Objetivos
Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de
- reconhecer os aspectos históricos dos Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico (HCTP);
- identificar as particularidades e potenciais recompensas do trabalho do psiquiatra em HCTP ao saber médico;
- reconhecer as políticas de saúde mental e desinstitucionalização de pacientes psiquiátricos.
Esquema conceitual
Introdução
O Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico (HCTP) é uma instituição hospitalar diferenciada, pois recebe pacientes com transtornos mentais que cometeram algum crime, indicados pela justiça, para realizarem algo denominado “especial tratamento curativo”, durante o cumprimento de Medidas de Segurança (MS) de internação, sendo essas de natureza detentiva. Alguns HCTP podem funcionar como institutos psiquiátrico forenses, locais nos quais os tratamentos temporários de pacientes provenientes do sistema carcerário ou para o cumprimento das MS, perícias de responsabilidade penal/exame de insanidade mental e de dependência toxicológica, entre outras, são feitas por peritos concursados.
Inicialmente, faz-se necessário conceituar os cuidados psiquiátrico-forenses, os quais constituem uma extensão dos cuidados psiquiátricos rotineiros. Os cuidados psiquiátrico-forenses visam melhorar a saúde mental e reduzir o risco de recidiva de criminosos com transtornos mentais. Esses objetivos devem ser alcançados por meio de condições menos restritivas possíveis, com vistas a uma reintegração social, preservando, ao mesmo tempo, um ambiente de tratamento seguro, tanto para os pacientes quanto para os profissionais e a comunidade.1
É possível verificar, portanto, que o trabalho do médico psiquiatra no HCTP pode envolver atividades assistenciais e periciais, devendo ser desempenhado, de maneira ideal, por profissionais com certificado na área de atuação da psiquiatria forense.
Isso é importante, considerando-se as características específicas desse ambiente hospitalar e os demais colegas de trabalho que o psiquiatra terá, importantes para a adequada realização de suas tarefas, como assistentes sociais, enfermeiros, técnicos de enfermagem, médicos clínicos e neurologistas, psicólogos, terapeutas ocupacionais, farmacêuticos, equipe jurídica do hospital (advogados que recebem, organizam e respondem às demandas judiciais) e agentes penitenciários.
No trabalho psiquiátrico-forense, a interface entre o direito e a medicina pode ocasionar alguns dilemas éticos, porém, o psiquiatra deve seguir os princípios do Código de Ética Médica, seja na produção de laudos ou na assistência aos pacientes em cumprimento de MS. Um conceito útil e elucidativo relacionado às tensões éticas da atividade psiquiátrica forense é o da “preocupação imparcial”. Ela denota a manutenção simultânea de uma distância emocional e a sensibilidade em relação ao paciente/examinando, ou seja, a busca por um equilíbrio dinâmico entre a empatia clínica e a racionalidade, com o psiquiatra se automonitorando e ajustando dinamicamente essas duas atitudes dentro de si.2
Exercer a psiquiatria em um HCTP consiste em tarefa desafiadora e bastante específica. Dentro do HCTP, o médico psiquiatra atuará em casos geralmente extremos na gravidade do quadro clínico ou raros de serem identificados na clínica privada ou no serviço público assistencial. Psicoses com desfechos violentos, transtornos parafílicos, transtornos graves de personalidade, deficiências intelectuais, transtornos por uso de substâncias com síndromes de dependência física e psicológica intensas estão entre alguns possíveis diagnósticos presentes nos pacientes em avaliação ou tratamento no HCTP.
Por fim, mas não menos importante, outra batalha travada pelo psiquiatra será a de se adaptar ao ambiente físico encontrado geralmente nos HCTP brasileiros (prédios com instalações antigas e malconservadas, escuras, pouco ventiladas, escassez de recursos materiais e humanos) e atuais ofertas salariais para o exercício de atividades assistenciais e periciais, as quais exigem compromisso, dedicação, responsabilidade, seriedade, tempo e grande equilíbrio emocional. O Poder Público necessita, de modo urgente, reconhecer a importância dos HCTP como espaços especiais de tratamento e segurança para toda a sociedade, além do grande potencial de produção de conhecimento, por meio do estudo dos casos tratados nesses locais.