Objetivos
Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de
- explicar os conceitos relacionados ao uso da oxigenação por membrana extracorpórea (em inglês extracorporeal membrane oxygenation [ECMO]) e como ela pode ser útil em alguns casos de parada cardiorrespiratória (PCR);
- identificar as principais indicações e contraindicações do uso da ressuscitação cardiopulmonar extracorpórea (em inglês, extracorporeal cardiopulmonary resuscitation [ECPR]);
- reconhecer os critérios de bom prognóstico que tornariam a ECPR uma opção viável;
- manejar as principais complicações da ECMO na emergência;
- descrever as principais limitações e dificuldades relacionadas ao uso da ECPR.
Esquema conceitual
Introdução
A ECPR foi introduzida nas diretrizes da American Heart Association (AHA) em 2015, na parte de atualizações.1 Ela pode ser considerada como uma opção de terapia para pacientes selecionados, vítimas de PCR refratária e com uma etiologia potencialmente reversível.
Na atualidade, há mais de 135 milhões de mortes de etiologia cardiovascular em todo o mundo.2 Estima-se uma incidência global de PCR extra-hospitalar (extra-H) de 20 a 140, a cada 100.000 pessoas, com taxas de sobrevida ainda muito baixas variando de 2 a 11%.3 Já em um ambiente hospitalar, é possível alcançar uma sobrevida de até 22%, a depender, entre outros fatores, do ritmo de parada.4
Além da baixa taxa de sobrevida, os desfechos neurológicos são preocupantes. Cerca de dois terços dos pacientes admitidos em unidade de terapia intensiva (UTI) após ressuscitação cardiopulmonar em ambiente extra-H morrerão por lesão cerebral hipóxico-isquêmica, enquanto esse número em ambiente intra-hospitalar (intra-H) é menor — aproximadamente um quarto.5
O grau de lesão neurológica é diretamente proporcional ao tempo que se leva para o retorno à circulação espontânea.
São inúmeras as causas de PCR:
- síndromes coronarianas agudas;
- tromboembolismo pulmonar (TEP);
- insuficiência respiratória;
- intoxicação;
- distúrbios do potássio;
- tamponamento cardíaco;
- pneumotórax;
- hipotermia.
Por mais bem assistida que seja uma PCR, com compressões efetivas, possibilidade de desfibrilação, garantia de via aérea definitiva, algumas causas não serão reversíveis com as manobras convencionais iniciais, configurando uma PCR refratária.
Tome-se como exemplo uma oclusão total de tronco de coronária esquerda, levando a uma PCR por fibrilação ventricular e choque cardiogênico. Mesmo que o paciente seja prontamente assistido, mesmo que a arritmia seja revertida, é possível que a disfunção ventricular advinda de um comprometimento miocárdico dessas dimensões acabe resultando em nova PCR por queda abrupta e sustentada do débito cardíaco.
O objetivo é a resolução da causa base da parada, ou seja, a abertura do vaso culpado, com trombólise ou angioplastia. No entanto, caso não haja sucesso na trombólise, o acionamento da equipe de hemodinâmica, a preparação da sala e o transporte do paciente ao local podem demandar um tempo precioso.
Foi com a intenção de ganhar tempo para resolver a causa que levou à PCR e de melhorar os desfechos neurológicos que o suporte com a ECMO passou a ser considerado como uma alternativa à ressuscitação cardiopulmonar (RCP) convencional, configurando o que se chama de ECPR.
A depender da logística do serviço, os pacientes são submetidos à ECPR na própria sala de emergência ou são trazidos até ela após serem assistidos com esse tipo de suporte em ambiente extra-H.
Um estudo publicado em 2016 contactou todos os centros nos Estados Unidos que haviam submetido casos de ECPR no registro da Extracorporeal Life Support Organization (ELSO) e um terço desses centros realizaram ECPR na emergência.6 Estima-se que hoje, com a difusão desse tipo de assistência, esse número seja ainda maior.