- Introdução
A inserção de cateteres intravasculares é um dos procedimentos cirúrgicos mais comumente realizados na prática médica. Mais de 5 milhões de acessos centrais são feitos mundialmente a cada ano,1 e metade dos pacientes internados em unidade de terapia intensiva (UTI) necessitarão de cateter venoso central (CVCcateter venoso central).2 Existem recomendações em guidelines de várias sociedades médicas referendando o uso da ultrassonografia (USGultrassonografia ) para punções vasculares.
A punção venosa central às cegas a partir de referências anatômicas, apesar de consagrada pelo tempo, deve cada vez mais se tornar uma técnica de exclusão, sendo utilizada apenas nos casos de indisponibilidade do aparelho de USGultrassonografia ,3 pois o estudo da sonoanatomia do paciente permite individualizar a técnica de punção e se preparar para situações adversas, evitando complicações e aumentando a taxa de sucesso.4–6
O conhecimento das propriedades básicas da USGultrassonografia é fundamental para otimização da técnica e prevenção de más interpretações de imagens geradas, que podem, inclusive, levar a complicações.
As veias centrais mais comumente puncionadas são a veia jugular interna (VJIveia jugular interna), a veia subclávia (VSCveia subclávia)/axilar e a veia femoral (VFveia femoral). Cada técnica oferece vantagens e desvantagens; porém, em todos os casos, a utilização da USGultrassonografia para guiar punção tanto de artérias quanto de veias é respaldada por evidências científicas. A USGultrassonografia permite, ainda, o diagnóstico precoce de complicações, como pneumotórax e punções arteriais inadvertidas.
Garantir uma abordagem segura e efetiva na inserção de acessos vasculares deve ser uma prioridade para todos os profissionais.3 Em 2016, o consenso britânico e irlandês definiu as recomendações para a inserção segura de dispositivos vasculares. Dentre as oito recomendações, três dizem respeito ao uso da USGultrassonografia , a saber:3
- deve ser adotada na rotina para inserção de CVCcateter venoso central em VJIveia jugular interna (o grupo de trabalho recomenda o uso da USGultrassonografia para todos os outros locais de punção, mas reconhecem que as evidências são limitadas);
- o conhecimento das técnicas de punção venosa guiadas por referências anatômicas é útil para as raras ocasiões em que a USGultrassonografia não está disponível ou não pode ser utilizada;
- seu uso deve ser considerado precocemente se a canulação venosa periférica ou arterial se mostra difícil,3 uma vez que a USGultrassonografia torna várias etapas da punção mais seguras (como avaliação do sítio de punção, não utilização de agulha exploradora, verificação do guia e do cateter no vaso, informações sobre a posição da ponta do cateter e reconhecimento de complicações).
A canulação vascular guiada por USGultrassonografia tem demonstrado vários benefícios em relação à técnica com base em marcos anatômicos, como maior taxa de sucesso na primeira tentativa, redução do número de tentativas e maior satisfação do paciente.4–10
Na metanálise de Wu e colaboradores, demonstrou-se uma redução no risco de falha de punção (risco relativo [RR] 0,18; intervalo de confiança [IC] 95% 0,10 a 0,32), de punção arterial (RR 0,25; IC 95% 0,15 a 0,42), de hematoma (RR 0,30; IC 95% 0,19 a 0,46), de pneumotórax (RR 0,21; IC 95% 0,06 a 0,73) e de hemotórax (RR 0,10; IC 95% 0,02 a 0,54).4
Assim, são enormes os benefícios da utilização da USGultrassonografia nas punções vasculares, e a sua não utilização já pode ser considerada má prática.
- Objetivos
Ao final da leitura deste artigo, o leitor será capaz de
- descrever os benefícios e as vantagens das técnicas de punção vascular guiadas por USGultrassonografia e suas evidências científicas;
- definir os aspectos de USGultrassonografia relacionados às técnicas de punção vascular guiadas por imagem ultrassonográfica;
- reconhecer as técnicas de punção vascular guiadas por USGultrassonografia — punção arterial, venosa central e periférica;
- identificar as técnicas ultrassonográficas de confirmação de posicionamento de cateter e de diagnóstico de complicações de punção vascular.
- Esquema conceitual