Introdução
No processo de envelhecer, as alterações na aparência física e no funcionamento do organismo se tornam cada vez mais notáveis e significativas conforme passam os anos. É preciso ainda considerar outras mudanças que fazem parte desse percurso, como as alterações nos padrões de comportamento, na identidade e nos papéis sociais.
Todos esses aspectos compõem a experiência do envelhecimento e lhe conferem sentido, como as mudanças — que são universais e, portanto, esperadas — como aquelas que comportam as influências sócio-histórico-culturais de determinada época e lugar e as idiossincrasias de cada sujeito.
Dessa forma, o envelhecimento, enquanto processo biológico e, portanto, universal, deve ser devidamente diferenciado do estágio mais avançado da vida humana, demarcado socialmente e nomeado como velhice, e do modo como cada indivíduo vivencia essa fase e nela é identificado como velho ou idoso.
Apesar das influências biológicas que comandam um fluxo contínuo de mudanças, o envelhecimento não segue um itinerário rígido, igual para todos os seres humanos. Assim, seus resultados podem ser diversos, a depender das experiências de vida prévias, do contexto social, cultural e econômico em que se torna idoso e do modo como cada indivíduo significa esse momento da vida e nele interage consigo mesmo e com os outros.
Romper os estereótipos relacionados à velhice é, portanto, um primeiro desafio. É preciso questionar sua visão como período de doenças, inutilidade e decadência, e a visão do idoso como ser assexuado, infantilizado e dependente, à espera da morte.
É verdade que muitas pessoas vão somando comprometimentos à medida que se tornam idosas, a ponto de se tornarem progressivamente mais subordinadas aos cuidados de outros, mas essa não é e nem precisa ser a regra.
Ao contrário, as experiências positivas de envelhecimento têm sido constantemente observadas na sociedade contemporânea, com um número crescente de idosos que mantêm suas capacidades funcionais preservadas, alimentam projetos de vida e se mostram em busca de novas experiências e sentidos para sua existência.
Nesse panorama, impulsionado pela proporção cada vez maior de indivíduos idosos em diferentes populações, importa aos diversos campos do conhecimento científico e de atuação profissional estudar a velhice e os idosos a partir de seus prismas teórico-metodológicos e oferecer suas contribuições para a criação de estratégias capazes de estimular e fomentar formas saudáveis de envelhecer, com prevenção de agravos à saúde, controle de doenças já existentes e fundamentalmente promoção da saúde.
No que diz respeito à proteção da saúde mental, são importantes o estímulo ao autocuidado, à participação social e ao exercício da cidadania, e o reforço da autonomia e da dignidade nesse momento da vida, incluindo, se for o caso, os cuidados paliativos, quando a morte se torna iminente e anuncia a realidade da finitude.
A psicologia não está alheia a esse processo. Em seu âmbito, as ações têm sido realizadas a partir de diferentes enfoques. Como afirma Neri,1 diante da emergente demanda pelo estudo da velhice e pelo atendimento a idosos, a psicologia e os psicólogos vêm sendo cada vez mais requeridos a dar respostas às diferentes e complexas questões que permeiam a realidade da população idosa, com necessidade de articulação constante entre as atividades de pesquisa e a atuação profissional.
É importante abordar aqui, mais diretamente, as contribuições da psicologia da saúde no que se refere à compreensão dos determinantes psicossociais do envelhecimento ativo e de como conhecimentos e técnicas oriundos da psicologia científica podem colaborar para a promoção e manutenção da saúde na velhice ou, por outro lado, para o controle e tratamento de enfermidades típicas dessa fase do ciclo da vida, além de subsidiar a formulação de políticas públicas atentas às necessidades das pessoas mais velhas e à construção de serviços de saúde adequados às suas especificidades.
Assim, este capítulo foi construído de acordo com os seguintes focos, nesta sequência:
- fenômeno do envelhecimento populacional;
- mudanças epidemiológicas associadas e implicações para as políticas de saúde;
- bases conceituais e teóricas do envelhecimento;
- conceitos e determinantes do envelhecimento ativo;
- práticas psicológicas direcionadas para promoção da saúde e tratamento de agravos na velhice.
Objetivos
Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de
- apontar as implicações do envelhecimento populacional nas práticas em saúde;
- analisar o desenvolvimento psicológico ao longo da vida, com ênfase na velhice;
- revisar os conceitos essenciais para o cuidado integral ao idoso;
- descrever os princípios norteadores de práticas psicológicas facilitadoras do envelhecimento ativo;
- avaliar as contribuições da psicologia para promoção da saúde e prevenção de doenças na velhice;
- diferenciar os conceitos de comportamento e saúde;
- identificar as implicações das intervenções individuais e em grupo no modelo biopsicossocial.