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ATENDIMENTO EM SITUAÇÕES DE INTOXICAÇÃO EXÓGENA NA TERAPIA INTENSIVA

Autores: Andréia Martins Specht, Deborah Hein Seganfredo, Flávia Feron Luiz, Rodrigo de Oliveira Teixeira, Sofia Louise Santin Barilli
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Objetivos

Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de

 

  • reconhecer dados epidemiológicos sobre intoxicação exógena no Brasil e no mundo;
  • revisar aspectos relacionados à avaliação inicial e ao tratamento de pessoas com intoxicação exógena;
  • verificar os métodos diagnósticos utilizados para estabelecer e confirmar a intoxicação exógena;
  • revisar os diferentes tipos de manejo, tratamento e cuidados de enfermagem nas diversas situações de intoxicação exógena.

Esquema conceitual

Introdução

A intoxicação acidental ou intencional por substâncias lícitas e ilícitas é uma das principais causas de morbidade e mortalidade no mundo.1,2 As taxas de intoxicação exógena entre pacientes nas emergências parecem semelhantes em diversos países.3–5 A maioria dos casos com crianças com idade inferior a 6 anos envolve ingestão não intencional, enquanto a maioria das mortes de adultos é causada por suicídio.1

A contribuição da intoxicação exógena para os casos de suicídio no mundo varia de acordo com a região. A intoxicação suicida é especialmente prevalente nos países escandinavos e no Reino Unido, e relativamente menor na maior parte da Europa Oriental e nas Américas Central e do Sul.6

Globalmente, entre as ingestões que necessitam de atendimento em serviços de saúde, as classes de substâncias mais comumente envolvidas são analgésicos (15,2%), antidepressivos (11,4%) e opioides (10,9%).4 Revisões de casos de autointoxicação no Reino Unido e na Espanha demonstraram que analgésicos, benzodiazepínicos (BZDs) e antidepressivos foram os medicamentos mais comumente encontrados.3,7 No entanto, as tendências variam em outras regiões.

Um estudo que incluiu pacientes noruegueses relatou que as substâncias mais prevalentes (além do etanol) são paracetamol, opioides e gama-hidroxibutirato (GHB).8 Outro estudo alemão sobre internações em unidades de terapia intensiva (UTIs) por intoxicação apresentou que BZDs, antidepressivos e anti-histamínicos são os medicamentos mais comumente encontrados, novamente excluindo o etanol.9

Um relatório de dados do centro de envenenamento israelense revelou que analgésicos, produtos de limpeza e antimicrobianos foram as substâncias mais frequentemente relatadas em intoxicações,10 enquanto uma revisão sobre internações em UTIs turcas por intoxicação aguda apontou que antidepressivos e analgésicos são mais comuns.11 Na África e no leste da Ásia, os pesticidas são responsáveis por mais casos de intoxicação do que medicamentos.12,13

Em relação ao Brasil, os dados epidemiológicos demonstram que anualmente cerca de 1,5 a 3% da população é afetada por intoxicação exógena.14 No País, ocorrem cerca de 4,8 milhões de casos a cada ano, e aproximadamente 0,1 a 0,4% das intoxicações resultam em óbito. Entre 2011 e 2016, o uso de medicamentos foi apontado como um dos principais meios de intoxicação em casos de suicídio no Brasil, correspondendo a um total de 17,7% dos óbitos por esse método.15

A maioria dos estudos indica que a predominância das lesões autoprovocadas acontecem no sexo feminino, em jovens com até 29 anos. Demais dados científicos sobre o comportamento suicida apontam o sexo feminino como o mais vulnerável a esse risco, sobretudo com exposições agudas por via digestiva.16–18

O registro das intoxicações no País pode ser visualizado no Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas (Sinitox) da Fiocruz. Acredita-se que possivelmente a incidência verdadeira seja desconhecida, por causa do subdiagnóstico e dos casos não notificados.19

Os medicamentos lideram as estatísticas dos tipos de agentes mais envolvidos nas intoxicações exógenas, e os mais frequentes são fenobarbital, diazepam e haloperidol; por grupos, são os BZDs, os antidepressivos tricíclicos (ADTs) e os antipsicóticos. Em seguida, aparecem os produtos utilizados para limpeza doméstica (alvejantes, desengordurantes e cáusticos). Em terceiro lugar, há os herbicidas e os pesticidas, seguidos pela intoxicação por produtos industriais.19

As intoxicações exógenas, bem como outros agravos de caráter compulsório, devem ser notificados ao Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), ao Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), ao Centro de Informação Toxicológica (CIT) e ao Instituto Médico Legal (IML).20

Conforme preconiza a legislação brasileira, a ocorrência de doenças e agravos deve ser registrada, e as informações devem ser disponibilizadas pelo Departamento de Informática do SUS/MS (DATASUS). Nos casos de intoxicação exógena, a notificação compulsória contribui para a comunicação e a difusão de dados entre os órgãos responsáveis pelos sistemas de informação, além de auxiliar as esferas governamentais a conhecer o problema e propor soluções.20

A maior parte dos pacientes que apresenta intoxicação exógena aguda tem evolução favorável, se tratada adequadamente. As intoxicações mais graves geralmente estão associadas à tentativa de suicídio, ao uso de substâncias ilícitas e ao uso abusivo de álcool.21

Tendo em vista que a intoxicação exógena pode produzir uma ampla gama de sintomas e achados clínicos e pode ocorrer isoladamente ou com outra patologia (por exemplo, trauma, infecção), é necessário estabelecer uma abordagem sistemática e consistente para avaliação e manejo dessa condição.22–28

A apresentação depende do agente ingerido, da ingestão (aguda ou crônica), dos medicamentos que o paciente usa continuamente ou no momento, do estado de saúde inicial do indivíduo (por exemplo, doença hepática ou renal) e se a ingestão envolve um ou mais medicamentos. O manejo inicial é focado no reconhecimento de padrões e na estabilização aguda. A história e o exame físico minuciosos são de grande importância para reconhecer como a intoxicação ocorreu e determinar seu tipo. O tratamento é direcionado para a prestação de cuidados de suporte, para a prevenção da absorção da substância, quando aplicável, e para o uso de antídotos e técnicas aprimoradas de eliminação.22–28

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