Objetivos
Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de
- reconhecer a perspectiva histórica do desenvolvimento da terapia focada em esquemas (TE);
- identificar quais são os esquemas iniciais desadaptativos e como eles se formam;
- definir quais são as necessidades emocionais básicas;
- reconhecer os estilos de enfrentamento desadaptativos;
- identificar o conceito de modos esquemáticos;
- refletir sobre a aplicabilidade da TE em pacientes graves hospitalizados;
- orientar a equipe hospitalar sobre os principais pressupostos teóricos da TE.
Esquema conceitual
Introdução
Os hospitais psiquiátricos no Brasil já foram cenários de condições sub-humanas de tratamento, como uso de sedação excessiva, falta de diagnóstico claro, internações por anos sem perspectiva de alta e atitudes punitivas e invalidantes por parte da equipe de cuidado.1,2
Considerando esse contexto, a Lei nº 10.216/2001 foi um marco histórico na política de saúde mental e determinou que a pessoa com transtorno psiquiátrico deve ter um cuidado que garanta a ela, entre outros, os seguintes direitos:3
- ter acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, consentâneo às suas necessidades;
- ser tratada com humanidade e respeito, e no interesse exclusivo de beneficiar sua saúde, com o intuito de alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e na comunidade;
- ser protegida contra qualquer forma de abuso e de exploração;
- receber o maior número de informações a respeito de sua doença e de seu tratamento;
- ser tratada em ambiente terapêutico pelos meios menos invasivos possíveis;
- ser tratada, de preferência, em serviços comunitários de saúde mental.
Com isso, houve fortalecimento da luta antimanicomial, com estímulo ao tratamento centrado na pessoa e na reinserção na sociedade. Assim, procurava-se nunca mais repetir cenários hospitalares como os descritos no livro Holocausto Brasileiro.1
Uma das indicações mais dramáticas de tratamento em regime hospitalar é o comportamento agressivo contra si ou contra terceiros, necessitando frequentemente de tranquilização rápida (contenção física e medicação intramuscular). Tal comportamento não é causado somente por transtornos psicóticos primários. Assim, é possível ter várias outras causas, concomitantes ou não, como traços de personalidade, causas orgânicas, intoxicações etc.4
Quando a causa é devida a traços de personalidade, enquanto a medicação ajuda a controlar a agressividade e a agitação, esquemas iniciais desadaptativos podem perpetuar padrões inflexíveis de funcionamento, gerando contratransferência negativa e rejeição em equipes pouco instrumentalizadas, com abordagens não farmacológicas. Tais equipes podem se guiar pela punição e pela hostilidade, por não entenderem as necessidades emocionais por trás dos comportamentos disfuncionais, retraumatizando o paciente e reforçando suas estratégias de enfrentamento desadaptativas.5,6
Na literatura, os estudos sobre TE em internação psiquiátrica estão concentrados em pacientes antissociais de hospitais forenses e pacientes com transtorno da personalidade borderline em grupoterapia.7–13
Neste capítulo, será apresentada uma breve revisão da TE em sua perspectiva histórica e conceitos teóricos principais, assim como o relato de sua aplicação em um paciente com transtorno bipolar, internado por longo período, em que a abordagem foi útil tanto para a evolução do paciente como para o manejo da contratransferência gerada na equipe de saúde.