Entrar

SÍNDROME INFLAMATÓRIA MULTISSISTÊMICA PEDIÁTRICA ASSOCIADA AO SARS-COV-2

Autores: Leonardo Rodrigues Campos, Marta Cristine Felix Rodrigues, Katia Lino, Tainá Batista de Oliveira, Rozana Gasparello de Almeida, Andréa Valentim Goldenzon
epub-BR-PROPED-C8V4_Artigo5

Objetivos

Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de

  • identificar os sinais e sintomas da síndrome inflamatória multissistêmica pediátrica (SIM-P);
  • diagnosticar a SIM-P;
  • solicitar os exames para diagnóstico e acompanhamento da SIM-P;
  • tratar corretamente a SIM-P.

Esquema conceitual

Introdução

As crianças têm probabilidade muito menor de desenvolver doença grave pelo SARS-CoV-2. A maioria delas cursa com quadro assintomático ou leve, geralmente com febre e tosse, podendo também apresentar sintomas gastrintestinais (diarreia, dor abdominal, náuseas e/ou vômitos), cardiovasculares e cutâneos com maior frequência.1,2 São sintomas durante a apresentação de SIM-P:

  • febre persistente (4 a 6 dias): 100%;
  • sintomas gastrintestinais (dor abdominal, vômito e diarreia): 60 a 100%;
  • rash: 45 a 76%;
  • conjuntivite: 30 a 81%;
  • envolvimento de mucosas: 27 a 76%;
  • sintomas neurológicos (cefaleia, letargia e confusão mental): 29 a 58%;
  • sintomas respiratórios (taquipneia, dispneia): 21 a 65%;
  • odinofagia: 10 a 16%;
  • mialgia: 8 a 17%;
  • edema de mãos e/ou pés: 9 a 16%;
  • linfonodomegalia: 6 a 16%.

Em abril de 2020, no auge da pandemia da COVID-19, o National Health Service (NHS) publicou um alerta sobre uma nova apresentação clínica de COVID-19 em crianças: a SIM-P, com possível associação temporal à infecção prévia pelo SARS-CoV-2, confirmada pela história de contato, sorologia ou detecção viral pelo RT-PCR (teste de reação em cadeia da polimerase com transcrição reversa).3,4

A SIM-P pode apresentar características semelhantes à doença de Kawasaki (DK) completa ou incompleta, à síndrome do choque tóxico e à síndrome de ativação macrofágica, cursando com acometimento de vários órgãos — incluindo coração, trato gastrintestinal, pele e olhos — e com elevação de reagentes de fase aguda, ocorrendo mais frequentemente em escolares e adolescentes.3,4

Os casos de SIM-P ocorrem de 2 a 4 semanas após a infecção por SARS-CoV-2, e a maioria dos pacientes testa positivo para SARS-CoV-2 (RT-PCR, antígeno ou anticorpos na sorologia) ou possui relato de contato próximo com alguém infectado.

Até a publicação deste capítulo, os registros mundiais identificaram que a proporção de casos no sexo masculino foi discretamente maior, com mediana de idade na faixa etária escolar de 7 anos. Ao contrário do que se observa na DK, na SIM-P, são raros os casos descritos na etnia asiática.5,6

Nos primeiros relatos de SIM-P, as crianças de etnia africana ou afrocaribenha foram as mais frequentemente acometidas.5–7 O Centers for Disease Control and Prevention (CDC) publicou um estudo com 570 pacientes com SIM-P que mostrou que 41% eram de origem hispânica/latina, 33% afrodescendentes e 13% brancos.6–8

A fisiopatogenia da SIM-P ainda não está completamente elucidada. Existem diversas teorias descritas para explicar a fisiopatologia da SIM-P, entre elas, a de desregulação imune após a infecção pelo SARS-CoV-2. Segundo essa teoria, os mecanismos fisiopatogênicos possíveis já propostos são os seguintes:

  • mimetismo molecular entre antígenos virais e do hospedeiro com reconhecimento de antígenos do hospedeiro (self) por anticorpos ou células T, resultando na ação de autoanticorpos;
  • antígenos virais expressos nas células infectadas são reconhecidos por anticorpos ou células T;
  • formação de complexos imunes com ativação da cascata da inflamação;
  • ação de superantígenos virais que ativam células imunes do hospedeiro.

Além de a ação direta do vírus ter sido demonstrada em vários órgãos, como o pulmão e o coração, o quadro clínico tardio de persistência de hiperinflamação define um quadro de desregulação imune ao agente viral, provavelmente com envolvimento da predisposição genética do hospedeiro.

Na SIM-P, há tanto a desregulação da imunidade inata com liberação exagerada de citocinas como a desregulação da imunidade adaptativa com recrutamento de células T, B e anticorpos.

O quadro clínico da SIM-P pode ter espectro e gravidade variados, podendo ocorrer período febril inflamatório, quadro clínico de DK completa, incompleta ou atípica, choque tóxico e síndrome de tempestade de citocinas (CRS) (do inglês, cytokine release syndrome), que é uma síndrome de ativação macrofágica. O envolvimento cardíaco, especialmente miocárdico, é a manifestação grave mais frequente na SIM-P.

O diagnóstico de SIM-P, baseado nos critérios definidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS), deve ser pensado em todo paciente na faixa etária pediátrica de 0 a 19 anos com febre persistente sem outra causa identificada, exposto ao SARS-CoV-2 (RT-PCR/antígeno ou sorologia positiva ou história de contato), com provas de atividades inflamatórias elevadas (velocidade de hemossedimentação [VHS], proteína C-reativa [PCR] ou procalcitonina) e que apresente pelo menos duas outras manifestações, como:9

  • hipotensão ou choque;
  • cardíacas (disfunção miocárdica, pericardite, valvulite, alterações coronarianas, elevação da troponina ou fragmento N-terminal do pró-BNP [NT pró-BNP]);
  • sintomas gastrintestinais (diarreia, vômitos ou dor abdominal);
  • alterações mucocutâneas (exantema, conjuntivite bilateral não purulenta ou sinais inflamatórios da cavidade oral, mãos ou pés);
  • evidência de coagulopatia (tempo de ativação da protrombina [TAP], tempo de tromboplastina parcial [PTT] e D-dímero alterados).

A maioria dos pacientes com SIM-P costuma ter um estado hiperinflamatório, que se manifesta com leucocitose com neutrofilia; elevação de VHS, PCR, procalcitonina, D-dímero e ferritina; hiponatremia e hipertrigliceridemia.

Apesar de as manifestações de maior frequência na SIM-P descritas serem as gastrintestinais, cardíacas, Kawasaki-like (febre, rash, conjuntivite não exsudativa, alterações orais, de extremidades e linfonodomegalia) e choque, podem ocorrer envolvimento respiratório como na COVID-19 aguda grave, alterações neurológicas, serosites e insuficiência renal.6,7,10

Por ter uma apresentação clínica bastante variável, o grau de suspeição diagnóstica na SIM-P deve ser alto, visando à prevenção da evolução para complicações graves, como o choque cardiogênico e as alterações coronarianas. A avaliação laboratorial busca identificar o comprometimento de órgãos e/ou sistemas, verificar a intensidade do processo inflamatório e auxiliar no diagnóstico diferencial com outras condições e no acompanhamento da resposta terapêutica.

Para a identificação da infecção pelo SARS-CoV-2, tanto a sorologia como a RT-PCR devem ser realizadas. A amostra para sorologia deve ser colhida antes da administração de imunoglobulina intravenosa (IVIG).11

Para o diagnóstico clínico e acompanhamento do tratamento, devem ser avaliados os seguintes exames: hemograma completo; marcadores inflamatórios (VHS, PCR, desidrogenase lática [LDH], D-dímero, procalcitonina e ferritina); aspartato aminotransferase (AST); alanina aminotransferase (ALT); gama-glutamiltransferase (GGT); fosfatase alcalina (FA); bilirrubina total (BT) e frações; proteínas totais e frações; ureia; creatinina; elementos anormais e sedimentos (EAS) da urina; amilase; lipase; triglicerídeos; TAP; PTT; fibrinogênio; creatinoquinase (CK); CK miocárdica (CK-MB); troponina; pró-peptídeo natriurético do tipo B (pró-BNP).11

Os exames que visam excluir outras etiologias devem incluir culturas (sangue, urina, líquor e aspirado traqueal, se for o caso), painel viral respiratório e sorologias virais (de acordo com a suspeita clínica/diagnóstico diferencial).11

Para avaliação cardiovascular, é de fundamental importância a realização do eletrocardiograma para avaliar arritmia e alterações isquêmicas e do ecocardiograma bidimensional com doppler. Os principais achados ecocardiográficos são a disfunção ventricular esquerda, as alterações coronarianas (dilatações e/ou aneurismas), a regurgitação mitral e o derrame pericárdico.12

A ultrassonografia de abdome ou tomografia computadorizada devem ser solicitadas no caso de dor abdominal intensa. A radiografia de tórax ou tomografia de tórax devem ser realizadas sempre que houver qualquer manifestação respiratória.11

Os principais diagnósticos diferenciais com a SIM-P a serem excluídos são sepse, choque tóxico, escarlatina, endocardite infecciosa, viroses exantemáticas, farmacodermias, doenças reumatológicas — como vasculites, febre reumática e lúpus — e linfo-histiocitose hemofagocítica (LHH).

O paciente com suspeita de SIM-P deve ser hospitalizado, ainda que seja para observação, realização e pareamento de exames laboratoriais, já que a doença possui potencial gravidade. Deve ficar em isolamento respiratório por conta do risco de ter infecção ativa pelo SARS-CoV-2 até resultado da RT-PCR.13

O tratamento de suporte de SIM-P deve ser feito de acordo com as manifestações clínicas apresentadas. Nos casos graves que evoluem com choque, são utilizados expansão volêmica, uso de aminas vasoativas e agentes inotrópicos, suporte ventilatório, antibioticoterapia empírica e, em alguns casos, oxigenação por membrana extracorpórea (ECMO).13–15

O tratamento específico de SIM-P consiste em controlar a intensa inflamação sistêmica. As principais medicações utilizadas para o controle do processo inflamatório são IVIG, ácido acetilsalicílico (AAS) e corticoides. De forma prática, o tratamento é intensificado de acordo com o fenótipo/gravidade do paciente.13–15

É importante lembrar que o paciente pode evoluir de um grupo para o outro, devendo ser reavaliado frequentemente. Cerca de 30 a 80% dos pacientes não respondem ao tratamento com IVIG isolada e podem necessitar de terapia adjuvante com corticoides para controlar a inflamação.13–15 A antiagregação plaquetária visa prevenir a ocorrência de trombose arterial coronariana, já que a SIM-P, além da DK, cursa com endotelite e, em alguns casos, trombocitose reacional.13–15

O AAS na dose de 3 a 5mg/kg/dia (dose máxima de 100mg) deve ser usado em pacientes com SIM-P até a normalização das plaquetas e a confirmação de ausência de comprometimento coronariano, com ecocardiogramas seriados após, no mínimo, 4 semanas do diagnóstico. O AAS deve ser evitado em pacientes com história de sangramento ativo, risco hemorrágico ou plaquetopenia (≤80.000/mm³).14

Os pacientes com aneurismas de coronária com escore Z até 10 devem ser tratados com AAS isolado. Os casos com escore Z maior ou igual a 10 devem receber anticoagulação, além do AAS. A anticoagulação ainda não está bem estabelecida, a não ser em casos de disfunção ventricular importante e grandes aneurismas.14

Os casos de SIM-P refratários à terapia convencional podem ser tratados com medicamentos biológicos (inibidores de interleucinas 1 e 6 e antifator de necrose tumoral [anti-TNF]), porém não existem estudos até o momento que avaliem a eficácia dessas medicações.14

Paciente de 7 anos de idade, sexo feminino, apresenta história de febre alta persistente, tosse seca, odinofagia e rouquidão. Foi atendida na emergência e tratada para tonsilite bacteriana com amoxicilina. Evoluiu 2 semanas depois com retorno da febre alta, associada à hiperemia conjuntival, a edema de extremidades, exantema maculopapular não pruriginoso e alteração de mucosa oral.

O ecocardiograma realizado mostrou miocardiopatia dilatada, disfunção miocárdica com fração de ejeção de 38% e insuficiências mitral e tricúspide leves. O pericárdio estava normal, com ausência de vegetações. Apresentava imunoglobulina G (IgG) positiva para SARS-CoV-2. Os exames laboratoriais mostraram:

  • hematócrito: 31%;
  • hemoglobina: 10g/dL;
  • leucócitos: 17.300 (0/3/0/0/4/63/22/8);
  • plaquetas: 480.000/mm³;
  • ferritina: 2.000ng/mL (valor de referência [VR]: 7–140);
  • VHS: 120mm (VR: até 13mm);
  • PCR: 56mg/dL (VR: até 1mg/dL);
  • CK-MB: 30ng/mL (VR: menor que 5ng/mL);
  • CPK: 1.536U/L (VR: 33 a 211U/L);
  • transaminase glutâmica-oxaloacética (TGO): 70U/L (VR: até 40U/L);
  • transaminase glutâmica-pirúvica (TGP): 89U/L (VR: até 50U/L).

O quadro da paciente é compatível com SIM-P. A clínica inicialmente foi sugestiva de uma infecção viral de vias aéreas superiores, que evoluiu com critérios para SIM-P, como febre, exantema maculopapular, alteração de mucosa oral, hiperemia conjuntival e edema de extremidades, evoluindo posteriormente para inflamação do músculo cardíaco (miocardite com disfunção miocárdica e valvulite). Apresentou sorologia positiva para infecção pelo SARS-CoV-2, confirmando a relação com a infecção viral, e marcadores inflamatórios elevados (PCR, VHS e ferritina).

2

Adolescente de 14 anos de idade, sexo masculino, iniciou quadro de febre de 38,2ºC, associada à odinofagia, que melhorou com sintomáticos em 4 dias. Após 10 dias da resolução dos sintomas, iniciou dor abdominal recorrente difusa, que melhorava pouco com sintomáticos. Evoluiu com piora da dor, que se tornou mais intensa, contínua e acompanhada de sonolência, hipotensão e retorno da febre alta por 3 dias. A família apresentou quadro respiratório inicial semelhante.

A tomografia de abdome identificou apendicite não supurada e peritonite. O ecocardiograma evidenciou derrame pericárdico. O paciente foi abordado cirurgicamente, sendo drenada grande quantidade de secreção purulenta da cavidade abdominal.

O apêndice apresentava sinais de inflamação, mas não estava supurado. Houve melhora clínica após drenagem, porém o paciente mantinha saturação de oxigênio (SatO2) de 92 a 93%, mesmo após a realização de imunoglobulina e corticoterapia. Foi realizada angiorressonância, que foi compatível com embolia pulmonar. Na ocasião, apresentava:

  • D-dímero: 30.000ng/mL (VR: até 500ng/mL);
  • leucócitos: 19.300 (0/0/0/0/4/67/22/7);
  • hematócrito: 28%;
  • hemoglobina: 9,8g/dL;
  • plaquetas: 390.000/mm³;
  • PCR: 30mg/dL;
  • proteínas totais: 5,6g/dL;
  • albumina: 3,3g/dL (VR: >3,5g/dL);
  • VHS: 70mm;
  • ferritina: 1.000ng/mL;
  • sorologia para SARS-CoV-2: positiva.

O quadro do paciente é de SIM-P, já que ele apresentou quadro infeccioso viral e logo depois evoluiu com febre alta por mais de 3 dias, dor abdominal, hipotensão, serosite (pericardite e ascite), marcadores inflamatórios elevados e evidência de coagulopatia.

Terapêutica

Objetivos do tratamento

Para avaliar a resposta ao tratamento, espera-se que o paciente com SIM-P fique afebril por 24 a 36 horas após o término da imunoglobulina. Caso isso não aconteça, é necessária a intensificação do tratamento, e o reumatologista pediátrico deve ser consultado. Os parâmetros inflamatórios devem ser avaliados diariamente.

Para o paciente com SIM-P receber alta, devem ser respeitados os parâmetros clínicos, laboratoriais e de imagem, apresentados a seguir.

Parâmetros clínicos

O paciente com SIM-P deve estar afebril por mais de 48 horas, com melhora do estado geral, sem qualquer tipo de terapia de suporte (por exemplo, oxigenoterapia), boa aceitação da dieta e dos medicamentos por via oral (VO), normalização da função cardíaca (a ser discutido com o cardiologista, pois alguns casos podem persistir com disfunção), ausência de complicações graves e possibilidade de seguimento ambulatorial.16

Parâmetros laboratoriais

Os marcadores inflamatórios em pacientes com SIM-P devem estar em queda progressiva (PCR, LDH, ferritina e D-dímero), assim como o pró-BNP. A troponina deve estar negativa e o eletrocardiograma sem alterações.16

A VHS não deve ser utilizada como parâmetro em pacientes com SIM-P, pois a imunoglobulina pode ocasionar sua elevação.16

O AAS na dose antiagregante plaquetária (3 a 5mg/kg/dia) deverá ser mantido até a reavaliação clínica entre a sexta e a oitava semanas de doença. Além disso, o paciente deve apresentar normalização da contagem de plaquetas e da PCR e um ecocardiograma de controle sem alterações coronarianas.16

Parâmetros de imagem

Os pacientes com SIM-P que apresentam alterações do BNP e/ou troponina no momento do diagnóstico devem parear esses exames até a normalização. O eletrocardiograma deve ser realizado em todos os pacientes e, na presença de alterações, deve ser repetido conforme a decisão do cardiologista.13

Em geral, recomendam-se a reavaliação a cada 48 horas de pacientes com SIM-P hospitalizados e na presença de alterações, como arritmias, bem como a monitoração contínua sempre que possível.13

Condutas

No caso clínico 1, a paciente foi tratada com imunoglobulina 2g/kg/dose única com infusão em 24 horas (por conta do comprometimento cardíaco), corticoterapia (prednisolona 2mg/kg/dia por 7 dias, com redução de 50% da dose a cada semana conforme melhora clínica e laboratorial) e AAS (3 a 5mg/kg/dia) em dose antiagregante.

No caso clínico 2, o tratamento inicial — após drenagem cirúrgica, antibioticoterapia, suporte ventilatório e hemodinâmico — foi administrar IVIG 2g/kg/dose única, corticoterapia e anticoagulação plena por conta da embolia pulmonar documentada radiologicamente.

Acertos e erros nos casos

O caso clínico 1 mostra o potencial de gravidade da SIM-P, caracterizado por disfunção cardíaca grave devido ao processo inflamatório intenso. A paciente foi prontamente diagnosticada e tratada, o que certamente teve impacto favorável no prognóstico.

Um aspecto interessante no caso clínico 1 é a elevação extrema de ferritina, chegando a 2.000ng/mL. Essa paciente já exibia sinais clínicos e laboratoriais de evolução para CRS, com comprometimento cardíaco e hepático, caracterizado por elevação das enzimas.

Sobre o caso clínico 2, a SIM-P pode cursar com acometimento gastrintestinal grave decorrente do processo inflamatório, podendo mimetizar apendicite aguda. Esse paciente apresentou clínica sugestiva e evoluiu com peritonite.

A sonolência inicial já era um dos sinais de gravidade do caso, o que deveria ter motivado a internação naquele momento. O paciente também apresentou sinais de comprometimento hemodinâmico/ventilatório, caracterizado por hipotensão e hipoxemia (saturação de pulso de oxigênio [SpO2] menor que 95% em ar ambiente), mantendo saturação baixa mesmo após o início do tratamento.

A embolia pulmonar é um desafio diagnóstico nas crianças e nos adolescentes por ser uma condição clínica rara e porque os pediatras não estão habituados a pensar nesse diagnóstico. Pode se manifestar com dor pleurítica, taquipneia, tosse, taquicardia, dispneia aguda, hipoxemia e comprometimento hemodinâmico. O paciente pode ou não apresentar trombose venosa profunda concomitante.

O grande desafio é que, na faixa etária pediátrica, os sintomas de embolia pulmonar se confundem com outros diagnósticos. Os principais fatores de risco para desenvolvimento de trombose são os seguintes:

  • presença de cateter venoso central (membro superior);
  • trauma;
  • imobilização;
  • cirurgia recente;
  • uso de contraceptivos orais à base de estrogênio;
  • doenças inflamatórias;
  • doenças oncológicas;
  • cardiopatia;
  • desidratação;
  • obesidade.

O paciente do caso clínico 2 apresentava vários fatores de risco (cateter venoso central, trauma, imobilização, cirurgia recente e doença inflamatória — SIM-P). Além disso, a imunoglobulina é uma medicação associada à hiperviscosidade e raramente a eventos trombóticos. Porém, o paciente já apresentava sintomas antes do uso do medicamento.

É fundamental que todos pacientes com hipoxemia inexplicada, por exemplo, sejam investigados para embolia pulmonar quando não há outra causa aparente, já que o tratamento precoce tem impacto no prognóstico.

O diagnóstico de embolia pulmonar deve ser estabelecido por meio da angiotomografia de tórax, sempre que possível. Os pacientes alérgicos a iodo podem ser submetidos a outras modalidades diagnósticas, como angiorressonância ou cintilografia V/Q.

Evolução dos pacientes

No caso clínico 1, a paciente apresentou boa resposta clínica, foi acompanhada ambulatorialmente pela reumatologia e cardiologia para desmame do corticoide conforme revisão clínica, laboratorial e ecocardiográfica e evoluiu com recuperação total do quadro, sem sequelas.

No caso clínico 2, o tratamento inicial — após drenagem cirúrgica, antibioticoterapia, suporte ventilatório e hemodinâmico — foi administrar IVIG 2g/kg/dose única, corticoterapia e anticoagulação plena por conta da embolia pulmonar documentada radiologicamente.

ATIVIDADES

1. Em relação à epidemiologia da SIM-P em âmbito mundial, assinale a afirmativa correta.

A) Semelhante à DK, apresenta predomínio em pacientes de etnia asiática.

B) Ocorre um predomínio claro de maior incidência de casos no sexo feminino.

C) A cardiopatia crônica foi a comorbidade mais associada aos casos confirmados de SIM-P.

D) É mais frequente em afrodescendentes e hispânicos.

Confira aqui a resposta

Resposta incorreta. A alternativa correta e a "D".


De forma curiosa, ao contrário do que se observa na DK, na SIM-P, são raros os casos descritos na etnia asiática. Os estudos clínicos demonstraram que a proporção de casos no sexo masculino foi discretamente maior. Nos primeiros relatos de SIM-P, as crianças de etnia africana ou afrocaribenha foram, com mais frequência, acometidas pela síndrome. Segundo uma revisão publicada por Panigrahy e colaboradores, as comorbidades mais frequentemente relatadas foram as seguintes: obesidade (16,4%; 89/544), doenças pulmonares como a asma e hiper-reatividade brônquica (13,4%; 73/544) e outras comorbidades (15,2%; 83/544), como diabetes, lúpus sistêmico e doença de Crohn.

Resposta correta.


De forma curiosa, ao contrário do que se observa na DK, na SIM-P, são raros os casos descritos na etnia asiática. Os estudos clínicos demonstraram que a proporção de casos no sexo masculino foi discretamente maior. Nos primeiros relatos de SIM-P, as crianças de etnia africana ou afrocaribenha foram, com mais frequência, acometidas pela síndrome. Segundo uma revisão publicada por Panigrahy e colaboradores, as comorbidades mais frequentemente relatadas foram as seguintes: obesidade (16,4%; 89/544), doenças pulmonares como a asma e hiper-reatividade brônquica (13,4%; 73/544) e outras comorbidades (15,2%; 83/544), como diabetes, lúpus sistêmico e doença de Crohn.

A alternativa correta e a "D".


De forma curiosa, ao contrário do que se observa na DK, na SIM-P, são raros os casos descritos na etnia asiática. Os estudos clínicos demonstraram que a proporção de casos no sexo masculino foi discretamente maior. Nos primeiros relatos de SIM-P, as crianças de etnia africana ou afrocaribenha foram, com mais frequência, acometidas pela síndrome. Segundo uma revisão publicada por Panigrahy e colaboradores, as comorbidades mais frequentemente relatadas foram as seguintes: obesidade (16,4%; 89/544), doenças pulmonares como a asma e hiper-reatividade brônquica (13,4%; 73/544) e outras comorbidades (15,2%; 83/544), como diabetes, lúpus sistêmico e doença de Crohn.

2. Existem diversas teorias descritas para explicar a fisiopatologia da SIM-P, entre elas, a de desregulação imune após a infecção pelo SARS-CoV-2. Leia as alternativas sobre os possíveis mecanismos fisiopatogênicos relacionados a essa teoria.

I. Mimetismo molecular entre antígenos virais e do hospedeiro.

II. Replicação viral disseminada com acometimento do trato respiratório.

III. Formação de complexos imunes com ativação da cascata da inflamação.

IV. Ação de superantígenos virais que ativam células imunes do hospedeiro.

Quais estão corretas?

A) Apenas a I, a II e a III.

B) Apenas a I, a III e a IV.

C) Apenas a I, a II e a IV.

D) Apenas a II, a III e a IV.

Confira aqui a resposta

Resposta incorreta. A alternativa correta e a "B".


Segundo a teoria de desregulação imune após a infecção pelo SARS-CoV-2, os mecanismos fisiopatogênicos possíveis já propostos são os seguintes: mimetismo molecular entre antígenos virais e do hospedeiro com reconhecimento de antígenos do hospedeiro (self) por anticorpos ou células T, resultando na ação de autoanticorpos; antígenos virais expressos nas células infectadas são reconhecidos por anticorpos ou células T; formação de complexos imunes com ativação da cascata da inflamação; ação de superantígenos virais que ativam células imunes do hospedeiro.

Resposta correta.


Segundo a teoria de desregulação imune após a infecção pelo SARS-CoV-2, os mecanismos fisiopatogênicos possíveis já propostos são os seguintes: mimetismo molecular entre antígenos virais e do hospedeiro com reconhecimento de antígenos do hospedeiro (self) por anticorpos ou células T, resultando na ação de autoanticorpos; antígenos virais expressos nas células infectadas são reconhecidos por anticorpos ou células T; formação de complexos imunes com ativação da cascata da inflamação; ação de superantígenos virais que ativam células imunes do hospedeiro.

A alternativa correta e a "B".


Segundo a teoria de desregulação imune após a infecção pelo SARS-CoV-2, os mecanismos fisiopatogênicos possíveis já propostos são os seguintes: mimetismo molecular entre antígenos virais e do hospedeiro com reconhecimento de antígenos do hospedeiro (self) por anticorpos ou células T, resultando na ação de autoanticorpos; antígenos virais expressos nas células infectadas são reconhecidos por anticorpos ou células T; formação de complexos imunes com ativação da cascata da inflamação; ação de superantígenos virais que ativam células imunes do hospedeiro.

3. Qual é o sintoma mais frequente encontrado na apresentação da SIM-P?

A) Diarreia.

B) Dispneia.

C) Febre.

D) Hipotensão.

Confira aqui a resposta

Resposta incorreta. A alternativa correta e a "C".


Em uma revisão sistemática e metanálise com 992 crianças diagnosticadas com SIM-P, a febre foi o sintoma mais frequente (em 95% dos casos).

Resposta correta.


Em uma revisão sistemática e metanálise com 992 crianças diagnosticadas com SIM-P, a febre foi o sintoma mais frequente (em 95% dos casos).

A alternativa correta e a "C".


Em uma revisão sistemática e metanálise com 992 crianças diagnosticadas com SIM-P, a febre foi o sintoma mais frequente (em 95% dos casos).

4. A SIM-P compartilha características com a DK, síndrome do choque tóxico, sepse bacteriana e CRS. Entretanto, diversas características epidemiológicas, clínicas e laboratoriais de SIM-P diferem da DK não relacionada ao SARS-CoV-2. Assinale a afirmativa que apresenta uma dessas características.

A) Os pacientes com SIM-P abrangem uma faixa etária mais restrita e menos propensa a apresentar disfunção cardíaca (arritmias e disfunção ventricular) do que crianças com a DK.

B) Os pacientes com SIM-P costumam ter contagens de plaquetas mais baixas e contagens absolutas de linfócitos mais altas do que na DK.

C) Há um aumento na incidência de SIM-P em pacientes afrodescendentes, afrocaribenhos e hispânicos, mas uma incidência menor na população asiática.

D) Os pacientes com SIM-P costumam ter contagens de plaquetas mais altas, assim como níveis mais altos de PCR do que os pacientes com DK.

Confira aqui a resposta

Resposta incorreta. A alternativa correta e a "C".


A SIM-P não somente abrange uma faixa etária mais ampla como também foi observado que, nesse caso, os pacientes são mais propensos a apresentar disfunção cardíaca. Os pacientes com SIM-P costumam ter contagens de plaquetas mais baixas, contagens absolutas de linfócitos mais baixas e níveis mais altos de PCR do que os pacientes com DK.

Resposta correta.


A SIM-P não somente abrange uma faixa etária mais ampla como também foi observado que, nesse caso, os pacientes são mais propensos a apresentar disfunção cardíaca. Os pacientes com SIM-P costumam ter contagens de plaquetas mais baixas, contagens absolutas de linfócitos mais baixas e níveis mais altos de PCR do que os pacientes com DK.

A alternativa correta e a "C".


A SIM-P não somente abrange uma faixa etária mais ampla como também foi observado que, nesse caso, os pacientes são mais propensos a apresentar disfunção cardíaca. Os pacientes com SIM-P costumam ter contagens de plaquetas mais baixas, contagens absolutas de linfócitos mais baixas e níveis mais altos de PCR do que os pacientes com DK.

5. Leia as alternativas sobre os fatores de risco para desenvolvimento de trombose em pacientes com SIM-P.

I. Cirurgia recente.

II. Doenças oncológicas.

III. Imobilização.

IV. Diabetes melito.

Quais estão corretas?

A) Apenas a I, a II e a III.

B) Apenas a I, a II e a IV.

C) Apenas a I, a III e a IV.

D) Apenas a II, a III e a IV.

Confira aqui a resposta

Resposta incorreta. A alternativa correta e a "A".


Os principais fatores de risco para desenvolvimento de trombose são os seguintes: presença de cateter venoso central (membro superior), imobilização, cirurgia recente, uso de contraceptivos orais à base de estrogênio, doenças inflamatórias, doenças oncológicas, cardiopatia, desidratação e obesidade.

Resposta correta.


Os principais fatores de risco para desenvolvimento de trombose são os seguintes: presença de cateter venoso central (membro superior), imobilização, cirurgia recente, uso de contraceptivos orais à base de estrogênio, doenças inflamatórias, doenças oncológicas, cardiopatia, desidratação e obesidade.

A alternativa correta e a "A".


Os principais fatores de risco para desenvolvimento de trombose são os seguintes: presença de cateter venoso central (membro superior), imobilização, cirurgia recente, uso de contraceptivos orais à base de estrogênio, doenças inflamatórias, doenças oncológicas, cardiopatia, desidratação e obesidade.

6. Explique por que o paciente com suspeita de SIM-P deve ser hospitalizado.

Confira aqui a resposta

O paciente com suspeita de SIM-P deve ser hospitalizado, ainda que seja para observação, realização e pareamento de exames laboratoriais, já que a doença possui potencial gravidade. Deve ficar em isolamento respiratório por conta do risco de ter infecção ativa pelo SARS-CoV-2 até resultado da RT-PCR.

Resposta correta.


O paciente com suspeita de SIM-P deve ser hospitalizado, ainda que seja para observação, realização e pareamento de exames laboratoriais, já que a doença possui potencial gravidade. Deve ficar em isolamento respiratório por conta do risco de ter infecção ativa pelo SARS-CoV-2 até resultado da RT-PCR.

O paciente com suspeita de SIM-P deve ser hospitalizado, ainda que seja para observação, realização e pareamento de exames laboratoriais, já que a doença possui potencial gravidade. Deve ficar em isolamento respiratório por conta do risco de ter infecção ativa pelo SARS-CoV-2 até resultado da RT-PCR.

Recursos terapêuticos

Orientações terapêuticas

O American College of Rheumatology (ACR)13 definiu alguns critérios para internação hospitalar de pacientes com suspeita de SIM-P:

  • alteração dos sinais vitais (taquicardia e taquipneia);
  • desconforto respiratório;
  • déficits neurológicos ou alteração de comportamento (incluindo manifestações súbitas);
  • evidência de lesão renal ou hepática (leve);
  • elevação expressiva de marcadores inflamatórios (por exemplo, PCR maior ou igual a 10mg/dL);
  • alteração de eletrocardiograma, BNP ou troponina.

Apesar das recomendações descritas, sugere-se que todo paciente com suspeita de SIM-P seja hospitalizado, ainda que seja para observação, realização e pareamento de exames laboratoriais, já que a doença possui potencial gravidade e nem sempre será possível garantir o seguimento desses pacientes em âmbito ambulatorial.

O manejo dos pacientes com SIM-P requer a atuação de uma equipe com vários especialistas além do pediatra, incluindo reumatologista, infectologista, cardiologista, intensivista e hematologista, quando necessário.13 De forma prática, pode-se dividir o tratamento em etapas, descritas a seguir.

Controle da disseminação da infecção

Todo paciente com suspeita de SIM-P deve ficar em isolamento respiratório por conta do risco de ter infecção ativa pelo SARS-CoV-2, já que pode apresentar RT-PCR positivo na apresentação da doença.

O paciente só deve ser liberado do isolamento respiratório após ter sido excluída a infecção ativa para que toda a equipe envolvida e outros pacientes próximos não sejam contaminados.

Suporte hemodinâmico

O reconhecimento de sinais de choque é fundamental nos pacientes com suspeita de SIM-P, já que pode estar presente já no início da apresentação da doença. O choque pode ser cardiogênico, distributivo ou misto.17

Em geral, o choque é cardiogênico (baixo débito por disfunção ventricular esquerda), e observam-se taquicardia, pulso fino e perfusão capilar lenta por conta da vasoconstrição periférica, sendo necessária a introdução de algum agente inotrópico (por exemplo, a adrenalina ou dobutamina).17

Em pacientes com choque misto, observam-se sinais de vasoplegia (pulsos amplos e vasodilatação compensatória), e a noradrenalina (um vasoconstritor de efeito predominantemente α-adrenérgico) está indicada.17

O pediatra deve estar atento para o surgimento de arritmias e alterações hemodinâmicas nos pacientes com suspeita de SIM-P. Os diuréticos podem ser necessários, mas devem ser utilizados com cautela. Em casos extremos, com disfunção grave, tem sido relatado o uso da ECMO no manejo desses pacientes.17

Antibioticoterapia empírica em casos selecionados

A apresentação clínica da SIM-P pode ser muito semelhante aos quadros de sepse. Por esse motivo, o início da antibioticoterapia pode ser necessário até que seja excluída a coinfecção. Os pacientes com SIM-P podem ter manifestações clínicas que se assemelham a quadros infecciosos gastrintestinais, assim como podem ter manifestações cutâneas (eritrodermia) sugestivas da síndrome do choque tóxico. De maneira geral, a antibioticoterapia empírica nesses casos visa à cobertura de germes Gram-positivos e negativos.15

Um exemplo de esquema empírico para pacientes provenientes da comunidade é a associação da ceftriaxona com a oxacilina. A clindamicina pode ser associada quando há suspeita da síndrome do choque tóxico.16 Os esquemas diversos de antibióticos empíricos estão descritos, mas a escolha deve ser norteada de acordo com o sítio da infecção e o perfil de resistência antimicrobiana de cada unidade hospitalar.

Tratamento das manifestações inflamatórias

As principais medicações utilizadas para o controle do processo inflamatório em pacientes com SIM-P são IVIG, AAS (em dose anti-inflamatória) e corticoides. De forma prática, o tratamento é intensificado de acordo com o fenótipo/gravidade do paciente.14

É importante lembrar que o paciente com SIM-P pode evoluir de um grupo para o outro, devendo ser reavaliado com frequência. Cerca de 30 a 80% dos pacientes não respondem ao tratamento com IVIG isolada e podem necessitar de terapia adjuvante com corticoides para controlar a inflamação.14

Essa observação difere dos pacientes com DK clássica, em que a resistência à IVIG foi observada em menos de 15% dos pacientes.14,18 Para ajudar a definir o tratamento, pode-se dividir os pacientes em três grupos, de acordo com suas manifestações clínicas: SIM-P isolada, SIM-P com sintomas de COVID-19 grave e SIM-P Kawasaki-like (Figura 1).

IVIG: imunoglobulina intravenosa; AAS: ácido acetilsalicílico; SIM-P: síndrome inflamatória multissistêmica pediátrica; VE: ventrículo esquerdo; BNP: peptídeo natriurético do tipo B; MP: metilprednisolona; PDN: prednisona; VO: via oral; IV: intravenosa; HLH: linfo-histiocitose hemofagocítica; CRS: síndrome de tempestade de citocinas. 1 Caso tenha fatores de risco para resistência à imunoglobulina. Para pacientes asiáticos ou em locais com validação dos critérios de Kobayashi (pontuação maior ou igual a 5): sódio ≤133mmol/L (2 pontos); AST ≥100UI/L (2 pontos); PCR ≥10mg/dL (1 ponto); neutrófilos ≥80% (2 pontos); plaquetas ≤300.000/mm³ (1 ponto); dias de doença ≤4 (2 pontos); idade ≤12 meses (1 ponto). Pacientes não asiáticos são considerados de alto risco de resistência a IVIG se tiverem 1 ou mais dos seguintes critérios: coronárias aumentadas (escore Z >2,5 a 3) na apresentação (antes do tratamento com IVIG), idade ≤12 meses, choque, síndrome de ativação macrofágica.

FIGURA 1: Tratamento da SIM-P de acordo com as manifestações inflamatórias. // Fonte: Campos e colaboradores (2021).19

Prevenção das manifestações trombóticas

A seguir, serão apresentadas as estratégias para prevenção das manifestações trombóticas na SIM-P.

Anticoagulação

O risco de ocorrência de eventos tromboembólicos em pacientes com SIM-P é maior nos casos graves que apresentam disfunção ventricular esquerda (fração de ejeção <35%) e naqueles com aneurismas coronarianos gigantes (acima de 8mm ou escore Z ≥10).13

Esses pacientes devem receber anticoagulação em dose terapêutica com enoxaparina (1mg/kg/dose, a cada 12 horas, por via subcutânea [SC], com o objetivo de atingir atividade do fator anti-Xa entre 0,5 e 1), quando não apresentarem risco hemorrágico maior.13

Os pacientes com indicação de anticoagulação terapêutica por diminuição da fração de ejeção (<35%) devem manter o anticoagulante até 2 semanas após a alta hospitalar.13 As indicações para anticoagulação por tempo prolongado são as seguintes:13

  • aneurisma de coronária com escore Z ≥10 (tempo indefinido);
  • trombose venosa documentada (tempo mínimo de 3 meses, dependendo da resolução e do sítio);
  • disfunção cardíaca ventricular esquerda moderada a grave persistente.

A anticoagulação profilática ainda é um ponto que necessita de estudos, já que não existem evidências (ao contrário da população adulta) de que seu uso previna a ocorrência do tromboembolismo venoso (trombose venosa profunda e/ou embolia pulmonar) associada ao estado de hipercoagulabilidade da COVID-19.16

Os adolescentes hospitalizados se aproximam das complicações dos adultos, assim, talvez, a anticoagulação profilática possa ter algum benefício. Outras estratégias não farmacológicas podem ser utilizadas para a prevenção do tromboembolismo venoso em pacientes hospitalizados, como a deambulação precoce (quando possível) e o uso de dispositivos de compressão pneumática.16

Alguns autores sugerem o uso da anticoagulação profilática em pacientes hospitalizados com infecção pelo SARS-CoV-2 com fatores de risco,16 como D-dímero acima de 5 vezes o valor máximo de referência e/ou múltiplos fatores de risco (mais de 3 fatores de risco) para tromboembolismo venoso intra-hospitalar (além da infecção pela COVID-19), como:20

  • uso de cateter venoso central;
  • ventilação mecânica;
  • tempo prolongado de internação (maior de 3 dias);
  • imobilização prolongada;
  • obesidade (IMC >p95);
  • doença maligna em atividade;
  • síndrome nefrótica;
  • fibrose cística agudizada;
  • doença falciforme com crise vasoclusiva;
  • agudização de doença inflamatória (lúpus, artrite idiopática juvenil ou doença inflamatória intestinal);
  • cardiopatia congênita ou adquirida com estase venosa;
  • história prévia de evento tromboembólico venoso;
  • história de evento tromboembólico venoso em parentes de primeiro grau (antes dos 40 anos de idade ou eventos não provocados — sem fatores de risco evidentes);
  • história de trombofilia (deficiência de proteína C, S ou antitrombina III; mutação do fator V de Leiden ou mutação G20210A da protrombina; anticorpos antifosfolipídeos persistentemente positivos);
  • púbere ou pós-púbere (mais de 12 anos);
  • uso de contraceptivo oral à base de estrogênio;
  • pós-esplenectomia;
  • hemoglobinopatia.
Antiagregação plaquetária

A antiagregação plaquetária visa prevenir a ocorrência de trombose arterial coronariana, já que a SIM-P, além da DK, cursa com endotelite e, em alguns casos, trombocitose reacional.21

O AAS na dose de 3 a 5mg/kg/dia (dose máxima de 100mg) deve ser usado em pacientes com SIM-P até a normalização das plaquetas e a confirmação de ausência de comprometimento coronariano com ecocardiogramas seriados após, no mínimo, 4 semanas do diagnóstico.21

O AAS deve ser evitado em pacientes com história de sangramento ativo, risco hemorrágico ou plaquetopenia (≤80.000/mm³).21 Os pacientes com aneurismas de coronária com escore Z até 10 devem ser tratados com AAS isolado. Os casos com escore Z ≥10 devem receber anticoagulação, além do AAS, como mencionado.21

Prescrição

A prescrição sugerida para o caso clínico 1 é a seguinte:

  • internação na unidade de terapia intensiva (UTI) pediátrica;
  • repouso no leito;
  • dieta zero;
  • hidratação venosa;
  • IVIG 2g/kg, IV, em 24 horas;
  • metilprednisolona 0,8mg/kg, de 12/12 horas, intravenosa (IV) (equivalente a 2mg/kg/dia de prednisona) durante 7 dias, com redução de 50% da dose por semana, de acordo com a resposta clínica e laboratorial;
  • AAS 100mg/dia, VO, todos os dias;
  • ivermectina 200μg/kg, VO, por 2 dias (profilaxia de estrongiloidíase pelo uso de corticoide);
  • monitoração contínua.

A prescrição sugerida para o caso clínico 2 é a seguinte:

  • internação na UTI pediátrica;
  • repouso no leito;
  • dieta zero;
  • hidratação venosa;
  • IVIG 2g/kg, IV, em 24 horas;
  • metilprednisolona 0,8mg/kg, de 12/12 horas, IV (equivalente a 2mg/kg/dia de prednisona) durante 7 dias, com redução de 50% da dose por semana, de acordo com a resposta clínica e laboratorial;
  • AAS 100mg/dia, VO, todos os dias;
  • ivermectina 200μg/kg, VO, por 2 dias (profilaxia de estrongiloidíase pelo uso de corticoide);
  • enoxaparina 1mg/kg, SC, de 12/12 horas (dose terapêutica para tratamento de embolia pulmonar);
  • monitoração contínua.

Acompanhamento

A alta hospitalar deve acontecer em pacientes com SIM-P estáveis clinicamente, com função cardíaca normal e sem febre por mais de 24 horas.

Após a alta, o acompanhamento deve ser realizado por equipe multidisciplinar, envolvendo pediatra, cardiologista pediátrico, reumatologista pediátrico e infectologista. A primeira consulta deve ocorrer entre 1 e 2 semanas após a alta, com controle dos exames complementares. Caso tudo esteja bem, uma nova consulta deve ser realizada cerca de 1 mês após a primeira.

Quando alterações forem encontradas, o cardiologista irá definir o momento de reavaliação e a necessidade de outros exames complementares, já que os pacientes com disfunção ventricular e aneurismas coronarianos necessitam de avaliações mais frequentes.13

O ecocardiograma deve ser realizado no momento do diagnóstico e repetido a cada 7 a 14 dias e depois a cada 4 a 6 semanas. Esses pacientes devem repetir o ecocardiograma 1 ano após o início dos sintomas com o objetivo de avaliar possíveis alterações (funcionais ou alterações coronarianas, por exemplo).13

A ressonância cardíaca vem sendo indicada por alguns especialistas 2 a 6 meses após o diagnóstico da SIM-P em pacientes que apresentaram disfunção ventricular transitória significativa na fase aguda da doença (fração de ejeção de ventrículo esquerdo [VE] <50%) ou persistente após o quadro.13

A ressonância cardíaca tem como objetivo a avaliação funcional do miocárdio, ponderada em T1/T2, mapeamento em T1 com quantificação do volume extracelular e captação de gadolínio.13 A angiotomografia de coronárias pode ser utilizada na suspeita de aneurismas distais difíceis de serem avaliados pela ecocardiografia.13

Farmacoterapia

O Quadro 1 apresenta os medicamentos utilizados para o tratamento da SIM-P e suas respectivas doses.

Quadro 1

MEDICAMENTOS UTILIZADOS PARA O TRATAMENTO DA SÍNDROME INFLAMATÓRIA MULTISSISTÊMICA PEDIÁTRICA E SUAS RESPECTIVAS DOSES

IVIG

  • 2g/kg, IV (pode ser infundida em 12–24 horas; em pacientes com cardiopatia ou comprometimento hemodinâmico, opta-se por infundir em 24 horas).

AAS

  • 3–5mg/kg/dia (dose antiagregante) e 30–50mg/kg/dia (dose anti-inflamatória; atualmente não se usa dose superior a 50mg/kg/dia).

Metilprednisolona

  • 1,6mg/kg/dia (equivalente a 2mg/kg/dia de PDN) — geralmente se utiliza dose fracionada (12/12 horas) para potencializar efeito anti-inflamatório.
  • Quando se utiliza corticoide, o AAS deverá ser feito em dose antiagregante para evitar toxicidade.

Prednisolona ou prednisona

  • 2mg/kg/dia (em dose fracionada; 12/12 horas) — pacientes não críticos ou após alta deverão continuar o esquema de corticoide por VO.
  • A dose deverá ser reduzida semanalmente (50% de redução) conforme melhora clínica e laboratorial, uma decisão que deverá ser tomada pelo reumatologista, sempre que possível.

Enoxaparina

  • 0,5mg/kg/dose, de 12/12 horas (dose profilática), e 1mg/kg/dose, de 12/12 horas (dose terapêutica).
  • Evita-se dose única diária na faixa etária pediátrica, já que o paciente poderá não ter proteção adequada pela maior eliminação do fármaco.

ATIVIDADES

7. A OMS propôs critérios para o diagnóstico de pacientes com SIM-P. Além da exclusão de outra causa microbiológica evidente de inflamação, assinale a alternativa que apresenta outros critérios.

A) Idade menor que 21 anos, febre por 3 dias ou mais, PCR elevada, sintomas gastrintestinais e coagulopatia.

B) Idade entre 0 e 19 anos, febre por 24 horas ou mais, PCR elevada, sintomas gastrintestinais e coagulopatia.

C) Idade menor que 21 anos, febre por 3 dias ou mais, PCR elevada, sintomas gastrintestinais e coagulopatia.

D) Idade entre 0 e 19 anos, febre por 3 dias ou mais, PCR elevada, sintomas gastrintestinais e coagulopatia.

Confira aqui a resposta

Resposta incorreta. A alternativa correta e a "D".


A faixa etária considerada pela OMS é de 0 a 19 anos, enquanto o CDC considera os menores que 21 anos. Em relação ao tempo de febre, a OMS considera o mínimo de pelo menos 3 dias de febre, enquanto para o CDC apenas 24 horas de febre já são consideradas como critério positivo.

Resposta correta.


A faixa etária considerada pela OMS é de 0 a 19 anos, enquanto o CDC considera os menores que 21 anos. Em relação ao tempo de febre, a OMS considera o mínimo de pelo menos 3 dias de febre, enquanto para o CDC apenas 24 horas de febre já são consideradas como critério positivo.

A alternativa correta e a "D".


A faixa etária considerada pela OMS é de 0 a 19 anos, enquanto o CDC considera os menores que 21 anos. Em relação ao tempo de febre, a OMS considera o mínimo de pelo menos 3 dias de febre, enquanto para o CDC apenas 24 horas de febre já são consideradas como critério positivo.

8. Assinale a alternativa que apresenta os critérios do ACR para internação hospitalar de pacientes com suspeita de SIM-P.

A) Alteração dos sinais vitais, desconforto respiratório, déficits neurológicos ou alteração de comportamento, evidência de lesão renal ou hepática, elevação expressiva de marcadores inflamatórios, alteração de eletrocardiograma, BNP ou troponina.

B) Alteração de mucosas, febre, desconforto respiratório, déficits neurológicos ou alteração de comportamento, evidência de lesão renal ou hepática, elevação expressiva de marcadores inflamatórios, alteração de eletrocardiograma, BNP ou troponina.

C) Alteração dos sinais vitais, desconforto respiratório, rash, elevação expressiva de marcadores inflamatórios, alteração de eletrocardiograma, BNP ou troponina.

D) Alteração de mucosas, desconforto respiratório, déficits neurológicos, edema em extremidades, elevação expressiva de marcadores inflamatórios, alteração de eletrocardiograma, BNP ou troponina.

Confira aqui a resposta

Resposta incorreta. A alternativa correta e a "A".


O ACR, nas diretrizes mais recentes publicadas em novembro de 2020, definiu como critérios para internação hospitalar de pacientes com suspeita de SIM-P: alteração dos sinais vitais (taquicardia, taquipneia); desconforto respiratório; déficits neurológicos ou alteração de comportamento (incluindo manifestações súbitas); evidência de lesão renal ou hepática (leve), elevação expressiva de marcadores inflamatórios (por exemplo, PCR maior ou igual a 10mg/dL) e alteração de eletrocardiograma, BNP ou troponina.

Resposta correta.


O ACR, nas diretrizes mais recentes publicadas em novembro de 2020, definiu como critérios para internação hospitalar de pacientes com suspeita de SIM-P: alteração dos sinais vitais (taquicardia, taquipneia); desconforto respiratório; déficits neurológicos ou alteração de comportamento (incluindo manifestações súbitas); evidência de lesão renal ou hepática (leve), elevação expressiva de marcadores inflamatórios (por exemplo, PCR maior ou igual a 10mg/dL) e alteração de eletrocardiograma, BNP ou troponina.

A alternativa correta e a "A".


O ACR, nas diretrizes mais recentes publicadas em novembro de 2020, definiu como critérios para internação hospitalar de pacientes com suspeita de SIM-P: alteração dos sinais vitais (taquicardia, taquipneia); desconforto respiratório; déficits neurológicos ou alteração de comportamento (incluindo manifestações súbitas); evidência de lesão renal ou hepática (leve), elevação expressiva de marcadores inflamatórios (por exemplo, PCR maior ou igual a 10mg/dL) e alteração de eletrocardiograma, BNP ou troponina.

9. Em relação à terapêutica aplicada na SIM-P, assinale a alternativa que apresenta a primeira linha de tratamento, visando ao controle das manifestações inflamatórias.

A) IVIG, AAS (em dose anti-inflamatória) e remdesivir.

B) IVIG, enoxaparina e remdesivir.

C) IVIG, AAS (em dose anti-inflamatória) e corticoides.

D) AAS (em dose anti-inflamatória), corticoides e plasma convalescente.

Confira aqui a resposta

Resposta incorreta. A alternativa correta e a "C".


A eficácia do uso do plasma convalescente ainda é incerta, por isso não deve ser usado rotineiramente. Os antivirais, como o remdesivir, também não possuem sua eficácia comprovada, e os casos pediátricos de SIM-P que fizeram uso dessa medicação tinham RT-PCR positivo e manifestações graves. Além disso, a enoxaparina é utilizada com o objetivo de prevenir o risco de ocorrência de eventos tromboembólicos em pacientes com SIM-P por sua ação anticoagulante e não por ação nos mecanismos inflamatórios da doença.

Resposta correta.


A eficácia do uso do plasma convalescente ainda é incerta, por isso não deve ser usado rotineiramente. Os antivirais, como o remdesivir, também não possuem sua eficácia comprovada, e os casos pediátricos de SIM-P que fizeram uso dessa medicação tinham RT-PCR positivo e manifestações graves. Além disso, a enoxaparina é utilizada com o objetivo de prevenir o risco de ocorrência de eventos tromboembólicos em pacientes com SIM-P por sua ação anticoagulante e não por ação nos mecanismos inflamatórios da doença.

A alternativa correta e a "C".


A eficácia do uso do plasma convalescente ainda é incerta, por isso não deve ser usado rotineiramente. Os antivirais, como o remdesivir, também não possuem sua eficácia comprovada, e os casos pediátricos de SIM-P que fizeram uso dessa medicação tinham RT-PCR positivo e manifestações graves. Além disso, a enoxaparina é utilizada com o objetivo de prevenir o risco de ocorrência de eventos tromboembólicos em pacientes com SIM-P por sua ação anticoagulante e não por ação nos mecanismos inflamatórios da doença.

10. Em termos de prognóstico, qual fator é considerado o principal determinante da gravidade da SIM-P?

A) Febre por mais de 7 dias.

B) Trombose venosa profunda.

C) Déficits neurológicos.

D) Envolvimento do aparelho cardiovascular.

Confira aqui a resposta

Resposta incorreta. A alternativa correta e a "D".


O envolvimento do aparelho cardiovascular ocorre em 80 a 85% dos casos de SIM-P e é o principal determinante da gravidade da doença.

Resposta correta.


O envolvimento do aparelho cardiovascular ocorre em 80 a 85% dos casos de SIM-P e é o principal determinante da gravidade da doença.

A alternativa correta e a "D".


O envolvimento do aparelho cardiovascular ocorre em 80 a 85% dos casos de SIM-P e é o principal determinante da gravidade da doença.

11. Os pacientes com SIM-P podem ter manifestações clínicas que se assemelham a quadros infecciosos gastrintestinais, assim como podem ter manifestações cutâneas (eritrodermia) sugestivas de

A) choque misto.

B) síndrome do choque tóxico.

C) DK.

D) embolia pulmonar.

Confira aqui a resposta

Resposta incorreta. A alternativa correta e a "B".


Os pacientes com SIM-P podem ter manifestações clínicas que se assemelham a quadros infecciosos gastrintestinais, assim como podem ter manifestações cutâneas (eritrodermia) sugestivas da síndrome do choque tóxico. De maneira geral, a antibioticoterapia empírica nesses casos visa à cobertura de germes Gram-positivos e negativos.

Resposta correta.


Os pacientes com SIM-P podem ter manifestações clínicas que se assemelham a quadros infecciosos gastrintestinais, assim como podem ter manifestações cutâneas (eritrodermia) sugestivas da síndrome do choque tóxico. De maneira geral, a antibioticoterapia empírica nesses casos visa à cobertura de germes Gram-positivos e negativos.

A alternativa correta e a "B".


Os pacientes com SIM-P podem ter manifestações clínicas que se assemelham a quadros infecciosos gastrintestinais, assim como podem ter manifestações cutâneas (eritrodermia) sugestivas da síndrome do choque tóxico. De maneira geral, a antibioticoterapia empírica nesses casos visa à cobertura de germes Gram-positivos e negativos.

Conclusão

As crianças têm menor probabilidade de desenvolver infecção grave pela COVID-19, porém a SIM-P é uma potencial complicação da infecção que pode cursar com manifestações críticas, inclusive ocasionando óbito.

A SIM-P compartilha características com DK, síndrome do choque tóxico, sepse bacteriana e CRS. É mais frequente em afrodescendentes e hispânicos, escolares e adolescentes e no sexo masculino. Ocorre 2 a 4 semanas após a infecção pelo SARS-CoV-2.

A fisiopatologia envolve efeitos diretos do vírus e/ou desregulação imune pós-COVID-19. A apresentação clínica é heterogênea, sendo a febre muito frequente, seguida por alterações gastrintestinais, cardiovasculares, respiratórias, neurológicas e renais.

A anamnese e o exame físico minuciosos — além de exames complementares para avaliar o processo inflamatório, o acometimento de órgãos e a relação com a infecção pelo SARS-CoV-2 (RT-PCR e sorologia) — são fundamentais. Os critérios diagnósticos propostos pelo CDC e pela OMS apoiam a propedêutica.

O tratamento deve ser coordenado por um time de especialistas e direcionado às manifestações inflamatórias e orgânicas. Além disso, o seguimento é fundamental para o monitoramento de possíveis sequelas, que felizmente têm sido raras.

Atividades: Respostas

Atividade 1 // Resposta: D

Comentário: De forma curiosa, ao contrário do que se observa na DK, na SIM-P, são raros os casos descritos na etnia asiática. Os estudos clínicos demonstraram que a proporção de casos no sexo masculino foi discretamente maior. Nos primeiros relatos de SIM-P, as crianças de etnia africana ou afrocaribenha foram, com mais frequência, acometidas pela síndrome. Segundo uma revisão publicada por Panigrahy e colaboradores, as comorbidades mais frequentemente relatadas foram as seguintes: obesidade (16,4%; 89/544), doenças pulmonares como a asma e hiper-reatividade brônquica (13,4%; 73/544) e outras comorbidades (15,2%; 83/544), como diabetes, lúpus sistêmico e doença de Crohn.

Atividade 2 // Resposta: B

Comentário: Segundo a teoria de desregulação imune após a infecção pelo SARS-CoV-2, os mecanismos fisiopatogênicos possíveis já propostos são os seguintes: mimetismo molecular entre antígenos virais e do hospedeiro com reconhecimento de antígenos do hospedeiro (self) por anticorpos ou células T, resultando na ação de autoanticorpos; antígenos virais expressos nas células infectadas são reconhecidos por anticorpos ou células T; formação de complexos imunes com ativação da cascata da inflamação; ação de superantígenos virais que ativam células imunes do hospedeiro.

Atividade 3 // Resposta: C

Comentário: Em uma revisão sistemática e metanálise com 992 crianças diagnosticadas com SIM-P, a febre foi o sintoma mais frequente (em 95% dos casos).

Atividade 4 // Resposta: C

Comentário: A SIM-P não somente abrange uma faixa etária mais ampla como também foi observado que, nesse caso, os pacientes são mais propensos a apresentar disfunção cardíaca. Os pacientes com SIM-P costumam ter contagens de plaquetas mais baixas, contagens absolutas de linfócitos mais baixas e níveis mais altos de PCR do que os pacientes com DK.

Atividade 5 // Resposta: A

Comentário: Os principais fatores de risco para desenvolvimento de trombose são os seguintes: presença de cateter venoso central (membro superior), imobilização, cirurgia recente, uso de contraceptivos orais à base de estrogênio, doenças inflamatórias, doenças oncológicas, cardiopatia, desidratação e obesidade.

Atividade 6

RESPOSTA: O paciente com suspeita de SIM-P deve ser hospitalizado, ainda que seja para observação, realização e pareamento de exames laboratoriais, já que a doença possui potencial gravidade. Deve ficar em isolamento respiratório por conta do risco de ter infecção ativa pelo SARS-CoV-2 até resultado da RT-PCR.

Atividade 7 // Resposta: D

Comentário: A faixa etária considerada pela OMS é de 0 a 19 anos, enquanto o CDC considera os menores que 21 anos. Em relação ao tempo de febre, a OMS considera o mínimo de pelo menos 3 dias de febre, enquanto para o CDC apenas 24 horas de febre já são consideradas como critério positivo.

Atividade 8 // Resposta: A

Comentário: O ACR, nas diretrizes mais recentes publicadas em novembro de 2020, definiu como critérios para internação hospitalar de pacientes com suspeita de SIM-P: alteração dos sinais vitais (taquicardia, taquipneia); desconforto respiratório; déficits neurológicos ou alteração de comportamento (incluindo manifestações súbitas); evidência de lesão renal ou hepática (leve), elevação expressiva de marcadores inflamatórios (por exemplo, PCR maior ou igual a 10mg/dL) e alteração de eletrocardiograma, BNP ou troponina.

Atividade 9 // Resposta: C

Comentário: A eficácia do uso do plasma convalescente ainda é incerta, por isso não deve ser usado rotineiramente. Os antivirais, como o remdesivir, também não possuem sua eficácia comprovada, e os casos pediátricos de SIM-P que fizeram uso dessa medicação tinham RT-PCR positivo e manifestações graves. Além disso, a enoxaparina é utilizada com o objetivo de prevenir o risco de ocorrência de eventos tromboembólicos em pacientes com SIM-P por sua ação anticoagulante e não por ação nos mecanismos inflamatórios da doença.

Atividade 10 // Resposta: D

Comentário: O envolvimento do aparelho cardiovascular ocorre em 80 a 85% dos casos de SIM-P e é o principal determinante da gravidade da doença.

Atividade 11 // Resposta: B

Comentário: Os pacientes com SIM-P podem ter manifestações clínicas que se assemelham a quadros infecciosos gastrintestinais, assim como podem ter manifestações cutâneas (eritrodermia) sugestivas da síndrome do choque tóxico. De maneira geral, a antibioticoterapia empírica nesses casos visa à cobertura de germes Gram-positivos e negativos.

Referências

1. Loke YH, Berul CI, Harahsheh AS. Multisystem inflammatory syndrome in children: is there a linkage to Kawasaki disease? Trends Cardiovasc Med. 2020 Oct;30(7):389–96. https://doi.org/10.1016/j.tcm.2020.07.004

2. Fernández-Sarmiento J, Souza D, Jabornisky R, Gonzalez GA, López MPA, Palacio G. Paediatric inflammatory multisystem syndrome temporally associated with COVID-19 (PIMS-TS): a narrative review and the viewpoint of the Latin American Society of Pediatric Intensive Care (SLACIP) sepsis committee. BMJ Paediatrics Open. 2021 Feb;5(1):e000894. https://doi.org/10.1136/bmjpo-2020-000894

3. Feldstein LR, Rose EB, Horwitz SM, Collins JP, Newhams MM, Son MBF, et al. Multisystem inflammatory syndrome in U.S. children and adolescents. N Engl J Med. 2020 Jul;383:334–46. https://doi.org/10.1056/NEJMoa2021680

4. Panigrahy N, Policarpio J, Ramanathan R. Multisystem inflammatory syndrome in children and SARS-CoV-2: a scoping review. J Pediatr Rehabil Med. 2020;13(3):301–16. https://doi.org/10.3233/PRM-200794

5. Yasuhara J, Kuno T, Takagi H, Sumitomo N. Clinical characteristics of COVID-19 in children: a systematic review. Pediatr Pulmonol. 2020 Oct;55(10):2565–75. https://doi.org/10.1002/ppul.24991

6. Centers for Disease Control and Prevention. Multisystem inflammatory syndrome in children (MIS-C) [internet]. Atlanta: CDC; 2020 [acesso em 2022 jan 11]. Disponível em: https://www.cdc.gov/mis-c/hcp/.

7. Sood M, Sharma S, Sood I, Sharma K, Kaushik A. Emerging evidence on multisystem inflammatory syndrome in children associated with SARS-CoV-2 infection: a systematic review with meta-analysis. SN Compr Clin Med. 2021 Jan;1–10. https://doi.org/10.1007/s42399-020-00690-6

8. Godfred-Cato S, Bryant B, Leung J, Oster ME, Conklin L, Abrams J, et al. COVID-19: associated multisystem inflammatory syndrome in children: United States, March–July 2020. MMWR Morb Mortal Wkly Rep. 2020 Aug;69(32):1074–80. https://doi.org/10.15585/mmwr.mm6932e2

9. World Health Organization. Multisystem inflammatory syndrome in children and adolescents temporally related to COVID-19 [internet]. Geneva: WHO; 2020 [acesso em 2022 jan 11]. Disponível: https://www.who.int/news-room/commentaries/detail/multisystem-inflammatory-syndrome-in-children-and-adolescents-with-covid-19.

10. Centers for Disease Control and Prevention. Multisystem inflammatory syndrome in children (MIS-C) associated with coronavirus disease 2019 (COVID-19) [internet]. Atlanta: CDC; 2020 [acesso em 2022 jan 11]. Disponível: https://emergency.cdc.gov/coca/calls/2020/callinfo_051920.asp.

11. Son MBF, Friedman K. COVID-19: multisystem inflammatory syndrome in children (MIS-C) clinical features, evaluation, and diagnosis [internet]. Waltham: UpToDate; 2021 [acesso em 2022 jan 12]. Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/coronavirus-disease-2019-covid-19-multisysteminflammatory-syndrome-in-children-mis-c-clinical-features-evaluation-and-diagnosis.

12. Ramcharan T, Nolan O, Lai CY, Prabhu N, Krishnamurthy R, Richter AG, et al. Paediatric inflammatory multisystem syndrome: temporally associated with SARS-CoV-2 (PIMS-TS): cardiac features, management and short-term outcomes at a UK tertiary paediatric hospital. Pediatr Cardiol. 2020 Oct;41(7):1391–401. https://doi.org/10.1007/s00246-020-02391-2

13. Henderson LA, Canna SW, Friedman KG, Gorelik M, Lapidus SK, Bassiri H, et al. American College of Rheumatology clinical guidance for multisystem inflammatory syndrome in children associated with SARS–CoV‐2 and hyperinflammation in pediatric COVID‐19: version 1. Arthritis Rheumatol. 2020 Nov;72(11):1791–805. https://doi.org/10.1002/art.41454

14. Kabeerdoss J, Pilania RK, Karkhele R, Kumar TS, Danda D, Singh S. Severe COVID-19, multisystem inflammatory syndrome in children, and Kawasaki disease: immunological mechanisms, clinical manifestations and management. Rheumatol Int. 2021 Jan;41(1):19–32. https://doi.org/10.1007/s00296-020-04749-4

15. Davies P, Evans C, Kanthimathinathan HK, Lillie J, Brierley J, Waters G, et al. Intensive care admissions of children with paediatric inflammatory multisystem syndrome temporally associated with SARS-CoV-2 (PIMS-TS) in the UK: a multicentre observational study. Lancet Child Adolesc Health. 2020 Sep;4(9):669–77. https://doi.org/10.1016/S2352-4642(20)30215-7

16. García-Salido A, Antón J, Martínez-Pajares JD, Giralt Garcia G, Gómez Cortés B, Tagarro A, et al. Spanish consensus document on diagnosis, stabilisation and treatment of pediatric multisystem inflammatory syndrome related to SARS-CoV-2 (SIM-PedS). An Pediatr. 2021 Feb;94(2):116.e1–11. https://doi.org/10.1016/j.anpedi.2020.09.005

17. Sperotto F, Friedman KG, Son MBF, VanderPluym CJ, Newburger JW, Dionne A. Cardiac manifestations in SARS-CoV-2-associated multisystem inflammatory syndrome in children: a comprehensive review and proposed clinical approach. Eur J Pediatr. 2021 Feb;180(2):307–22. https://doi.org/10.1007/s00431-020-03766-6

18. Rife E, Gedalia A. Kawasaki disease: an update. Curr Rheumatol Rep. 2020 Set;22(10):75. https://doi.org/10.1007/s11926-020-00941-4

19. Campos LR, de-Almeida RG, Goldenzon AV, Rodriguez MCF, Sztajnbok F, lino K, Nogueira KT, et al. Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica (SIM-P) temporalmente associada a COVID-19: atualização. Residência pediátrica. 2021;11(1). https://doi.org/10.25060/residpediatr

20. Goldenberg NA, Sochet A, Albisetti M, Biss T, Bonduel M, Jaffray J, et al. Consensus-based clinical recommendations and research priorities for anticoagulant thromboprophylaxis in children hospitalized for COVID-19-related illness. J Thromb Haemost. 2020 Nov;18(11):3099–105. https://doi.org/10.1111/jth.15073

21. McCrindle BW, Rowley AH, Newburger JW, Burns JC, Bolger AF, Gewitz M, et al. Diagnosis, treatment, and long-term management of Kawasaki disease: a scientific statement for health professionals from the American Heart Association. Circulation. 2017 Apr;135(17):e927–99. https://doi.org/10.1161/CIR.0000000000000484

Como citar a versão impressa deste documento

Campos LR, Goldenzon AV, Lino K, Rodrigues MCF, Almeida RG, Oliveira TB. Síndrome inflamatória multissistêmica pediátrica associada ao SARS-CoV-2. In: Sociedade Brasileira de Pediatria; Leone C, Cabral SA, organizadores. PROPED Programa de Atualização em Terapêutica Pediátrica: Ciclo 8. Porto Alegre: Artmed Panamericana; 2022. p. 131–55. (Sistema de Educação Continuada a Distância, v. 4). https://doi.org/10.5935/978-65-5848-506-3.C0004

×
Este programa de atualização não está mais disponível para ser adquirido.
Já tem uma conta? Faça login