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TETRALOGIA DE FALLOT: EVOLUÇÃO NA FASE ADULTA

Autores: Mirela Frederico de Almeida, Leína Zorzanelli
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Objetivos

Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de

 

  • identificar as principais complicações presentes na evolução do paciente com tetralogia de Fallot (T4F);
  • reconhecer a fisiopatologia das principais sequelas hemodinâmicas e elétricas dos pacientes com T4F;
  • descrever as opções terapêuticas das principais complicações que ocorrem na evolução do paciente com T4F.

Esquema conceitual

Introdução

A T4F é a cardiopatia congênita cianogênica mais frequente, correspondendo a cerca de 7 a 10% de todos os defeitos cardíacos congênitos. Apresenta distribuição semelhante entre os sexos. Sua herança é geralmente esporádica, não familiar, sendo raramente associada a outras anomalias. Pode ou não estar relacionada a síndromes genéticas, sendo as principais a síndrome de DiGeorge (deleção 22q11) e a síndrome de Down (trissomia do 21).1 Nos casos em que não há síndrome associada, diversos defeitos genéticos já foram descritos, incluindo, por exemplo, mutações na transcrição de genes como NKX2.5 em 4% dos casos.2

A anatomia da cardiopatia foi descrita por Stetson, em 1671, quase um século antes da publicação de Fallot, em 1888. O processo embriológico exato que leva à T4F ou às suas variantes ainda é desconhecido. Acredita-se que a divisão defeituosa do conotruncus durante o período de septação e uma rotação incompleta, resultando em dois vasos de tamanhos desiguais (aorta maior e artéria pulmonar menor), determinam a presença do septo conal desviado muito anteriormente.1

Portanto, é o desvio anterior e cefálico do septo infundibular que dá origem às quatro características anatômicas que caracterizam a T4F:

 

  • estenose pulmonar;
  • comunicação interventricular (CIV);
  • aorta cavalgando o septo interventricular;
  • hipertrofia ventricular direita.

A CIV na T4F é, em geral, única, não restritiva e mais comumente do tipo perimembranosa. A aorta é deslocada para a direita, cavalgando em menos de 50% a crista do septo ventricular. Arco aórtico à direita pode ser encontrado em cerca de 25% dos pacientes.1

Mudanças na evolução do paciente com T4F ocorreram a partir de avanços em procedimentos cirúrgicos, como o shunt, de Blalock-Taussig, na década de 1940 (cirurgia paliativa que permite o suprimento sanguíneo pulmonar a partir de ramos da aorta), e o primeiro reparo intracardíaco, em 1954. Desde então, melhorias e avanços substanciais no tratamento dos pacientes com T4F levaram a um expressivo aumento na sobrevida infantil, assim como na expectativa de vida global, com estudos recentes mostrando uma sobrevida de 90% em 20 a 30 anos.1

Atualmente, a maioria dos pacientes com T4F é submetida de maneira precoce à correção total, ainda na primeira infância, visto que, quando não tratados, apresentam sobrevida de 50% em 5 a 10 anos, com mortalidade relacionada a hipoxemia, endocardite, abscessos cerebrais ou acidente vascular cerebral.1 No entanto, a cirurgia cardíaca não é curativa e, décadas após o reparo, os adultos ainda se deparam frequentemente com complicações de longo prazo e com sequelas das anomalias cardíacas subjacentes, bem como dos tratamentos cirúrgicos e/ou intervencionistas prévios.3

Como resultado do aumento da população de adultos com T4F que está envelhecendo, houve um crescimento paralelo de complicações tardias que geram impacto na qualidade de vida desses doentes,3 sendo as mais prevalentes lesão na via de saída do ventrículo direito (VD) — obstrução e/ou insuficiência pulmonar (IP) —, dilatação da raiz aórtica, arritmia e insuficiência cardíaca (IC).

Reconhecer e conduzir de maneira adequada tais sequelas é fundamental para que pacientes com T4F tenham uma evolução clínica favorável em médio e longo prazos, com melhor qualidade de vida, menor morbidade e menor chance de desfechos fatais.

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