Objetivos
Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de
- revisar a epidemiologia dos nódulos tiroidianos;
- identificar os nódulos tiroidianos com maior risco clínico para malignidade;
- utilizar a classificação ultrassonográfica de nódulos tiroidianos;
- descrever a classificação citológica de Bethesda;
- reconhecer a conduta de acordo com a classificação citológica de Bethesda;
- discutir a realização de painéis moleculares em casos específicos.
Esquema conceitual
Introdução
Os nódulos tiroidianos são frequentes na população, porém somente 5% são malignos. Para avaliação dos nódulos, várias ferramentas podem ser utilizadas.1
O Thyroid Imaging, Reporting and Data System (TIRADS) do American College of Radiology (ACR) é um dos métodos mais utilizados para classificação ultrassonográfica do nódulo tiroidiano.1
A classificação de Bethesda consiste na avaliação citológica resultante da punção aspirativa por agulha fina (PAAF) nos nódulos tiroidianos e guia a conduta conforme o risco de malignidade apresentado.2
Os testes moleculares surgiram com o objetivo de reduzir o número de cirurgias diagnósticas. Desde então, vários testes foram surgindo. Seu papel, principalmente diagnóstico, foi ganhando maior evidência científica, e sua indicação já é embasada em diversos guidelines.
Nódulos tiroidianos
Os nódulos tiroidianos são frequentes na população. A prevalência dessa condição depende do método de avaliação, variando de 2 a 6% à palpação, 19 a 35% na ultrassonografia (USG) e 8 a 65% em dados de autópsias.3
Alguns fatores de risco — como sexo feminino, idade avançada, deficiência de iodo na alimentação e exposição da região de cabeça e pescoço à radiação prévia — aumentam a prevalência dos nódulos tiroidianos.4
Apesar de a maioria dos nódulos ser classificada como benigna, com somente 5% malignos, os carcinomas diferenciados da tiroide (CDTs) são os tumores malignos mais frequentes do sistema endócrino.5,6
A PAAF guiada por USG é o procedimento de escolha para a avaliação do nódulo tiroidiano.5,6
Sob condições ótimas, 60 a 80% dos nódulos submetidos à biópsia podem ter citologia classificada como benigna e 3,5 a 5% exibem malignidade.5
Fatores de risco para malignidade do nódulo
Algumas características clínicas que indicam maior risco de malignidade do nódulo são as seguintes:7
- sexo masculino;
- idade inferior a 20 anos ou superior a 70 anos;
- história de exposição à radiação ionizante ou radioterapia cervical na infância ou adolescência.
- diagnóstico prévio de câncer de tiroide tratado com tiroidectomia parcial.
- história familiar (parente de primeiro grau) de câncer de tiroide, especialmente se houver dois ou mais membros afetados, no caso de carcinoma diferenciado;
- síndromes hereditárias, como neoplasia endócrina múltipla tipo 2, síndrome de Cowden, síndrome de Pendrend, síndrome de Werner, complexo de Carney e polipose adenomatosa familiar;
- nódulo com rápido crescimento ou volumoso com sintomas compressivos;
- nódulo endurecido, aderido a planos profundos, pouco móvel; associado à paralisia ipsilateral de corda vocal; ou à linfonodomegalia cervical;
- nódulo incidentalmente detectado no FDG-PET (como captação focal) em pacientes oncológicos.
Esses dados devem ser confrontados com os resultados dos métodos de imagem para confirmar os nódulos suspeitos para malignidade.
Classificação ultrassonográfica ACR-TIRADS
A USG da tiroide é hoje o melhor exame de imagem para avaliar o nódulo tiroidiano, em razão de alta resolução anatômica, alta disponibilidade, baixo custo e ausência de exposição à radiação, e guia a conduta frente a um nódulo tiroidiano conforme o risco apresentado nas características ultrassonográficas.8
Os nódulos benignos são, em sua maioria, adenomatosos (hiperplásicos). Podem se apresentar de diversas formas à USG, a depender da quantidade de necrose, hemorragia, fibrose e calcificação, podendo ser sólidos, císticos ou mistos. Os cistos coloides, formados por hiperplasia de células foliculares que se degeneram e acumulam coloide, mostram-se anecoicos à USG.8
As características ultrassonográficas suspeitas consistem em nódulos sólidos, geralmente únicos. Algumas referências, porém, relatam que o risco de malignidade em nódulos únicos ou múltiplos é igual,8 com tamanho igual ou superior a 4,0 cm, embora grande parte dos nódulos benignos tenha volume maior do que os malignos9,10 hipoecogênicos, com:8,11
- vascularização central;
- margens irregulares ou extensão extratireoidiana;
- microcalcificações;
- ausência de sinal do halo;
- diâmetro anteroposterior superior ao laterolateral;
- presença de linfadenopatia regional.
Os nódulos sólidos conferem maior risco do que as lesões císticas, visto que apresentam maior celularidade. As lesões císticas, muitas vezes, são compostas por grande quantidade de coloide, material benigno produzido em abundância por células foliculares normais.
Um rápido crescimento confere maior risco devido à multiplicação acelerada das células tireoidianas malignas, assim como as margens irregulares, uma vez que o crescimento desordenado de células tireoidianas malignas não respeita a simetria do nódulo.
Quanto mais hipoecoico o nódulo, maior o risco de malignidade, visto que a alta celularidade de um nódulo, à USG, reflete mais ondas ultrassonográficas, o que forma uma imagem mais hipoecoica.
A ecogenicidade aumentada costuma conferir proteção ao nódulo, pois a presença de mais coloide permite a penetração das ondas ultrassonográficas. As exceções a essa regra são o carcinoma papilífero da tiroide (CPT) subtipo folicular e o carcinoma folicular, que apresentam características ultrassonográficas pouco suspeitas por serem isoecoicos, encapsulados, regulares e sem microcalcificações.
As microcalcificações são uma das características de maior especificidade para malignidade, uma vez que refletem os corpos psamomatosos presentes nos CPTs. No entanto, é importante diferenciar uma microcalcificação verdadeira de uma macrocalcificação, uma vez que as macrocalcificações podem ser pela presença de coloide espesso, característica benigna de um nódulo.
Uma forma de diferenciar uma microcalcificação verdadeira de macrocalcificação é pela característica benigna de um nódulo. Ela pode ser diferenciada das microcalcificações pela presença de artefatos de reverberação (“cauda de cometa”).
O ACR-TIRADS é um dos métodos mais utilizados para classificação ultrassonográfica do nódulo tiroidiano. Com base na classificação ultrassonográfica usada para avaliação de nódulos nas mamas — o BI-RADS —, no ACR-TIRADS, as categorias ultrassonográficas avaliadas incluem o seguinte:1
- composição;
- ecogenicidade;
- formato;
- margem;
- focos ecogênicos.
Cada uma das categorias apresenta características que recebem uma pontuação designada de acordo com a importância para o risco de malignidade do nódulo. Por fim, a composição de cada categoria é somada para determinar o nível ACR-TIRADS, assim descrito:1
- TR1 (0 ponto) — benigno;
- TR2 (2 pontos) — não suspeito;
- TR3 (3 pontos) — minimamente suspeito;
- TR4 (4 a 6 pontos) — moderadamente suspeito;
- TR5 (7 ou mais pontos) — altamente suspeito.
A indicação ou não de PAAF é então baseada no nível TIRADS em que aquele nódulo se encontra. A Figura 1 esquematiza o exposto e auxilia na classificação do nódulo tiroidiano e na indicação de PAAF.1
*Adicionar pontos de todas as categorias para determinar o nível TI-RADS.
FIGURA 1: ACR-TIRADS: cinco categorias ultrassonográficas e suas pontuações. // Fonte: Adaptada de Tessler e colaboradores.1
A vascularização do nódulo e a presença ou ausência de sinal do lado não puderam predizer o risco de malignidade em nódulos tiroidianos,12,13 por isso não são consideradas na classificação de ACR-TIRADS.1
Classificação citológica de Bethesda
Elaborada em 2009 por Cibas e Ali2 e posteriormente atualizada em 2017,14 hoje, a classificação de Bethesda está em sua terceira versão, atualizada em 2023.2
A classificação de Bethesda consiste na avaliação citológica resultante da PAAF nos nódulos tiroidianos e guia a conduta conforme o risco de malignidade apresentado.
As células foliculares resultantes do aspirado da PAAF são analisadas quanto ao risco de malignidade, de acordo com as características nucleares e arquiteturais. As características de benignidade são células foliculares pequenas, bem coradas, dispostas em macrofolículos.15,16
Já as características de malignidade podem ser separadas em atipia nuclear na citologia — como pseudoinclusões nucleares, sobreposição nuclear, irregularidades da membrana nuclear e aumento nuclear15,16 — e atipia arquitetural — como disposição celular em microfolículos.
A análise citológica pode ter como resultados:2,17
- não diagnóstico — Bethesda I, 5 a 20% de risco de malignidade;
- benigno — Bethesda II, 2 a 7% de risco de malignidade;
- atipia de significado indeterminado — Bethesda III, 13 a 30% de risco de malignidade;
- sugestivo de neoplasia folicular — Bethesda IV, 23 a 34% de risco de malignidade;
- suspeito de malignidade — Bethesda V, 67 a 83% de risco de malignidade,
- maligno — Bethesda VI, 97 a 100% de risco de malignidade.
O risco de malignidade reduz caso a neoplasia folicular da tiroide com características nucleares semelhantes ao papilífero (NIFTP) não seja considerada lesão maligna.2
Para permitir a adequada interpretação do material proveniente da PAAF, é necessário que a amostra colhida seja representativa da lesão. A adequada celularidade depende da técnica de aspiração, do preparo das lâminas e de características do nódulo. Os nódulos com componente cístico superior a 25 a 50% ou de localização posterior e maior dificuldade técnica têm maior probabilidade de resultarem em citologias não diagnósticas.
As amostras adequadas de PAAF combinam a quantidade e qualidade de células e os componentes do coloide. A categoria Bethesda I compreende as amostras que não preencheram os seguintes critérios, desenvolvidos pela Mayo Clinic, ou seja, presença mínima de seis grupos de células epiteliais foliculares bem visualizadas (isto é, bem coradas, bem preservadas, sem distorção, não obstruídas) com pelo menos 10 células por grupo na mesma lâmina ou em lâminas diferentes do mesmo nódulo.
Os aspirados que contêm atipia nuclear ou celular significativa devem ser reportados na categoria diagnóstica apropriada — Bethesda III–VI —, mesmo que não preencham esse critério. A exceção também se aplica a aspirados de nódulos sólidos com inflamação, como tireoidite linfocítica (Hashimoto), tireoidite granulomatosa ou abscesso tiroidiano, uma vez que esses aspirados contêm essencialmente células inflamatórias e são considerados benignos — Bethesda II.
Os nódulos com abundante quantidade de coloide também não requerem quantidade mínima de células foliculares para serem classificados como benignos (Bethesda II), porém as lâminas que contenham apenas fluido cístico e histiócitos devem ser consideradas Bethesda I caso não preencham os critérios da Mayo Clinic, mas as características ultrassonográficas podem ajudar a guiar a conduta nesses casos.
A conduta em caso de citologia Bethesda I é repetir a PAAF, a não ser que a lesão seja puramente cística. A técnica de cell block pode ajudar na reclassificação das amostras insatisfatórias.
Historicamente, recomenda-se que a nova PAAF seja repetida após pelo menos 3 meses para evitar fatores confundidores associados à atipia por inflamação induzida pela biópsia prévia, porém os estudos recentes não confirmaram essa necessidade.2
Em geral, não há indicação para testes moleculares devido à baixa celularidade da categoria. Uma biópsia repetidamente não diagnóstica pode ser acompanhada ou encaminhada à tiroidectomia, a depender de outras características do nódulo.2
A categoria Bethesda II compreende as doenças nodulares foliculares da tiroide e inclui apenas as patologias benignas. Nela, o manejo é normalmente conservador. As características citológicas são as seguintes:2
- células foliculares com características benignas;
- variável quantidade de coloide;
- células oncocíticas;
- macrófagos.
As características foliculares de benignidade incluem células com núcleo redondo ou ovalado com tamanho semelhante ou discretamente maior do que o de uma hemácia ou linfócito (7 a 10 μm de diâmetro), com cromatina regularmente distribuída e quantidade escassa ou moderada de citoplasma, dispostas, de forma predominante, em macrofolículos (raros microfolículos são aceitos).2
A presença de grânulos citoplasmáticos representativos de lipofuscina ou do pigmento hemossiderina é mais comumente associada a nódulos benignos, porém pode ser encontrada em nódulos malignos. Dessa forma, sua presença não tem significância diagnóstica. Podem ocorrer também discreta sobreposição nuclear, aglomeração e anisonucleose, porém as irregularidades de membrana e núcleo não são aceitas.2
O coloide presente na categoria II de Bethesda é moderado/abundante, brilhante e pode ser viscoso ou denso. O coloide denso tem qualidade hialina e pode se mostrar craquelado na lâmina. Os arranjos celulares na categoria Bethesda II normalmente incluem células dispostas em monocamada com aspecto de favo de mel (honeycomb-like). Em alguns casos, as células foliculares são dispostas em arranjos intactos, tridimensionais (3D), em formato esférico ou de fragmentos de microtecidos.2
A categoria Bethesda III ou atipia de significado indeterminado é destinada aos casos de atipia que não tinham critérios suficientes para serem classificados como Bethesda IV ou V, porém tinham alterações celulares nucleares ou arquiteturais que não poderiam ser classificadas como Bethesda II.2
O risco de malignidade em Bethesda III é maior se a alteração encontrada for nuclear, em comparação com a arquitetural ou o predomínio de células oncocíticas, por isso, a atualização de 2023 da classificação orienta que a atipia de significado indeterminado seja subcategorizada quanto à presença de alteração nuclear ou outra.2
A categoria Bethesda IV ou neoplasia folicular é destinada aos aspirados contendo pelo menos moderada celularidade e compostos por células foliculares com significativa anormalidade arquitetural, principalmente a disposição em microfolículos. As neoplasias oncocíticas (antiga neoplasia folicular de células de Hürthle) se enquadram nessa categoria e incluem2
- amostras predominantemente compostas por células oncocíticas;
- coloide escasso ou ausente;
- linfócitos raros ou ausentes;
- presença de variações nucleares e celulares frequentemente.
Os testes moleculares podem complementar a avaliação de risco de malignidade em nódulos tiroidianos. O manejo geralmente recomendado para neoplasia folicular é a excisão cirúrgica do nódulo, na maioria das vezes, a hemitiroidectomia ou a lobectomia.2
Os diagnósticos diferenciais incluem neoplasias benignas com hiperplasia oncocítica focal e outras neoplasias com características oncocíticas, principalmente o carcinoma medular de tiroide e o CPT subtipo folicular.2
A categoria Bethesda V ou suspeito para malignidade é reservada aos casos em que as células da PAAF exibem características nucleares de CPT, carcinoma medular de tiroide, linfoma ou outra neoplasia maligna, mas que apresenta quantidade ou qualidade insuficiente para ser classificado como Bethesda VI ou maligno. A conduta usual é tiroidectomia parcial ou total, e alguns casos podem ser selecionados para vigilância ativa.1,5
As alterações citológicas encontradas na categoria VI ou maligna têm arquitetura celular típica descrita como arranjo papilífero e/ou em monocamada e/ou arranjos em 3D. Em geral, há grande quantidade de células dispostas nos esfregaços das lâminas, visto que há hipercelularidade nos nódulos malignos. As características nucleares são as seguintes:2
- núcleos aumentados e aglomerados, muitas vezes moldados, lembrando sementes de romã;
- núcleos com cromatina irregularmente distribuída;
- fendas nucleares semelhantes a grãos de café;
- pseudoinclusões intranucleares;
- clareamento nuclear;
- membranas nucleares espessas;
- macro ou micronucléolos, localizados central ou marginalmente.
Outras características são a presença de corpos psamomatosos, células gigantes multinucleadas, células Hobnail, presença de metaplasia oncocítica (células de Hürthle), metaplasia escamoide e quantidade variável de coloide. Podem ser fibrosos, pegajosos ou parecidos com chiclete.2 A conduta se assemelha àquela praticada em Bethesda V.5
A terceira versão da classificação de Bethesda, publicada em 2023, evidencia que a classificação citológica pode prever a agressividade dos tumores malignos, porém a citologia, de maneira isolada, não deve ditar o manejo completo do nódulo tiroidiano.2
As principais modificações da classificação de Bethesda foram as seguintes:2
- na simplificação das terminologias (Bethesda I, III e IV);
- no ajuste do risco de malignidade frente a cada categoria na população pediátrica, uma vez que o risco de malignidade de nódulos tiroidianos nessa população é muito maior do que na população adulta;
- na refinação dos percentuais de malignidade para cada categoria;
- na subcategorização de Bethesda III, em presença de atipia nuclear versus outra alteração.
Testes moleculares
Os testes moleculares surgiram comercialmente no mercado em 2009, com o objetivo de reduzir o número de cirurgias diagnósticas.18 Desde então, vários testes foram surgindo, e seu papel, principalmente diagnóstico, foi ganhando maior evidência científica. Sua indicação já é embasada em diversos guidelines.5,6
Os testes moleculares disponíveis no mercado usam basicamente dois tipos de tecnologias, categorizando essas informações moleculares em: classificadores e marcadores. Os testes classificadores utilizam a informação dos genes ou microRNAs (miRNA), cujos níveis de expressão podem definir um perfil de benignidade ou de malignidade de um nódulo.8
Esse tipo de marcador geralmente apresenta valores preditivos negativos (VPN) e sensibilidade alta, caracterizando um perfil bom para excluir a presença de malignidade, portanto, chamado de rule-out. Os classificadores, por esse perfil, apresentam um poder diagnóstico importante, assim diferenciando bem os nódulos benignos de malignos em amostras indeterminadas de PAAF.8
Já os testes marcadores utilizam como informação genética a presença ou a ausência de mutações conhecidas dos CDTs. Por apresentarem um alto valor preditivo positivo (VPP) e alta especificidade, essas informações são usadas como testes rule-in, ou seja, capazes de confirmar a malignidade da amostra analisada.8
A depender do tipo de mutação presente no nódulo, pode-se conferir também um poder prognóstico aos testes marcadores. Portanto, pode-se dizer que, dependendo da informação genética utilizada, os marcadores moleculares apresentam papel na definição diagnóstica ou na predição prognóstica, com impacto na orientação da conduta e/ou como alvos terapêuticos.
Além disso, para se dividir um teste em rule-in ou rule-out, é preciso ter também um conceito muito claro: o risco de malignidade pré-teste (em inglês, risk of malignancy [ROM]). Conforme o teorema de Bayes, uma vez que a sensibilidade e a especificidade de um teste são fixas, sempre que a prevalência do câncer de tiroide mudar, o VPP e o VPN serão modificados.
Portanto, em uma amostra indeterminada com maior prevalência de câncer, o VPP também aumentará e, consequentemente, haverá redução no VPN. Da mesma forma, a menor prevalência de câncer aumentaria o VPN e diminuiria o VPP.
Ao interpretar o desempenho de um teste em dada população, é de suma importância o conhecimento do ROM para não se tirar conclusões precipitadas da qualidade de um teste, principalmente quando for comparado a outro.
Um bom teste rule-in deve apresentar VPP próximo ou superior a 70% e especificidade próxima ou superior a 87%. Já um bom teste rule-out deve apresentar VPN próximo ou superior a 95% e sensibilidade próxima ou superior a 86%. Esses números são baseados nas informações da classificação Bethesda, ou seja, um teste rule-out desejável teria o desempenho da classe Bethesda II para diagnosticar lesões benignas, com uma taxa falso-negativa inferior a 5% (VPN superior a 95%).19
Da mesma forma, há necessidade de identificar nódulos malignos tão bem como as classes Bethesda V e VI, implicando, portanto, um VPP superior a 70%. Para chegar nesses números, de acordo com o teorema de Bayes, considera-se o ROM de 25%, que é a média de malignidade encontrada nas classes Bethesda III e IV.19
Utilizando as informações dos classificadores e dos marcadores, na prática clínica mundial, hoje existem cinco testes comercialmente disponíveis para as PAAFs com citologia indeterminada. Três são testes com perfil classificador:
- Afirma Genomic Sequencing Classifier (GSC; Veracyte, Inc., South San Francisco, CA/USA);
- Mir-THYpe (ONKOS Diagnósticos Moleculares Ltda., Ribeirão Preto/Brasil);
- ThyroPrint (GeneproDX, Santiago/Chile).
Dois têm perfil marcador:
- ThyroSeq v3 (CBLPath, Inc, Rye Brook, NY, and University of Pittsburgh Medical Center, Pittsburgh, PA/USA);
- ThyGenX/ThyraMIR (Interpace Diagnostics, LLC, Parsippany, NJ/USA).
A maioria desses testes comercialmente disponíveis já está em sua segunda ou terceira versão.
Com a evolução, com as novas versões de cada teste e com os altos VPN, VPP, sensibilidade e especificidade descritos, pode-se dizer que basicamente não há mais um teste exclusivamente rule-in ou rule-out. Com a inclusão de informações dos marcadores e dos classificadores, eles exercem ambas as funções — diagnóstica e prognóstica.
Os cinco testes atualmente disponíveis no mercado — com dados de sensibilidade, especificidade, VPP, VPN e produto analisado — encontram-se resumidos na Tabela 1.
TABELA 1
RESUMO DOS TESTES MOLECULARES COMERCIALMENTE DISPONÍVEIS NO MERCADO E SUAS RESPECTIVAS CARACTERÍSTICAS |
|||||
AFIRMA GSC20 |
MIR-THYPE21 |
THYGENEXT/ THYRAMIR22 |
THYROPRINT23 |
THYROSEQ24 |
|
Material molecular utilizado |
Expressão gênica Mutações Fusões gênicas |
Expressão miRNA |
Expressão miRNA Mutações Fusões gênicas |
Expressão gênica |
Expressão gênica Mutações Fusões gênicas Alteração no número de cópias |
Tecnologia |
NGS — RNA Seq |
qPCR |
NGS/qPCR |
qPCR |
NGS |
Sensibilidade |
91 |
95 |
89 |
91 |
94 |
VPN |
96 |
96 |
94 |
95 |
97 |
Especificidade |
68 |
81 |
85 |
88 |
82 |
VPP |
47 |
76 |
74 |
78 |
66 |
GSC: genomic sequencing classifier; qPCR: quantitative polymerase chain reaction; NGS: next generation sequencing; VPN: valor preditivo negativo; VPP: valor preditivo positivo.
A maioria dos testes já tem seu papel diagnóstico bem estabelecido, e praticamente todas as versões atuais dos testes apresentam altas sensibilidades e especificidades em diferenciar amostras benignas de malignas. No entanto, principalmente na população brasileira, ainda são necessárias validações desses testes, além de estudos de custo versus benefício para o sistema de saúde, já que a maioria desses testes é importada.
Com tudo exposto, o intuito de se utilizar um teste molecular com papel diagnóstico é excluir malignidade em amostras com citologia indeterminada para que os pacientes possam ser acompanhados clinicamente, evitando-se uma cirurgia diagnóstica. Caso o paciente já tenha alguma indicação de tiroidectomia, como nódulo na USG com alta suspeita de malignidade ou por sintomas compressivos, não há necessidade de se indicar um teste cujo papel seja diagnóstico.
Outro importante papel dos testes moleculares é fornecer informação prognóstica do CDT. Podem auxiliar, dessa forma, na predição de agressividade do tumor (riscos de recorrência, de extensão/invasão extratireoidiana, de metástases locais e à distância) e, em consequência, na definição da extensão cirúrgica (tiroidectomia parcial ou total, esvaziamento linfonodal) e na indicação de radioiodoterapia adjuvante.5
Existem alguns testes moleculares — como Thyroseq v3, Xpression Atlas do Afirma, ThyGenNext/ThyraMIR e Mir-THYpe pré-op — que desempenham o papel de fornecer informação prognóstica do CDT. Além dos painéis, existe também a possibilidade de analisar as mutações de forma isolada para auxiliar no esclarecimento prognóstico.
O papel prognóstico das mutações mais estudadas são BRAF e TERT. A mutação BRAF é muito frequente nos CPTs, podendo variar de 36 a 69%,25,26 a depender da população estudada, além de ser a mais estudada das mutações. Ela tem ação ativadora e papel importante na estimulação da via da MAPK.27
No entanto, apesar de muito frequente e muito estudada, a presença isolada da mutação BRAF tem especificidade aproximada de 100% para CPT (papel diagnóstico), mas isoladamente não parece ter um papel preditivo robusto.28
No entanto, de acordo com a última diretriz, quando presente, a mutação tem o poder de reclassificar alguns casos de baixo risco para risco intermediário de recorrência, portanto, o manejo atual apropriado para tumor isolado com mutação BRAF V600E, com exceção do mPTC, deve ser a tiroidectomia total.5
As mutações TERT são alterações moleculares com prognóstico bem definido. Elas também aparecem já nas diretrizes como possíveis modificadoras de estadiamento, mediante sua presença. A prevalência varia de 36 a 69%, estando principalmente presentes em carcinomas mais indiferenciados.25,29,30
Hoje, já há evidências suficientes para sugerir que a mutação TERT, isoladamente ou em combinação com outras (em especial, com BRAF e RAS), seja um preditor de pior prognóstico no câncer diferenciado de tiroide.25,31 Portanto, diante da presença de mutação TERT, o recomendável hoje é a tiroidectomia total para esses pacientes.5
ATIVIDADES
1. Considerando um paciente com nódulo tiroidiano ACT-TIRADS 4 de 1,8 cm, qual dos seguintes perfis clínicos apresenta menor risco para malignidade?
A) Paciente do sexo feminino, 28 anos de idade, antecedente de radiação cervical aos 9 anos de idade para tratamento de linfoma.
B) Paciente do sexo masculino, 42 anos de idade, previamente hígido.
C) Paciente do sexo feminino, 14 anos de idade, previamente hígida.
D) Paciente do sexo feminino, 33 anos de idade, previamente hígida.
Confira aqui a resposta
Resposta incorreta. A alternativa correta é a "D".
Os pacientes com nódulos tiroidianos, antecedentes de radiação cervical, sexo masculino e idade inferior a 18 anos têm maior risco de malignidade.
Resposta correta.
Os pacientes com nódulos tiroidianos, antecedentes de radiação cervical, sexo masculino e idade inferior a 18 anos têm maior risco de malignidade.
A alternativa correta é a "D".
Os pacientes com nódulos tiroidianos, antecedentes de radiação cervical, sexo masculino e idade inferior a 18 anos têm maior risco de malignidade.
2. Assinale a alternativa que apresenta as descrições citológicas mais compatíveis com a categoria IV de Bethesda (neoplasia folicular).
A) Presença de moderada celularidade e moderada quantidade de material coloide, células foliculares ora pequenas, ora de tamanhos intermediários ou grandes, algumas com transformação oxifílica, dispostas em microfolículos. Ausência de atipias nucleares.
B) Presença de moderada celularidade e grande quantidade de material coloide, células foliculares com núcleos pequenos e bem corados, dispostas em macrofolículos. Ausência de atipias nucleares.
C) Presença de grande quantidade de células foliculares isoladas ou agrupadas em arranjos ora papilíferos, ora em redemoinho. Os núcleos estão aumentados de tamanho, apresentando anisonucleose, dobras de membrana nuclear e algumas pseudoinclusões. Coloide escasso.
D) Abundante quantidade de coloide com aspecto em vidro quebrado. Ausência de células foliculares.
Confira aqui a resposta
Resposta incorreta. A alternativa correta é a "A".
Segundo a classificação citológica de Bethesda, a descrição da alternativa A é compatível com Bethesda IV. A alternativa B é compatível com Bethesda II. A alternativa C é compatível com Bethesda VI. A alternativa D também é compatível com Bethesda II, pois, apesar da ausência de células foliculares, a abundante quantidade de coloide levando a um aspecto de vidro quebrado na lâmina é característica de nódulos benignos.
Resposta correta.
Segundo a classificação citológica de Bethesda, a descrição da alternativa A é compatível com Bethesda IV. A alternativa B é compatível com Bethesda II. A alternativa C é compatível com Bethesda VI. A alternativa D também é compatível com Bethesda II, pois, apesar da ausência de células foliculares, a abundante quantidade de coloide levando a um aspecto de vidro quebrado na lâmina é característica de nódulos benignos.
A alternativa correta é a "A".
Segundo a classificação citológica de Bethesda, a descrição da alternativa A é compatível com Bethesda IV. A alternativa B é compatível com Bethesda II. A alternativa C é compatível com Bethesda VI. A alternativa D também é compatível com Bethesda II, pois, apesar da ausência de células foliculares, a abundante quantidade de coloide levando a um aspecto de vidro quebrado na lâmina é característica de nódulos benignos.
3. Paciente do sexo masculino, 45 anos de idade, mostrou na USG de tiroide um nódulo único ACR-TIRADS 5, 2,0 cm em lado direito, abaulando cápsula posterior da tiroide. Sem queixas. PAAF/citologia: categoria III de Bethesda (com atipias nucleares). Qual seria a conduta mais adequada para esse paciente?
A) Solicitar a realização de teste molecular disponível, pois o nódulo tem citologia indeterminada e pode não precisar de tratamento cirúrgico, a depender do resultado do teste.
B) Repetir a PAAF, pois essa sempre deve ser a conduta em citologia na categoria III de Bethesda.
C) Apenas acompanhar, pois, devido à idade, ao sexo e à USG, não tem risco aumentado para câncer de tiroide.
D) Encaminhar para cirurgia, uma vez que o risco e a malignidade pré-teste já são elevados, assim, mesmo um resultado de teste molecular negativo não deve mudar essa conduta.
Confira aqui a resposta
Resposta incorreta. A alternativa correta é a "D".
Sempre se deve considerar a probabilidade de malignidade pré-teste (risco de malignidade pré-teste — ROM) e se este está elevado, como é o caso do paciente em questão (sexo masculino, mais de 55 anos de idade, ACR-TIRADS 5). Outra característica que não aumenta o risco de malignidade, mas, se for maligno, aumenta o risco de extensão extratireoidiana e de metastatização é a localização de risco — abaulando cápsula e próximo à traqueia e ao nervo laríngeo recorrente.
Resposta correta.
Sempre se deve considerar a probabilidade de malignidade pré-teste (risco de malignidade pré-teste — ROM) e se este está elevado, como é o caso do paciente em questão (sexo masculino, mais de 55 anos de idade, ACR-TIRADS 5). Outra característica que não aumenta o risco de malignidade, mas, se for maligno, aumenta o risco de extensão extratireoidiana e de metastatização é a localização de risco — abaulando cápsula e próximo à traqueia e ao nervo laríngeo recorrente.
A alternativa correta é a "D".
Sempre se deve considerar a probabilidade de malignidade pré-teste (risco de malignidade pré-teste — ROM) e se este está elevado, como é o caso do paciente em questão (sexo masculino, mais de 55 anos de idade, ACR-TIRADS 5). Outra característica que não aumenta o risco de malignidade, mas, se for maligno, aumenta o risco de extensão extratireoidiana e de metastatização é a localização de risco — abaulando cápsula e próximo à traqueia e ao nervo laríngeo recorrente.
4. Paciente do sexo feminino, 30 anos de idade, apresenta nódulo tiroidiano ACR-TIRADS 4 na USG, 1,2 cm, lado direito, com citologia categoria III de Bethesda, teste Mir-THYpe com resultado positivo para malignidade e mutações TERT e BRAF presentes. Sobre o caso, assinale a alternativa correta.
A) Paciente jovem, com nódulo pequeno, pode-se considerar apenas vigilância ativa.
B) Repetir a PAAF em 3 a 6 meses.
C) Tiroidectomia total, uma vez que apresenta as mutações do gene promotor do TERT e do BRAF.
D) Apenas repetir a USG em 1 ano.
Confira aqui a resposta
Resposta incorreta. A alternativa correta é a "C".
Considerando a presença das mutações TERT + BRAF, a malignidade está comprovada (e diversos estudos mostram que aumenta a chance de agressividade do tumor).
Resposta correta.
Considerando a presença das mutações TERT + BRAF, a malignidade está comprovada (e diversos estudos mostram que aumenta a chance de agressividade do tumor).
A alternativa correta é a "C".
Considerando a presença das mutações TERT + BRAF, a malignidade está comprovada (e diversos estudos mostram que aumenta a chance de agressividade do tumor).
5. Sobre os testes que analisam as mutações potencialmente associadas ao prognóstico do nódulo de tiroide, observe as afirmativas.
I. Mir-THYpe.
II. ThyroSeq v3.
III. ThyGenNext/ThyraMIR.
Quais estão corretas?
A) Apenas a I e a II.
B) Apenas a I e a III.
C) Apenas a II e a III.
D) A I, a II e a III.
Confira aqui a resposta
Resposta incorreta. A alternativa correta é a "D".
Na prática clínica mundial, hoje existem cinco testes comercialmente disponíveis para as PAAFs com citologia indeterminada. Mutações como BRAF e TERT já têm papel um pouco mais bem definido em relação à função prognóstica. Além disso, no mir-146b, quanto maior sua expressão, maior seu potencial de agressividade. Portanto, os testes miR-THYpe, TryroSeq e e ThyGenNEXT que avaliam essas mutações também têm papel prognóstico.
Resposta correta.
Na prática clínica mundial, hoje existem cinco testes comercialmente disponíveis para as PAAFs com citologia indeterminada. Mutações como BRAF e TERT já têm papel um pouco mais bem definido em relação à função prognóstica. Além disso, no mir-146b, quanto maior sua expressão, maior seu potencial de agressividade. Portanto, os testes miR-THYpe, TryroSeq e e ThyGenNEXT que avaliam essas mutações também têm papel prognóstico.
A alternativa correta é a "D".
Na prática clínica mundial, hoje existem cinco testes comercialmente disponíveis para as PAAFs com citologia indeterminada. Mutações como BRAF e TERT já têm papel um pouco mais bem definido em relação à função prognóstica. Além disso, no mir-146b, quanto maior sua expressão, maior seu potencial de agressividade. Portanto, os testes miR-THYpe, TryroSeq e e ThyGenNEXT que avaliam essas mutações também têm papel prognóstico.
6. Sobre a avaliação de nódulos da tiroide, observe as afirmativas.
I. O melhor exame de imagem para avaliar um nódulo é a USG. Os nódulos hipoecoicos, com margens irregulares, microcalcificações, mais altos do que largos, com evidência de extensão extratireoidiana e calcificações riziformes com extrusão do conteúdo do nódulo têm um risco estimado de malignidade superior a 70%.
II. Os nódulos iso ou hiperecoicos, sólidos, sem as características de risco devem ser puncionados se 2,5cm, conforme ACR-TIRADS.
III. O risco de malignidade conforme pontuação da escala TIRADS classifica os nódulos como alto risco, risco intermediário, baixo risco e muito baixo risco.
IV. A PAAF é o método mais sensível para diferenciar nódulos benignos de malignos. De acordo com o tamanho do nódulo e o risco ultrassonográfico, deve-se indicar PAAF.
Quais estão corretas?
A) Apenas a I, a II e a III.
B) Apenas a I, a II e a IV.
C) Apenas a I, a III e a IV.
D) Apenas a II, a III e a IV.
Confira aqui a resposta
Resposta incorreta. A alternativa correta é a "B".
O risco de malignidade conforme pontuação da escala TIRADS considera composição, ecogenicidade, formato, margens e focos ecogênicos. A soma de pontos classificará os nódulos em TIRADS 1 a 5. O TR1 é benigno e TR5 é altamente suspeito.
Resposta correta.
O risco de malignidade conforme pontuação da escala TIRADS considera composição, ecogenicidade, formato, margens e focos ecogênicos. A soma de pontos classificará os nódulos em TIRADS 1 a 5. O TR1 é benigno e TR5 é altamente suspeito.
A alternativa correta é a "B".
O risco de malignidade conforme pontuação da escala TIRADS considera composição, ecogenicidade, formato, margens e focos ecogênicos. A soma de pontos classificará os nódulos em TIRADS 1 a 5. O TR1 é benigno e TR5 é altamente suspeito.
7. Sobre o seguimento do nódulo de tiroide, assinale a alternativa correta.
A) Resultado de uma PAAF, mostrando Bethesda classe III: indicação formal de cirurgia, seguida de tratamento complementar com radioiodo e supressão do TSH.
B) Resultado de uma PAAF, mostrando Bethesda classe IV: possibilidade de fazer painel molecular ou cirurgia.
C) Resultado de uma PAAF, mostrando Bethesda classe II: indicação de fazer painel molecular ou cirurgia.
D) Resultado de uma PAAF, mostrando Bethesda classe VI: seguimento clínico, repetir USG a cada 6 meses ou 1 ano.
Confira aqui a resposta
Resposta incorreta. A alternativa correta é a "B".
A classe IV indica uma lesão folicular, e o painel molecular ou cirurgia são abordagens recomendadas.
Resposta correta.
A classe IV indica uma lesão folicular, e o painel molecular ou cirurgia são abordagens recomendadas.
A alternativa correta é a "B".
A classe IV indica uma lesão folicular, e o painel molecular ou cirurgia são abordagens recomendadas.
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M.F.M.S., 37 anos de idade, sexo feminino, apresenta queixa principal (QP) de nódulo no exame pedido pelo ginecologista. Quanto à história da moléstia atual (HMA), a paciente refere que o ginecologista solicitou exame de rotina e incluiu na lista uma USG de tiroide, na qual foi observado nódulo de tiroide.
Paciente assintomática, sem antecedentes de radiação de região de cabeça e pescoço, sem histórico familiar de câncer de tiroide. Quanto à história médica pregressa (HMP), verificou-se enxaqueca. Ao exame físico, foram observados
- bom estado geral;
- frequência cardíaca (FC): 84 bpm;
- pressão arterial (PA): 120×80 mmHg.
C/P: nódulo palpável em região cervical à direita, indolor, de cerca de 1,5 cm. Nódulo levemente endurecido, móvel à deglutição, sem linfonodomegalias palpáveis. Exames laboratoriais:
- hormônio estimulador da tiroide (TSH): 2,3 mUI/L;
- tiroxina livre (T4L): 1,2 ng/dL;
- calcitonina: < 0,1 ng/mL.
A USG de tiroide com doppler colorido mostrou nódulo em terço superior de lobo direito, 1,5 × 1,3 × 1,1 cm, hipoecoico, bem delimitado, horizontalizado, sem microcalcificações (ACR-TIRADS 4).
A PAAF de nódulo mostrou citologia com celularidade adequada, pequenos lençóis em monocamada, microfolículos, com coloide escasso, núcleo com maior diâmetro de uma hemácia, regular. A conclusão é de atipia de significado indeterminado com atipias arquiteturais — Bethesda III.
ATIVIDADES
8. Qual é a conduta médica à paciente do caso clínico neste momento?
Confira aqui a resposta
Em razão de a USG apresentar suspeita intermediária, a citologia ser indeterminada e a paciente não desejar ser submetida a uma cirurgia diagnóstica, pode-se optar pela realização de teste molecular. Como a intenção era avaliar também a extensão da cirurgia, caso a paciente precise ser submetida, pode-se optar pelo teste Mir-THYpe.
Resposta correta.
Em razão de a USG apresentar suspeita intermediária, a citologia ser indeterminada e a paciente não desejar ser submetida a uma cirurgia diagnóstica, pode-se optar pela realização de teste molecular. Como a intenção era avaliar também a extensão da cirurgia, caso a paciente precise ser submetida, pode-se optar pelo teste Mir-THYpe.
Em razão de a USG apresentar suspeita intermediária, a citologia ser indeterminada e a paciente não desejar ser submetida a uma cirurgia diagnóstica, pode-se optar pela realização de teste molecular. Como a intenção era avaliar também a extensão da cirurgia, caso a paciente precise ser submetida, pode-se optar pelo teste Mir-THYpe.
O resultado do teste molecular com painel de microRNA foi positivo. Já a pesquisa para BRAF e TERT é negativa; por sua vez, a expressão do miR-146 é baixa. Diante desse resultado, pelo conhecimento atual sobre o prognóstico na ausência de BRAF e TERT e a baixa expressão do miR-46b, optou-se por lobectomia à direita com esvaziamento ipsilateral.
O exame anatomopatológico (AP) confirmou um carcinoma diferenciado de tiroide compatível com baixo risco. AP: CPT, subtipo clássico, medindo 1,2 × 1,0 cm, sem sinais de extensão extratireoidiana, sem invasão angiolinfática, sem invasão neural; sem acometimento de linfonodos. Estadiamento pT1bN0Mx. O risco de recorrência e persistência da doença é baixo risco.
A paciente segue em acompanhamento regular, com resposta completa após 2 anos da cirurgia, com exames de USG negativos, níveis de TSH de 0,5 a 2,0 mUI/L e níveis de tiroglobulina dentro do aceitável para pacientes submetidos à lobectomia. Paciente evolui estável, sem novas intercorrências.
Conclusão
Os nódulos tiroidianos com citologia indeterminada são um desafio na rotina do endocrinologista. Cabe ao médico avaliar o ROM do nódulo por meio de características clínicas, ultrassonográficas (critérios TIRADS, por exemplo) e citológicas (atipias nucleares versus atipias arquiteturais) e decidir sobre o benefício do teste molecular para cada paciente.
Do ponto de vista diagnóstico (rule-out), esses testes já estão validados e apresentam bom desempenho com boa acurácia diagnóstica, evitando, assim, cirurgias diagnósticas. Por outro lado, do ponto de vista prognóstico (rule-in), embora já se saiba do potencial de agressividade das principais mutações encontradas nos CDTs (BRAF e TERT), ainda faltam estudos para indicar com precisão qual o tratamento mais adequado para cada mutação.
Atividades: Respostas
Comentário: Os pacientes com nódulos tiroidianos, antecedentes de radiação cervical, sexo masculino e idade inferior a 18 anos têm maior risco de malignidade.
Comentário: Segundo a classificação citológica de Bethesda, a descrição da alternativa A é compatível com Bethesda IV. A alternativa B é compatível com Bethesda II. A alternativa C é compatível com Bethesda VI. A alternativa D também é compatível com Bethesda II, pois, apesar da ausência de células foliculares, a abundante quantidade de coloide levando a um aspecto de vidro quebrado na lâmina é característica de nódulos benignos.
Comentário: Sempre se deve considerar a probabilidade de malignidade pré-teste (risco de malignidade pré-teste — ROM) e se este está elevado, como é o caso do paciente em questão (sexo masculino, mais de 55 anos de idade, ACR-TIRADS 5). Outra característica que não aumenta o risco de malignidade, mas, se for maligno, aumenta o risco de extensão extratireoidiana e de metastatização é a localização de risco — abaulando cápsula e próximo à traqueia e ao nervo laríngeo recorrente.
Comentário: Considerando a presença das mutações TERT + BRAF, a malignidade está comprovada (e diversos estudos mostram que aumenta a chance de agressividade do tumor).
Comentário: Na prática clínica mundial, hoje existem cinco testes comercialmente disponíveis para as PAAFs com citologia indeterminada. Mutações como BRAF e TERT já têm papel um pouco mais bem definido em relação à função prognóstica. Além disso, no mir-146b, quanto maior sua expressão, maior seu potencial de agressividade. Portanto, os testes miR-THYpe, TryroSeq e e ThyGenNEXT que avaliam essas mutações também têm papel prognóstico.
Comentário: O risco de malignidade conforme pontuação da escala TIRADS considera composição, ecogenicidade, formato, margens e focos ecogênicos. A soma de pontos classificará os nódulos em TIRADS 1 a 5. O TR1 é benigno e TR5 é altamente suspeito.
Comentário: A classe IV indica uma lesão folicular, e o painel molecular ou cirurgia são abordagens recomendadas.
RESPOSTA: Em razão de a USG apresentar suspeita intermediária, a citologia ser indeterminada e a paciente não desejar ser submetida a uma cirurgia diagnóstica, pode-se optar pela realização de teste molecular. Como a intenção era avaliar também a extensão da cirurgia, caso a paciente precise ser submetida, pode-se optar pelo teste Mir-THYpe.
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Autoras
CAROLINA FERRAZ // Graduada em Medicina pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Residência Médica em Endocrinologia pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (ISCMSP). Doutora em Medicina Interna pela Technische Universität Dresden, Alemanha. Professora da Disciplina de Endocrinologia da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da ISCMSP. Coordenadora do Centro de Nódulos de Tireoide do Hospital Samaritano de São Paulo. Diretora — Tesoureira-geral da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM) Nacional.
ISABELLA FAGIAN PANSANI // Residência Médica em Endocrinologia pela ISCMSP. Mestranda em Ciências da Saúde pela ISCMSP.
Como citar a versão impressa deste documento
Ferraz C, Pansani IF. Diagnóstico dos nódulos tiroidianos: TIRADS, Bethesda e testes moleculares. In: Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia; Carvalho GA, Czepielewski MA, Meirelles R, organizadores. PROENDÓCRINO Programa de Atualização em Endocrinologia e Metabologia: Ciclo 15. Porto Alegre: Artmed Panamericana; 2024. p. 63-83. (Sistema de Educação Continuada a Distância, v. 4).