Introdução
Segundo dados do Relatório anual 2019, do Observatório das Migrações Internacionais — Ministério da Justiça e Segurança Pública, no Brasil, foram registrados 774,2 mil imigrantes no período de 2011 a 2018. Desse total, 492,7 mil apresentavam registro de longo termo (ou seja, período de permanência no país superior a um ano), dos quais 106,1 mil (21,5%) eram haitianos. As principais nacionalidades registradas no território brasileiro em 2018 foram a venezuelana (39%), a haitiana (14,7%), a colombiana (7,7%), a boliviana (6,8%) e a uruguaia (6,7%).1
As migrações nacionais e internacionais podem ser voluntárias ou forçadas e ter diferentes causas — como conflitos, guerras, reestruturação territorial, entre outras — e despertam necessidades sociais e de saúde específicas. Embora a migração em si não seja uma ameaça ao indivíduo, pode aumentar a vulnerabilidade a que ele se submete dadas as diferenças socioculturais e econômicas entre a população migrante e a nativa.2,3
Considerados um fenômeno mundial, os fluxos migratórios impõem desafios aos sistemas de saúde no que diz respeito às políticas públicas de acesso aos serviços e à qualidade da assistência prestada. No Brasil, por exemplo, um dos desafios que se apresentam é a garantia do acesso universal e equânime à saúde. Embora seja assegurado pelos princípios normativos da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e pela Lei Orgânica do Sistema Único de Saúde (SUS), ainda não existem leis específicas que garantam o acesso à saúde aos imigrantes que estão em território nacional.2,3
Na área da saúde, é fundamental conhecer os impactos da migração para os indivíduos e elaborar políticas de saúde inclusivas e não discriminatórias. Guerra e Ventura2 apontam também para a necessidade de preparar os profissionais e os gestores para uma adequada assistência individual e coletiva à saúde dos imigrantes, além da construção de ações e processos de trabalho mais flexíveis e ampliados para a garantia efetiva desse direito.
Este capítulo reflete sobre a criação de um material educativo impresso (MEI) a partir da introdução de conceitos e de um caso clínico no contexto da Atenção Primária à Saúde (APS). Busca-se, com isso, estimular o uso dessa ferramenta educacional na atenção à saúde da população imigrante, com o apoio do referencial filosófico do cuidado baseado nas forças (CBF). Para auxiliar o leitor, este capítulo apresenta um relato de experiência, assim como ancora a possibilidade de casos semelhantes.
Objetivos
Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de
- refletir criticamente sobre a atenção à saúde do imigrante no contexto da APS;
- analisar os desafios da prática do cuidado pautado pelos princípios da universalidade e integralidade prestado ao imigrante;
- reconhecer a importância da educação em saúde na construção do conhecimento e da responsabilidade social no contexto da atenção à saúde do imigrante;
- propor um MEI para imigrantes no contexto da APS a partir do CBF.