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OTALGIA: ASPECTOS CLÍNICOS

Fernando Pena Gaspar Sobrinho

Sandro de Menezes Santos Torres

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  • Introdução

A otalgia ou otodínia pode ser definida como uma sensação dolorosa na orelha1 e na área periauricular.

Muitos pacientes têm dificuldade para distinguir a dor auricular da periauricular. O termo orelha pode se referir ao pavilhão auricular (que é parte da orelha externa, junto com o meato acústico externo — MAEmeato acústico externo e parte do tímpano) ou ao órgão sensorial periférico auditório como um todo (orelha média, externa e interna). Neste artigo, o termo “orelha” será empregado como sinônimo de orelha externa, média e interna, juntas, salvo quando houver especificação.

A otalgia é um sintoma comum, tanto no consultório, em geral, de intensidade leve a moderada, quanto nas unidades de urgência, onde frequentemente é relatada como mais grave.2 Foram incluídos aqui exemplos clínicos em diferentes cenários — ambulatorial, hospitalar e de pronto atendimento.

Há várias causas de otalgia, envolvendo tanto doenças que afetam a orelha (otalgia primária ou otológica) quanto enfermidades de outras áreas (otalgia secundária, referida, reflexa ou irradiada), a exemplo do aparelho estomatognático, da faringe, da laringe, do nariz, do pescoço e do tórax (esôfago ou coração).3

Conhecer doenças otológicas de otoscopia anormal e que costumam ser indolores é tão importante quanto reconhecer as que causam otalgia, pois o primeiro caso pode ocultar uma causa de dor referida subjacente.

A metade das otalgias não tem origem otológica.4 Enquanto as crianças tendem a apresentar otalgia primária, a dor referida ou reflexa é mais comum nos adultos.5

A otalgia é um sintoma que exige a exploração de todas as áreas de escopo da otorrinolaringologia, ou seja, orelha, nariz e garganta. A gravidade das doenças é variável — vai desde condições benignas e autolimitadas até neoplasias malignas ou infecções graves. O exame clínico otorrinolaringológico cuidadoso, ou seja, a anamnese e o exame físico adequados, é capaz de apontar a maioria das causas de otalgia.6

No presente trabalho, são descritas, brevemente, a otalgia primária (otológica), em diferentes doenças, em geral, já bastante familiares ao especialista, e as causas de otalgia secundária (não otológica), sobretudo quando o tema for da alçada de outras especialidades. Nos casos clínicos, são incluídas situações típicas e outras menos comuns. São usados os termos “dor reflexa” e “dor referida” como intercambiáveis. Por conta da amplitude do tema, é feita uma abordagem geral e minimalista de cada tópico.

  • Objetivos

Ao final da leitura deste artigo, o leitor será capaz de:

 

  • reconhecer a importância do exame clínico na investigação da otalgia;
  • identificar a inervação associada à otalgia;
  • diferenciar a otalgia primária da secundária;
  • reconhecer aspectos básicos de diferentes doenças relacionadas à otalgia.
  • Esquema conceitual
  • Avaliação clínica inicial

Na anamnese, o relato de queixas não otológicas associadas à otalgia pode indicar dor referida de origem oral, facial e cervical, odinofagia, disfagia e tosse. Por outro lado, a otalgia associada a outras queixas do sistema auditório indica uma causa otológica. Devem-se pesquisar os antecedentes médicos, como patologias e cirurgias prévias, sobretudo as otológicas, diabetes, doenças reumatológicas, neuropatias, principalmente as neuralgias, dermatopatias, radioterapia e uso de medicações, em particular as gotas otológicas.

Entre os hábitos de vida do paciente, torna-se relevante questionar sobre tabagismo, mesmo que passivo, e etilismo, por sua relação com inflamações e neoplasias.

É fundamental, de início, que o paciente caracterize a dor conforme os seguintes aspectos:1

 

· tempo de evolução;

· fatores desencadeantes;

· fatores de melhora e piora da dor;

· lateralidade (uni ou bilateral);

· intensidade;

· localização (se apenas na orelha ou associada à dor em outro local.

A inspeção e a palpação auricular são indispensáveis, precedendo a otoscopia. Em conjunto, são importantes para determinar se a causa é otológica (otoscopia anormal) ou não otológica (otoscopia normal).7

O segundo ponto importante está na investigação da otalgia otológica. Deve-se pesquisar dor à compressão do trago e/ou à mobilização do pavilhão auricular — se presentes, em pacientes acima de 2 anos de idade, indicam doença da orelha externa. Cumpre ressaltar que, em crianças abaixo de 2 anos de idade, esse sinal pode ser positivo em doenças da orelha média, haja vista a calcificação incompleta do MAEmeato acústico externo.

A presença de dor durante essas manobras deve levar o examinador a ter maior cautela ao realizar a otoscopia, visto que ela pode estar limitada, em virtude do edema da pele do MAEmeato acústico externo ou da presença de cerume, corpo estranho, fungo, pólipo ou secreção. Na maioria dos casos de otalgia primária, o diagnóstico é definido neste momento.

LEMBRAR

Conhecer o potencial álgico de cada doença é relevante, pois a otoscopia “anormal” pode não explicar a verdadeira causa da otalgia.

O terceiro aspecto de relevância é investigar, na otalgia com otoscopia normal, a presença de dor à palpação da articulação temporomandibular (ATMarticulação temporomandibula) sugestiva de patologia temporomandibular — uma causa comum de dor referida.

O passo seguinte é avaliar a cavidade oral, a faringe, a laringe e o nariz em busca de possíveis causas de otalgia não otológica, principalmente as de origem odontogênica e faríngea.

A fibronasofaringolaringoscopia pode ser necessária, principalmente se houver fator de risco para tumor,6 como história de tabagismo e etilismo ou suspeita de corpo estranho não visualizado pela inspeção.

 

Entre os exames de imagem em cabeça e pescoço, a tomografia computadorizada (TCtomografia computadorizada) é útil na avaliação de lesão óssea e de trauma, enquanto a ressonância nuclear magnética (RNMressonância nuclear magnética) delimita lesões em partes moles e a presença e extensão de tumores. A cintilografia é particularmente valiosa nos casos de otite externa necrotizante (OENotite externa necrotizante) e na avaliação da tireoide.8

Para melhor compreensão clínica, sobretudo da otalgia não otológica, será importante revisar, adiante, a inervação de áreas de interesse em otalgia, ou seja, a inervação nociceptiva da cabeça e do pescoço.

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