Objetivos
Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de
- reconhecer a utilidade da equação de movimento na monitoração da mecânica ventilatória;
- identificar a importância da pressão de platô (Pplatô) e da pressão elástica (Pel) na monitoração da mecânica ventilatória;
- definir complacência e elastância do sistema respiratório;
- calcular a resistência das vias aéreas (Raw) e a pressão positiva expiratória final intrínseca (PEEPi) — intrinsic positive end-expiratory pressure;
- identificar a ocorrência de vazamento.
Esquema conceitual
Introdução
Desde a epidemia de poliomielite na década de 1950, a ventilação mecânica (VM) passou a ser uma ferramenta amplamente utilizada em unidades de terapia intensiva (UTI), sendo imprescindível em muitas situações clínicas.1–5
Embora a VM seja um recurso capaz de salvar vidas, sua aplicação deve ser criteriosa, pois determina mudanças significativas na mecânica do sistema respiratório, com risco significativo de eventos adversos secundários.1–5
Entre as complicações possíveis, destaca-se a lesão induzida pela ventilação mecânica (VILI) — ventilator-induced lung injury —, que pode decorrer de diversos mecanismos, como barotrauma, volutrauma, atelectrauma, biotrauma e ergotrauma, levando a:1–5
- piora da função pulmonar;
- agravamento da hipoxemia;
- disfunções orgânicas de outros órgãos e sistemas;
- aumento da mortalidade.
Adotar uma estratégia que, ao mesmo tempo que otimize as trocas gasosas, reduza a VILI é objetivo primordial no manejo da VM.1–5
A monitoração da mecânica ventilatória é um aspecto fundamental. A mecânica é o ramo da física que estuda o movimento, as variações de energia e as forças que atuam sobre um corpo, um objeto ou um sistema.3 A mecânica ventilatória refere-se à avaliação da função pulmonar por meio de medidas de pressão e volume. A partir dessas medidas, diversos índices podem ser derivados, como complacência e resistência do sistema respiratório e trabalho respiratório.3,5–7
Atualmente, ferramentas para monitoração da mecânica ventilatória estão amplamente disponíveis nos ventiladores mecânicos modernos com o uso de sensores de pressão e fluxo diretamente acoplados aos aparelhos, fornecendo medidas de fluxo, volume e pressão na via aérea proximal, com a disponibilização gráfica de curvas volume–tempo, fluxo–tempo e pressão–tempo.3,6–9 Além das curvas que analisam as variáveis ventilatórias ao longo do tempo, os ventiladores mecânicos modernos disponibilizam curvas em alça que correlacionam o fluxo ao volume (curva fluxo–volume) e a pressão ao volume (curva pressão–volume).5–8
Ademais, as manobras de pausa inspiratória e de pausa expiratória são de simples execução e permitem inferir as pressões às quais estão submetidos os alvéolos pulmonares ao final da inspiração e da expiração, com a mensuração da Pplatô e da PEEPi ou autoPEEP. Essas medidas possibilitam o cálculo da Raw e da complacência estática (Cst) do sistema respiratório a partir da Pplatô, bem como a identificação de hiperinsuflação pulmonar a partir da autoPEEP.3–8,10
A monitoração da mecânica ventilatória é essencial para otimizar o uso da VM e minimizar seus riscos, sendo, portanto, obrigatória em todo paciente que esteja sob VM. Deve ainda ser salientado que não basta mensurar os parâmetros, mas também é preciso adotar uma atitude proativa a partir dos dados obtidos com o objetivo de:1,5–7
- compreender a condição clínica do paciente relacionada à mecânica ventilatória e sua evolução;
- auxiliar no diagnóstico diferencial;
- ajustar os parâmetros no ventilador mecânico de forma individualizada, conforme as mudanças na condição clínica do paciente;
- guiar e avaliar, de forma sequencial, as medidas terapêuticas instituídas;
- evitar complicações relacionadas à VM, como a VILI;
- auxiliar no desmame da VM.