Objetivos
Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de
- identificar as características semiológicas das crises não epilépticas psicogênicas (CNEPs) — ou crises funcionais — que possam auxiliar na suspeita diagnóstica;
- reconhecer as diferentes abordagens terapêuticas e o papel do neurologista após o diagnóstico de CNEPs;
- identificar as principais comorbidades psiquiátricas que têm impacto no delineamento da melhor estratégia terapêutica e no prognóstico do paciente com CNEPs;
- discutir o diagnóstico das CNEPs e a abordagem ao paciente com crises funcionais de forma adequada quanto à comunicação e ao encaminhamento apropriado.
Esquema conceitual
Introdução
As CNEPs ou crises funcionais são episódios de alterações da consciência, experiência subjetiva, movimentos involuntários e autocontrole reduzido que podem se assemelhar a epilepsia, síncope ou a outros distúrbios paroxísticos. No entanto, em vez de serem causadas por hipersincronização neuronal (como na epilepsia) ou hipoperfusão cerebral (como na síncope convulsiva), as CNEPs resultam de disfunção neuropsiquiátrica complexa.1
A prevalência de CNEPs é de aproximadamente 1,5% a cada 100.000 habitantes por ano.2 Nos centros especializados em epilepsia, a frequência tende a aumentar e está presente em 20 a 30% dos pacientes internados. Os pacientes com CNEPs são frequentemente encaminhados para centros de epilepsia com suspeita ou diagnóstico de epilepsia farmacorresistente. Além disso, a epilepsia é a doença neurológica comórbida mais frequente nos pacientes com CNEPs, ocorrendo em aproximadamente 30% dos pacientes, o que dificulta o diagnóstico e o manejo terapêutico.3
O atraso para o diagnóstico de CNEPs varia de sete a nove anos em média. Os fatores possivelmente associados às dificuldades diagnósticas são a dificuldade de acesso ao videoeletroencefalograma (VEEG) em decorrência dos altos custos e da baixa disponibilidade em centros de saúde primários; a dificuldade de os pacientes com CNEPs aceitarem o diagnóstico e aderirem aos serviços de saúde mental após o receberem e a dificuldade dos neurologistas em diferenciar crises epilépticas (CEs) de CNEPs.4
Este capítulo visa abordar os principais aspectos do perfil demográfico, os fatores de risco, os transtornos comórbidos, a semiologia e o tratamento das CNEPs.