Objetivos
Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de
- resumir as demandas clínicas da unidade de terapia intensiva (UTI) que desencadeiam situações de agitação psicomotora;
- descrever a necessidade, conforme as recomendações, de contenção mecânica para pacientes agitados;
- explicar os cuidados de enfermagem associados à agitação psicomotora e à contenção mecânica;
- compreender o contexto da saúde mental no entorno da agitação psicomotora e da contenção mecânica na UTI;
- subsidiar educação permanente para a equipe de enfermagem sobre o manejo da agitação psicomotora e a utilização de contenção mecânica.
Esquema conceitual
Introdução
A agitação psicomotora é caracterizada por um aumento excessivo de atividades motoras ou psicológicas, percebidas principalmente por meio de sinais como tensão muscular, hiperatividade motora, impaciência, desconfiança, aumento do tom de voz com falas provocativas e ameaçadoras, logorreia e coprolalia. É classificada como uma emergência em saúde, já que não é específica de uma única condição clínica, podendo ser de causas orgânicas, psicológicas ou tóxicas.1 Algumas das condições que podem desencadear um comportamento agitado ou violento são2
- transtornos de personalidade;
- uso de substâncias psicoativas;
- síndromes de abstinência;
- intoxicações medicamentosas;
- tireotoxicose;
- infecções do sistema nervoso central (SNC);
- traumatismos cranioencefálicos (TCEs);
- acidentes vasculares cerebrais (AVCs);
- demências;
- hipoglicemia;
- hiponatremia;
- hipoxia.
Considerando essas possibilidades, é essencial a realização de investigação ampliada da causa-base do problema para que sejam evitadas percepções alteradas da realidade e períodos de agitação psicomotora ou violência.1 A avaliação e a determinação de condutas frente a um paciente agitado e agressivo exigem dos profissionais um amplo preparo de habilidades e de competências, para que elas sejam aplicadas com agilidade e assertividade, reduzindo o risco de agravamento do quadro.2
Dessa forma, quando identificados os sinais de agitação psicomotora em um paciente, iniciam-se, de imediato, as abordagens em uma ordem de intervenções. Primeiramente, é realizada uma intervenção verbal para a externalização dos pensamentos e das emoções. Caso não seja suficiente, é empregada a intervenção farmacológica não sedativa. Se ainda não for eficaz, pode ser feita uma modificação no ambiente. Como última opção, caso as anteriores falhem, é aplicada a contenção mecânica, indicada para pacientes com risco elevado de autoagressividade e heteroagressividade (agressividade com outras pessoas), porém há críticas frente a essa prática.2,3
A contenção mecânica é caracterizada pela utilização de dispositivos e equipamentos anexados ou próximos ao corpo do paciente, cujo objetivo é limitar ou impedir o deslocamento, a livre movimentação e o acesso ao próprio corpo, evitando a retirada precipitada de dispositivos invasivos, o que poderia causar lesões, e a descontinuidade da monitoração e do tratamento. Além disso, autores apontam que danos aos equipamentos também podem ocorrer, o que causa inquietação das instituições de saúde pelos possíveis aumentos de custos excedentes.4
Como exemplos de contenções mecânicas existem:4
- faixas para a contenção dos membros;
- coletes para a contenção do tórax;
- cinturões para a contenção do tronco ou da pelve;
- grades bilaterais no leito para evitar a saída ou a queda do paciente.
Historicamente, nos serviços de saúde, essas formas de contenção são utilizadas em demasia. Por isso, é possível encontrar achados na literatura que apresentam danos associados a essa prática de imobilização, como lesões de pele, pneumonia, trombose venosa profunda (TVP), estresse psicológico, diminuição das habilidades cognitivas e, até mesmo, óbito por trauma grave ou sufocamento.4
Frente aos eventos adversos oriundos dessa prática, o Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) publicou a Resolução nº 427, de maio de 2012, que normatiza os procedimentos de enfermagem no uso de contenção mecânica em pacientes com agitação psicomotora. Com essa normativa, o Cofen estabeleceu a utilização de contenções mecânicas somente em situações em que elas forem o único meio de prevenir danos ao paciente ou àqueles que estiverem próximo a ele. Ademais, recomenda que a contenção seja feita por um profissional treinado e que a cada hora seja realizado monitoramento clínico do nível de consciência, dos sinais vitais, da integridade da pele e da circulação nos locais e membros contidos do paciente.5
Considerando que a prática de imobilização é classificada como invasiva, é fundamental que seja prescrita no prontuário do paciente e registrada de forma detalhada, garantindo segurança ao profissional e ao indivíduo. Da mesma forma, sua realização deve ser de caráter excepcional, seguindo com rigor os critérios técnicos e éticos dessa conduta, com acompanhamento contínuo e interrupção da contenção assim que possível.1,4
Um estudo que estimou a prevalência de contenção mecânica no ambiente hospitalar apontou que a UTI é um dos setores onde mais se realiza essa prática, ao considerar-se os episódios de agitação dos pacientes e o risco de retirada abrupta dos dispositivos invasivos. A UTI, ambiente destinado ao acolhimento de pacientes em estado grave, porém com chances de sobrevida, é munida de tecnologias, dispositivos invasivos e regras rígidas, que requerem profissionais qualificados e com atenção especializada. Contudo, essa unidade de internação possui muitos estereótipos e, geralmente, é entendida pela população como um local de risco aumentado para a morte.4,6
Diante dos estereótipos da UTI, associados aos sintomas físicos que determinam a internação nessa unidade, podem surgir no paciente reações emocionais por causa da sua permanência no local, como medo, ansiedade, raiva, negação, humor deprimido, angústia, tristeza, dor e sofrimento, o que pode impactar claramente na sua recuperação. Ainda, a falta de independência do paciente e, muitas vezes, o quadro clínico que altera o nível de consciência não permitem que ele exteriorize seus sentimentos, propiciando o aparecimento de sintomas psiquiátricos, como alucinações, delírios e agitação.6
Para prevenir casos de confusão mental e agitação psicomotora decorrentes ou não da hospitalização, é necessário que os profissionais de terapia intensiva desenvolvam um olhar crítico e sensível sobre o estado clínico/psíquico do paciente. Assim, as necessidades biológicas e o sofrimento emocional vivenciado são atendidos, o que pode assegurar, preventivamente, uma intervenção mais rápida, com chances de evitar o uso da contenção mecânica.6