acretismo placentário (Figura 24A e B).
FIGURA 23: A e B) RM de paciente de 34 anos, com 35 semanas de gestação. // Fonte: Arquivo de imagens das autoras.
ATIVIDADES
6. Descreva os principais achados de imagem e o provável diagnóstico do caso clínico.
Confira aqui a resposta
A RM da paciente do caso clínico mostra:
- PP completa, com seu maior componente na parede anterior;
- placenta de espessura irregular e contornos lobulados, com áreas de redução da espessura miometrial e perda da interface miométrio–placenta;
- intensidade difusamente heterogênea em T2 com estruturas vasculares proeminentes e bandas hipointensas em T2, mais evidentes junto à parede anterolateral esquerda do terço inferior do corpo uterino e próximas à região cervical;
- indefinição parcial do colo uterino, especialmente na sua porção anterior.
Esses achados sugerem DEPA, com comprometimento miometrial. Destaca-se lobulação do contorno externo uterino na parede anteroinferior do corpo e adjacente à parede superior da bexiga urinária, com indefinição do miométrio, sem evidência de lesão intraluminal vesical, sugerindo focos de percretismo (placenta mioinvasiva).
Resposta correta.
A RM da paciente do caso clínico mostra:
- PP completa, com seu maior componente na parede anterior;
- placenta de espessura irregular e contornos lobulados, com áreas de redução da espessura miometrial e perda da interface miométrio–placenta;
- intensidade difusamente heterogênea em T2 com estruturas vasculares proeminentes e bandas hipointensas em T2, mais evidentes junto à parede anterolateral esquerda do terço inferior do corpo uterino e próximas à região cervical;
- indefinição parcial do colo uterino, especialmente na sua porção anterior.
Esses achados sugerem DEPA, com comprometimento miometrial. Destaca-se lobulação do contorno externo uterino na parede anteroinferior do corpo e adjacente à parede superior da bexiga urinária, com indefinição do miométrio, sem evidência de lesão intraluminal vesical, sugerindo focos de percretismo (placenta mioinvasiva).
A RM da paciente do caso clínico mostra:
- PP completa, com seu maior componente na parede anterior;
- placenta de espessura irregular e contornos lobulados, com áreas de redução da espessura miometrial e perda da interface miométrio–placenta;
- intensidade difusamente heterogênea em T2 com estruturas vasculares proeminentes e bandas hipointensas em T2, mais evidentes junto à parede anterolateral esquerda do terço inferior do corpo uterino e próximas à região cervical;
- indefinição parcial do colo uterino, especialmente na sua porção anterior.
Esses achados sugerem DEPA, com comprometimento miometrial. Destaca-se lobulação do contorno externo uterino na parede anteroinferior do corpo e adjacente à parede superior da bexiga urinária, com indefinição do miométrio, sem evidência de lesão intraluminal vesical, sugerindo focos de percretismo (placenta mioinvasiva).
Conclusão
A RM da placenta está sendo utilizada com frequência cada vez maior e pode acrescentar informações importantes à USG. A RM permite avaliar detalhadamente tanto a placenta e o útero gravídico quanto a anatomia pélvica materna. Os radiologistas devem estar cientes do espectro de variantes normais da placenta, bem como das condições benignas e com risco de vida que afetam a placenta e o útero gravídico para otimizar o atendimento ao paciente e minimizar as complicações perinatais fetais e maternas.
Atividades: Respostas
RESPOSTA: As principais indicações do estudo de RM da placenta incluem casos em que a USG é inconclusiva, pacientes com alto risco clínico para acretismo placentário ou quando a avaliação da placenta é limitada (localizada posteriormente). A RM também pode ser feita nos casos em que a USG já fez um diagnóstico definitivo para planejar o parto cesáreo e a histerectomia periparto.
Comentário: O sinal do lambda está relacionado à projeção triangular do tecido placentário ao longo da membrana intergêmea e é geralmente observado em gestações dicoriônicas e diamnióticas. Já o sinal do T apresenta uma interseção de 90º da placenta única com a membrana intergêmea, vista em uma gestação monocoriônica e diamniótica.
Comentário: O principal fator de risco para DEPA é a cesariana prévia. Outros fatores de risco incluem PP, técnicas de reprodução assistida, procedimento uterino prévio (miomectomia), idade materna avançada, multiparidade, endometrite pós-parto, histeroscopia e síndrome de Asherman.
Comentário: O momento ideal para rastreio ecográfico é entre 20 e 24 semanas de gestação, sendo o método mais acessível, com boa sensibilidade e moderada acurácia. A RM é um método complementar indicado na investigação diagnóstica quando a avaliação ultrassonográfica é duvidosa, para pacientes com fatores de risco clínico para DEPA ou quando a placenta está localizada posteriormente, sendo o período ideal para avaliação por esse método entre 28 e 32 semanas.
Comentário: A RM apresenta alta sensibilidade e alta especificidade para hematomas placentários e ajuda a determinar a idade dos produtos sanguíneos com base nas características do sinal da hemoglobina. Hematomas placentários subagudos, agudos ou precoces são considerados hematomas instáveis com maior risco de progressão rápida ou ressangramento e são tipicamente hipointensos em T2 e hiperintensos em T1.
RESPOSTA: A RM da paciente do caso clínico mostra:
- PP completa, com seu maior componente na parede anterior;
- placenta de espessura irregular e contornos lobulados, com áreas de redução da espessura miometrial e perda da interface miométrio–placenta;
- intensidade difusamente heterogênea em T2 com estruturas vasculares proeminentes e bandas hipointensas em T2, mais evidentes junto à parede anterolateral esquerda do terço inferior do corpo uterino e próximas à região cervical;
- indefinição parcial do colo uterino, especialmente na sua porção anterior.
Esses achados sugerem DEPA, com comprometimento miometrial. Destaca-se lobulação do contorno externo uterino na parede anteroinferior do corpo e adjacente à parede superior da bexiga urinária, com indefinição do miométrio, sem evidência de lesão intraluminal vesical, sugerindo focos de percretismo (placenta mioinvasiva).
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AUTORAS
NATÁLIA HENZ CONCATTO // Residência Médica em Radiologia e Diagnóstico por Imagem pelo Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA). Mestre em Radiologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Doutoranda em Ginecologia e Obstetrícia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Médica radiologista abdominal e coordenadora do Núcleo de Radiologia de Emergência do Hospital Moinhos de Vento/RS.
CAMILA BRAGA VISCONTI // Graduação em Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Residência Médica em Radiologia e Diagnóstico por Imagem pelo Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA). Médica radiologista abdominal do Hospital Moinhos de Vento/RS.
Como citar a versão impressa deste documento
Concatto NH, Visconti CB. Ressonância magnética da placenta. In: Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem; Morita TO, Pedrollo IM, organizadores. PRORAD Programa de Atualização em Radiologia e Diagnóstico por Imagem: Ciclo 13. Porto Alegre: Artmed Panamericana; 2023. p. 125–56. (Sistema de Educação Continuada a Distância, v. 2). https://doi.org/10.5935/978-85-514-1206-0.C0004