Objetivos
Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de:
- descrever o conceito dos principais métodos de tratamento top-down;
- diferenciar as intervenções top-down e bottom-up;
- explicar os principais métodos de tratamento top-down;
- identificar as evidências disponíveis dos métodos abordados.
Esquema conceitual
Introdução
Dentre as síndromes musculoesqueléticas dolorosas, a dor lombar (DL) crônica é a mais prevalente no Brasil1 e no mundo,2 sendo considerada um problema de saúde pública global,3 com grande relevância clínica, social e econômica.4,5 É a segunda maior causa de absenteísmo no trabalho e de aposentadoria por invalidez,5 e os pacientes com DL crônica estão entre os mais frequentes usuários do sistema de saúde.6
Do ponto de vista topográfico, a DL é definida como aquela dor percebida em qualquer local entre uma linha imaginária abaixo do ápice do processo espinhoso da última vértebra torácica e acima de uma linha imaginária transversal sobre a extremidade do processo espinhoso da primeira vértebra sacral, e lateralmente por linhas verticais nas bordas laterais dos eretores espinais lombares.7
A DL, como qualquer outro tipo de dor, pode ser caracterizada de três formas: nociceptiva, neuropática e nociplástica.
- Na dor nociceptiva, os nociceptores são ativados por alguma lesão tecidual ou ameaça ao tecido não neural, atribuída a um estímulo térmico, mecânico ou químico. Por exemplo, uma DL aguda causada por trauma pode ser classificada como nociceptiva.8
- A dor neuropática é a dor ocasionada por uma lesão no sistema nervoso somatossensorial, como, por exemplo, as radiculopatias envolvendo os nervos isquiático e femoral.8
- A dor nociplástica, termo sugerido por Kosek e colaboradores,9 é aquela na qual o quadro doloroso está associado a uma nocicepção alterada, apesar de não haver evidência clara de dano tecidual real ou ameaça causando a ativação de nociceptores ou evidência de doença ou lesão do sistema somatossensorial.
Acredita-se que mecanismos de sensibilização periférica e central contribuam para a perpetuação da dor nociplástica, podendo estar acompanhados de distúrbios do sono, fadiga, ansiedade e comportamento depressivo. Pacientes com DL crônica, fibromialgia e síndrome da fadiga crônica, entre outras condições, frequentemente têm essa apresentação clínica.
Com relação à origem dos sintomas, a DL pode ser classificada como específica ou inespecífica. As duas primeiras caracterizações descritas (nociceptiva e neuropática) são consideradas dores lombares específicas, pois pode-se identificar uma causa primária provável, como, por exemplo, uma radiculopatia causada pela compressão de uma raiz nervosa devido a uma hérnia discal, ou outras condições de saúde, como tumores, doença reumática, trauma ou uma fratura vertebral.4
Por outro lado, a última caracterização (nociplástica) é classificada como inespecífica, por não apresentar nenhuma causa conhecida. Ela está presente em 85% dos casos,4 pode apresentar dor difusa, sem uma localização exata, e normalmente está acompanhada por fatores psicossociais.4–6 Em razão das características multifatoriais da DL, seu tratamento envolve abordagens multimodais que visam a modular a sensação de dor por meio de diferentes mecanismos. Essa modulação pode se dar por duas vias principais:
- via descendente, proveniente das áreas corticais, subcorticais e do tronco cerebral em direção à medula espinal (modulação top-down);
- via ascendente, que ocorre por meio de estímulos inibitórios advindos da periferia em direção à medula espinal e ao cérebro (modulação bottom-up).
Pode-se dizer, portanto, que métodos de tratamento como a educação em neurociência da dor (END) e o mindfulness, também chamado de meditação de atenção plena, produzem efeitos preferencialmente top-down; já as abordagens denominadas de bottom-up, como, por exemplo, a manipulação vertebral e a acupuntura, produzem efeitos inibitórios eminentemente periféricos.